Relatório da reforma tributária recomenda IVA com alíquota única
Grupo de trabalho, entretanto, admite tratamento diferenciado para alguns setores, como saúde e educação
É biscoito ou bolacha? A discussão que inflama de cariocas a paulistas é mais antiga do que a disputa estadual e remonta ao Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cuja criação está prevista na reforma tributária, em tramitação no Congresso, para substituir cinco tributos atuais. Introduzido em 1973 no Reino Unido, e adaptado em mais de 170 países, o Value Added Tax (VAT), o imposto único, é responsável por trazer 70 bilhões de libras para a economia.
Apesar do sucesso arrecadatório, o modelo possui distorções que, mesmo antiquíssimas na terra da rainha, são atuais nas discussões tributárias no Brasil. Em 1991, a Receita Federal britânica foi aos tribunais para cobrar da fabricante da guloseima Jaffa Cakes alíquota da sobremesa como se fosse uma espécie de bolacha recheada. De acordo com a lei do Reino Unido, o IVA sobre bolos é fixado em 0%. No entanto, a lei estabelece que se um biscoito for parcial ou totalmente coberto com chocolate ele deve ser tributado pela alíquota padrão (17,5% à época; 20% hoje). No fim das contas, a Justiça decidiu, não sem antes muita discussão, que os Jaffa Cakes são… bolos, portanto isentos de tributação. A bizarrice britânica é apenas um exemplo do que acontece com alíquotas diferenciadas ao IVA, cujo objetivo inicial é, na realidade, simplificar o sistema tributário. Para evitar a bizarrice exportada, o Grupo de Trabalho da reforma tributária na Câmara apresentou relatório nesta terça-feira, 6, recomendando alíquota única aplicável a todos os bens e serviços.
Segundo o documento, que servirá de diretriz para a aprovação da matéria, “diversos estudos econômicos comprovaram que políticas públicas baseadas na concessão de alíquotas menores para produtos essenciais são pouco efetivas”. As duas PECs que estão em tramitação, inclusive, propõem um IVA de alíquota única.
Essas medidas, contudo, sofreram questionamentos sobre sua efetividade e o impacto que teriam para tornar a tributação do consumo menos regressiva. “Isso tudo ampliou as dúvidas dos membros do Grupo de Trabalho, que externaram sua preocupação com eventual aumento de tributação incidindo sobre bens e serviços consumidos pelas parcelas mais humildes da sociedade”, afirma o colegiado em relatório.
Nesse contexto, a diretriz é que se permita a adoção de uma alíquota padrão, permitindo-se outras alíquotas para bens e serviços “apenas em determinados casos”. “O Grupo de Trabalho recomenda evitar sua aplicação a setores da economia como um todo, limitando-se a sua aplicação a alguns bens e serviços relacionados a determinados setores elencados na emenda constitucional, de modo a evitar o aumento da carga tributária”, afirma o documento.
Os setores que devem receber tratamento diferenciado são saúde, educação, e transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano e aviação regional, bem como a produção rural. “Além desses, deve-se avaliar a possibilidade de manter o tratamento diferenciado aos produtos da cesta básica”, completa o relatório.