A dúvida que paira na negociação da PEC de Transição
Proposta deve ser apresentada após o feriado pela equipe de Lula; período de 'licença' do Bolsa Família do teto ainda não foi decidido

A equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve apresentar após o feriado a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pedirá uma licença para gastar acima do teto de gastos para poder cumprir a promessa da manutenção de 600 reais do Auxílio Brasil — que deve voltar a se chamar Bolsa Família. O que a equipe comandada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) negocia é o período durante o qual o programa social vai poder furar o teto e abrir espaço para que o novo governo possa gastar.
A ideia estudada é pedir a excepcionalização do valor que já está previsto no Orçamento de 2023 junto com o que seria necessário para bancar o Auxílio Brasil de 600 reais e o bônus de 150 reais por criança de até 6 anos. O valor seria de 105 bilhões de reais — referentes aos 405 reais mensais de benefício previstos pelo governo de Jair Bolsonaro para 2023 — mais 75 bilhões de reais necessários para o complemento dos 600 reais e o bônus para as crianças. Com a excetuação do teto, o novo governo teria mais espaço fiscal para cumprir outras promessas, como a recomposição do orçamento do Farmácia Popular, de outras áreas da Saúde, bem como o aumento real do salário mínimo. A negociação com líderes da Câmara e do Senado se dá com relação à duração dessa licença para furar o teto: se apenas para 2023, se durante o mandato de Lula ou de forma indeterminada.
O relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI), defende que a retirada seja feita de forma permanente, argumentando a importância social da medida. “A PEC da Transição tem um princípio justo e é urgente. Não vejo necessidade alguma de colocarmos um prazo de validade em uma medida social que vai ter um impacto da mais alta importância na vida dos brasileiros mais pobres”, escreveu o senador no Twitter na última segunda-feira.
Essa licença indefinida, entretanto, não agrada à base do atual governo, que teme perder articulação a partir de 2023, quando passar a ser oposição. Segundo Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil de Bolsonaro, abrir o prazo para mais que um ano seria “usurpar” o Congresso. “Estender para quatro anos a atribuição do Congresso que termina não é só a usurpação de poder do Congresso que ainda nem começou. É a falta de critério democrático.”
O prazo indeterminado também preocupa o mercado financeiro, já que não há sinalização da fonte de custeio ou uma previsibilidade para o crescimento dos gastos sociais, caso excetuados para sempre. Durante participação na Brazil Conference, evento do grupo Lide realizado em Nova York, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles defendeu que a “licença para gastar” tenha um limite e que, superada a discussão da abertura do espaço fiscal, se volte a uma discussão de racionalização dos gastos públicos.