A curiosa relação de morde e assopra do governo Bolsonaro com Guedes
Ministro ainda tenta emplacar sua agenda liberal apesar de estar escanteado e não contar com a simpatia da campanha do presidente
O ministro da Economia, Paulo Guedes, não vive seu melhor momento no governo. Enquanto trabalha nos bastidores na tentativa de salvar sua agenda, o fogo amigo vem de várias frentes. Os afagos, também. Guedes vem sofrendo com o enxugamento de suas atribuições, direcionadas ora para o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, ora para o da Casa Civil, Ciro Nogueira, ora para o do Trabalho, de Onyx Lorenzoni. Mas mantém-se confiante — ou pelo menos é isso que deixa transparecer aos aliados.
Ele, agora, bate na tecla de que vai conseguir aprovar uma reforma tributária e dar vazão às privatizações ainda este ano, algo que tenta desde 2019. A meses da eleição, ele defende que o andamento de sua agenda é fundamental para atrair de volta o eleitor menos, diga-se, ferrenho do presidente Jair Bolsonaro e o mercado — que já olha com menos repulsa até mesmo para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Em meio às pressões e ao derretimento de sua agenda, Guedes ganhou um afago do presidente Bolsonaro nesta semana.
“Apesar de todos os problemas, graças a Deus, o Brasil na economia vai bem e eu fico feliz com isso por estar à frente do Executivo e ter pessoas maravilhosas ao meu lado realmente comprometidas com o destino da nossa nação”, disse Bolsonaro em um evento público. “Falar em economia, Paulo, você fala melhor do que eu, obviamente né? Eu costumo dizer que eu entendo tanto de economia quanto você de política. Então, nós somos um casal perfeito, eu não entro na área dele, ele não dá peruada na minha área. Ele dá cada peruada que você cai para trás”, disse o presidente.
Mas nem tudo são flores. Aos secretários, Guedes diz-se confiante com o desenho das diretrizes econômicas de um eventual segundo mandato de Bolsonaro, mas vem enfrentando resistências públicas e privadas. Uma ala significativa do PL, partido de Bolsonaro, torce o nariz para o ministro e defende que Guedes é nocivo para as intenções eleitorais do presidente. Esse discurso encontra coro em ministros palacianos, que sopram aos ouvidos do presidente que Guedes mais atrapalha do que ajuda. O ministro resiste e, ainda, tem a confiança de Bolsonaro — mas cada dia menos.
Bolsonaro vê em Guedes a última ponte com a parte dos eleitores que o elevou à Presidência da República, mas o próprio ministro admite que o apoio recebido caiu “de 90% para 60%”. Apesar de estar empenhado em estar com Bolsonaro para eventuais quatro anos mais, membros do próprio ministério admitem que ainda não há sinalização formal de que Guedes responderá pela agenda durante as eleições — talvez, nem num segundo mandato. Em entrevista ao jornal O Globo, o filho mais velho do presidente, Flavio Bolsonaro, tergiversou e colocou nas mãos de Guedes a permanência.
“Eu não sei se ele seguiria no cargo em um segundo governo. Depende da disposição dele, que é cansativo”, disse. “Se ele quiser continuar dando sua contribuição, o presidente Bolsonaro vai indiscutivelmente topar na hora, mas não sabemos os planos pessoais dele”, afirmou. Não é bem assim. Guedes sabe que seu papel envolve ser o “burocrata malvado” no governo, enquanto a ala política sorri e provém benesses eleitoreiras. “Eu sou o chato que barra, e tenho que ser. Ministro da Economia não pode ser visto como o bonzinho que dá dinheiro”, afirmou em uma reunião com Bolsonaro e ministros.