Dado de emprego desafia a inflação, mas aproxima os EUA de um pouso suave
País criou 254 mil novas vagas de trabalho, acima da expectativa de 150 mil, enquanto registra desaceleração na inflação
O mais recente relatório de empregos dos Estados Unidos trouxe alívio ao mercado, que há tempos temia que as prolongadas altas taxas de juros pudessem levar o país a uma recessão. Ao contrário do que se acreditava, o mercado de trabalho continua resiliente. O país criou 254.000 novas vagas de trabalho não agrícolas, superando de longe as expectativas de 150.000. Embora esse crescimento robusto possa ser visto como um fator de pressão inflacionária, a leitura mais ampla é otimista: a economia americana pode estar finalmente se aproximando de um pouso suave, o equilíbrio desejado entre o controle da inflação e a preservação do crescimento econômico, afastando os temores de uma recessão iminente.
Apesar do aumento de vagas, a taxa de desemprego caiu de 4,2% para 4,1%, demonstrando que a economia segue equilibrada. Quando o Federal Reserve (Fed) começou a cortar os juros, houve preocupações de que a política monetária restritiva estivesse em vigor por muito tempo, prejudicando o crescimento econômico e o mercado de trabalho. “Mais uma vez, os dados de hoje são um bom lembrete de que o mercado tende a subestimar a economia dos EUA”, avalia Audrey Childe-Freeman, estrategista-chefe da Bloomberg Intelligence. Segundo o especialista em câmbio, o relatório, indiscutivelmente forte, afasta temporariamente as recentes discussões sobre uma possível recessão e reforça o otimismo em torno do dólar.
O dado robusto de emprego, embora possa aumentar a inflação e levar o Fed a reavaliar a velocidade e o tamanho dos cortes de juros nas próximas reuniões, envia uma mensagem encorajadora: a economia está conseguindo controlar a inflação sem afetar drasticamente o mercado de trabalho. A inflação americana se encontra a uma taxa anual de 2,5%, chegando próxima da meta de 2%.
Além do payroll, outros indicadores do mercado de trabalho também mostraram resiliência. O relatório JOLTS, que mede a abertura de vagas, e o relatório ADP, que rastreia as contratações no setor privado, ambos superaram as expectativas, indicando que as empresas americanas continuam a contratar em ritmo acelerado. “Os dados diminuem o risco de uma recessão e confirmam cada vez mais o cenário de pouso suave da economia norte-americana”, diz Rafael Perez, economista da Suno Research.
O cenário, porém, não está livre de riscos. Se, por um lado, o crescimento robusto do emprego demonstra a resiliência da economia, por outro, o aumento dos salários pode gerar pressões inflacionárias adicionais, o que poderia levar o Fed a reconsiderar o ritmo de corte de juros nas próximas reuniões. A principal preocupação é a aceleração do salário médio por hora, que subiu de 3,8% para 4,0%. Além disso, as tensões no Oriente Médio representam uma ameaça externa, com potencial de elevar os preços de combustíveis e energia, aumentando as incertezas no quadro inflacionário.
Para o Fed, a escolha à frente não é simples. A política de cortes graduais de juros pode ser reavaliada se o mercado de trabalho continuar pressionando a inflação. Economistas já preveem mais dois cortes modestos de 0,25 ponto percentual até o final do ano, mas o ritmo poderá desacelerar se os sinais de pressão inflacionária se intensificarem.
A boa notícia é que, ao contrário das previsões pessimistas que dominaram o ano, a economia dos EUA está mostrando uma resiliência que muitos subestimaram. O cenário de um pouso suave, outrora improvável, agora parece mais tangível. O emprego está crescendo, a inflação está sob controle — ainda que vigilante —, e a perspectiva de recessão parece cada vez mais distante.
Ainda assim, há quem alerte para os riscos de uma visão excessivamente otimista. Michael Kramer, da Mott Capital, observa que o mercado pode ter caído numa falsa sensação de segurança, ignorando que o emprego elevado e o aumento dos salários podem reverter rapidamente os avanços contra a inflação.
O caminho para um pouso suave não está garantido. O Fed precisará ajustar cuidadosamente sua política monetária para evitar que a recuperação no mercado de trabalho não se transforme em uma nova fonte de inflação. O sucesso depende de uma série de fatores interconectados, incluindo o comportamento dos consumidores, a evolução dos preços da energia e o ritmo das negociações salariais.
Por enquanto, a combinação de crescimento robusto no emprego, inflação controlada e uma economia em desaceleração moderada sinalizam que o pior pode ter passado para os Estados Unidos. O desafio agora é navegar com cautela e garantir que o equilíbrio entre inflação e crescimento se mantenha. Se o Fed conseguir ajustar esse cenário sem reverter os cortes de juros, o tão almejado pouso suave poderá finalmente se concretizar.