Como um CEO brasileiro salvou a operação de uma multinacional da Nova Zelândia por aqui
Ricardo Bovo reverteu anos de prejuízo na Tait Brasil ao convencer a matriz de que, para prosperar, era preciso entender que “in Brazil is different”

Ao assumir a cadeira de presidente da Tait Brasil em 2021, o executivo Ricardo Bovo encontrou uma situação crítica. Com mais de 50 anos de vida, a multinacional neozelandesa de radiocomunicação registrava consecutivos prejuízos no Brasil. Havia feito demissões e ameaçava encerrar as atividades por aqui. Com foco em fornecer rádios para comunicação em operações em setores de segurança, forças militares, energia e mineração, a empresa, estava há sete anos tentando desvendar o mercado brasileiro, sem sucesso.
O recado foi dado logo no primeiro dia de trabalho, quando Bovo perguntou ao seu chefe sobre a expectativa com a sua chegada. “Mostre para o board que fazer negócios no Brasil é viável, e impeça que a Tait feche no Brasil”, disse o superior. O cenário era tão desafiador que a matriz já não acreditava na viabilidade da permanência no país. “Eles achavam muito difícil fazer negócios no Brasil”, conta o executivo.
Bovo, que já conhecia o setor e suas peculiaridades, percebeu rapidamente o motivo do fracasso: a tentativa de operar no Brasil utilizando a mesma lógica de negócios da Nova Zelândia, ignorando as especificidades do ambiente de negócios e a cultura local. “O latino tem a característica de interagir, de negociar, de barganhar. O neozelandês não gosta disso, ele gosta de sentar, conversar, olhar a especificação do produto. E o Brasil não é assim, você precisa interagir”, explica.
A matriz resistia a participar de licitações, não compreendia o tempo, o tom mais informal das negociações locais, tampouco conhecia as regras tributárias e jurídicas do país.
Foi quando o executivo começou a proferir uma frase que se transformou quase que em um mantra nas reuniões com a sede: “in Brazil is different” (no Brasil, é diferente). Com a liberdade para implementar mudanças nos processos adequando a empresa aos ritos de negócios brasileiros, o executivo conseguiu que a empresa vencesse a sua primeira licitação para vender equipamentos para a Política Estadual do Espírito Santo. Para a matriz era como se o executivo tivesse feito mágica. “Eu disse para o meu chefe que não tinha feito mágica, apenas que tinha seguido o processo. In Brazil is different, lembra?”
O bom resultado derrubou um pouco da desconfiança da matriz e reforçou que a gestão da filial estava indo no caminho certo. O board passou então a apoiar a estratégias locais, como a criação de consórcios entre a sede e a subsidiária para viabilizar isenções fiscais em compras públicas. “Nunca ninguém tinha nos dito que era preciso ser desse jeito, surpreendiam-se os executivos do board da Nova Zelândia”.
A “cereja do bolo” para que a Tait Brasil caísse nas graças da matriz, segundo Bovo, foi a conquista da licitação para fornecimento de equipamentos para a Polícia Militar de São Paulo. “Foi até engraçado porque a primeira vez que o pessoal da matriz veio para cá, verificaram tudo, veio auditoria externa para confirmar que a gente não estava mascarando os números e viram que estava tudo certo”, diz.
A filial brasileira virou referência de gestão dentro da companhia. “De patinho feio virou cisne. O Brasil hoje é a região mais produtiva da Tait fora da Nova Zelândia”, diz, Bovo, que foi convidado a cuidar da operação da multinacional na América do Sul. Também deu certo. “No primeiro ano, o resultado de zero virou metade do Brasil.” A mudança de paradigma da Tait na América do Sul chamou a atenção até do governo da Nova Zelândia que apresenta a empresa como case de sucesso e exemplo para empresas do país que queiram expandir sua atuação para o continente. “A gente hoje é exemplo”, diz o executivo.
