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“A internet é o spoiler da curiosidade”, diz Walter Longo

Presidente do Grupo Abril abriu a terceira edição do fórum 'A Revolução do Novo', hoje em São Paulo

Por Revista Exame
Atualizado em 5 jun 2017, 14h48 - Publicado em 5 jun 2017, 11h01

O presidente do Grupo Abril, Walter Longo, abriu nesta segunda-feira a terceira edição do fórum A Revolução do Novo. Promovido por VEJA e EXAME, com apoio da Coca-Cola, o evento discute mudanças na economia, política, tecnologia e sociedade, e o terceiro encontro da série teve por tema “A transformação do mundo”.

“Vamos falar aqui sobre um tema que temos discutido, que é o trilema digital. Quem assistiu à série Black Mirror viu nela críticas mordazes à era digital e ao seu impacto na sociedade. Meu objetivo aqui não é criticar, mas dizer que precisamos estar alertas sobre alguns desafios à nossa frente”, disse Walter Longo. Segundo o executivo, o universo digital traz infinitas possibilidades, mas desafios muito relevantes. Ele citou três grandes tendências que estão preocupando cientistas sociais e tirando o sono de empresários e executivos.

“A primeira característica que deve chamar nossa atenção é a exteligência”, disse. Hoje, explicou, o conhecimento não precisa mais ser armazenado no cérebro, uma vez que basta um toque no smartphone para acessar um mundo de informações. “O problema é que, se tudo o que eu tiver de guardar, eu o fizer em outro lugar que não o meu cérebro, os neurônios não se conectam e não fazem sinapses. Não há geração de insights”, afirmou Longo.

Como explica o executivo, é a partir da referência que se gera repertório, que, por outro lado, gera ideias. “Ora, se eu não tenho nada na minha cabeça, sem dúvida a qualidade do meu pensamento será reduzida”. Na visão do presidente do Grupo Abril, “sem o combustível do conhecimento embarcado não vamos tão longe”.

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Para ele, a facilidade de obter conhecimento deve ser celebrada: nunca foi tão fácil obter conhecimento e, além disso, não é mais necessário armazená-lo no cérebro. Mas isso resulta na diminuição da curiosidade, segundo o executivo.”Curiosidade está para o conhecimento como a libido está para o sexo, como diz o economista Eduardo Gianetti”, citou Longo.

De acordo com Longo, estamos vendo uma polarização da sociedade entre os curiosos e os descuriosos. “A internet está tornando os espertos mais espertos e os estúpidos muito mais estúpidos”, afirmou o executivo. Segundo ele, a curiosidade pode virar algo exclusivo das elites cognitivas. “As elites não serão mais identificadas pelo dinheiro que possuem ou pelo lugar social que ocupam, e sim por sua capacidade de pensar”, disse. Walter Longo define a internet como o spoiler da curiosidade.

O segundo ponto preocupante desse trilema digital é o tribalismo. Antes da era digital, a televisão era dividida entre os membros da família. “Eu estava sempre frente a frente com escolhas que não eram minhas. Assistia a jogos de futebol de times que eu não conhecia e passei a descobrir o prazer do espetáculo esportivo”, afirmou. Alguém de esquerda, conta Walter,  deparava com opiniões de direita no jornal, e muitas vezes acabava revisando as convicções. “O contraditório nos obrigava a revisitar teses para estar constantemente confirmando ou alterando nossas crenças, hábitos e preferências”, explicou. Foi assim com a geração X. Mas hoje isso está acabando.

As pessoas só leem o que querem, ouvem o que gostam, só assistem ao que gostam, argumentou o executivo. “A polarização política que a gente enxerga hoje no Brasil tem seu palco nas redes sociais, que só reforçam essa tendência maniqueísta”, disse, assinalando que o uso crescente de algoritmos tornou esse fenômeno mais agudo. “Se entro no Spotify e peço para ouvir pagode, para o resto da vida sempre vão me sugerir pagode”, disse. Na visão dele, estamos assistindo ao fim do contraditório e à perda da opinião. “E isso traz como consequência pessoas cada vez mais sectárias”, alertou. Violência e indiferença são os riscos nesse cenário.

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A terceira característica que Longo apresentou dentro do trilema digital é o compartilhamento. De acordo com ele, é preciso avaliar qual é o impacto econômico dessa tendência de consumir menos e compartilhar mais. “Menos carros particulares e mais carros compartilhados, menos hotéis e mais casas compartilhadas, menos escritórios e mais espaços de coworking. Essa é uma tendência sem volta, mas que traz o risco da desaceleração da espiral econômica. Vamos ter aí na frente um desafio”, disse Longo. Devemos ir em busca disso, na opinião dele, pois é o caminho do consumo consciente. “Novas gerações parece que não querem consumir nada, mas querem aproveitar tudo”, diz Longo.

Tudo isso é bom, mas é preciso pensar no impacto disso para a economia, propõe o executivo, “já que ninguém em sã consciência é a favor do consumo irresponsável”. De acordo com Longo, devemos e precisamos ser otimistas em relação ao futuro, e por isso ele chama todas as questões de trilema, já que não as vê como problema. A questão que se coloca é enfrentar, analisar e resolver. “Não adianta achar que está tudo em ordem”, disse.

O mundo sempre se sobressaltou quando surgiram problemas que pareceriam insolúveis, lembrou o executivo. “Quando o problema surge, somos impactados e não vemos saída. A solução só aparece depois. Se aparecesse antes, não existiria o problema”, disse.

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