CVM absolve fundador da Qualicorp por pagamento de R$ 150 mi
Executivo recebeu quantia como cláusula para permanecer na empresa e preparar a transição no comando; XP reclamou dos valores e pediu abertura de inquérito

Maior administradora de planos de saúde coletivos do país, a Qualicorp esteve na mira da Comissão de Valores Mobiliários, a CVM, nos últimos anos. Isso porque um anúncio feito em 2018 causou um rebuliço no mercado de capitais brasileiro. Para reter seu fundador e diretor-presidente à época, José Seripieri Filho, mesmo depois de ele ter a negociado o controle a um fundo de investimentos, a empresa aceitou pagar uma quantia elevada: 150 milhões de reais. Além de mantê-lo na companhia, a proposta ainda impunha uma cláusula anticompetição a Júnior, como o empresário é conhecido. Como os valores foram decididos em reunião do conselho, mas sem a convocação de assembleia para tal, a XP Investimentos moveu ação na CVM contra a conduta. Mas, na última terça-feira, dia 14, Júnior foi absolvido das acusações.
O processo alegava que o acordo não foi efetuado segundo as condições de mercado. A Qualicorp, no entanto, usou estudos das consultorias Mercer e Spencer Stuart para definir a remuneração a ser paga a Júnior. Com a suspeita de que havia um golpe orquestrado dentro do conselho de administração da companhia para beneficiar o fundador, as ações da empresa listada na bolsa de valores de São Paulo desmoronaram. “A XP acabou se manifestando de maneira crítica, mas não se sabia de que o Júnior iria sair para fazer novos negócios. Essa situação foi explicada para todos os acionistas posteriormente e eles foram ‘desencanando das reclamações”, diz Otávio Yazbek, da Yazbek Advogados, que representou Júnior no caso. “Tanto que em 2019, na aprovação das demonstrações financeiras de 2018, esse contrato foi expressamente referido e reconhecido como legítimo.”
Fundada em 1997, a Qualicorp sempre teve sua gestão muito atrelada à figura de Júnior, mesmo quando, em 2008, o negócio foi comprado pelo fundo General Atlantic e, posteriormente, pelo Carlyle, antes de abrir seu capital, o que aconteceu em 2011. Ao observar o aumento expressivo da concorrência e já como acionista minoritário, com cerca de 15% das ações da empresa, Júnior resolveu avisar o conselho que venderia sua participação e abriria mão do cargo de diretor-presidente da companhia. O anúncio pegou a todos de surpresa. Em uma tentativa de conter os danos da saída não prevista e estruturar a transição no comando, o conselho de administração optou por fazer um estudo e uma proposta ao criador da companhia. Depois de um longo período de conversas, que transcorreram em seis meses de negociação, a empresa decidiu oferecer 150 milhões de reais para “segurar” Júnior.

“O valor foi contabilizado como um ativo intangível, que contempla a figura do fundador da empresa e o direito de não concorrência por parte do Júnior. Foi algo, inclusive, aprovado por cotistas. O Júnior não votou e nem ingeriu na votação, pois não havia conselheiros indicados por ele, já que ele era minoritário”, argumenta Yazbek. “A CVM compreendeu o contexto do contrato e, mesmo com todo o barulho que houve na época, com todo o clamor público, ela analisou o caso com bastante rigor e seriedade.”
Depois da apresentação de denúncia, outras negociações ocorreram. O fundador da Qualicorp seguiu como membro do corpo diretivo, do conselho de administração e como acionista até o fim de 2019, quando firmou um acordo com a companhia. Na negociação, ficou-se definida a venda de uma empresa ainda em fase embrionária dentro da Qualicorp, a QSaúde, que atua como operadora de planos, além de um acordo de cooperação entre as empresas, já que seus negócios são complementares. Júnior, no entanto, fica impossibilitado de investir em uma concorrente da Qualicorp até meados de 2023. Hoje, a Rede D’Or é a controladora da Qualicorp.