O mercado imobiliário gourmetizou as velhas repúblicas estudantis
Empresas do setor investem em novos produtos para a moradia de estudantes
O mercado imobiliário brasileiro adora embalar projetos e bairros com novos nomes e cores, como se fosse uma coisa nova, é o que se chama atualmente de “gourmetização”. A bola da vez dessa moda de uma nova roupagem para algo bem conhecido é rebatizar as conhecidas repúblicas estudantis. O que sempre foi sinônimo de pequenos dormitórios nos anexos das universidades o mercado transformou em instalações super modernas. Esse tipo de conforto pode até convencer muita gente a querer voltar para a sala de aula.
A bem da verdade, as novas repúblicas estudantis são microapartamentos de 25 a 40m2 em condomínios com total infra estrutura de serviço e lazer, perto de universidades e metrô, com locações a partir de R mil. A diferença para os estúdios convencionais é que toda a estratégia do negócio foi pensada para os estudantes, em especial os de famílias de maior faixa de renda, que saem de suas cidades para ingressar em boas faculdades públicas.
A ideia é realmente muito interessante, já que os estudantes vivem em um condomínio cercado de pessoas que estão no mesmo momento de novas descobertas e desafios. Estar morando com toda a infraestrutura no prédio é também uma mão na roda e menos uma preocupação para os pais que investem alto na independência e formação acadêmica dos filhos.
Esse nicho de residências voltadas para estudantes ainda está bem tímido no Brasil, mas é uma realidade nos Estados Unidos e Europa, onde as famílias já têm o costume de ver seus filhos saindo de casa para morar nos campus das universidades. Quem começou a apostar nesse segmento no Brasil foi a Uliving, empresa que pertence às gestoras de investimentos imobiliários VBI Real Estate e a britânica Grosvenor, que iniciou com esse conceito em 2012 e hoje possui seis prédios em funcionamento e outros dois em obras com entregas previstas para este ano ainda, totalizando oito empreendimentos. Três ficam em São Paulo (Jardins, Pinheiros e Higienópolis), dois em Porto Alegre e os demais nas cidades do Rio de Janeiro, Campinas e Santos.
A aposta, pelo jeito, deu certo. Para alugar uma das moradias universitárias hoje é preciso ficar na fila de espera e estar dentro do perfil de morador que as empresas buscam, quase um verdadeiro vestibular. Quando a vaga é aberta, a empresa promete um processo de locação rápido e fácil, em um ambiente 100% digital, sem necessidade de fiador e com todas as contas em uma única mensalidade. Nesta semana, a empresa Uliving informou ao mercado que vai investir R$ 450 milhões entre 2025 e 2028 para dobrar de tamanho e se firmar na liderança desse mercado no país.
Viver em um desses apartamentos estudantis vai muito além da facilidade dos serviços e proximidade com a universidade. Para conquistar o seu público, a empresa planeja uma série de eventos ao longo dos anos nos condomínios para “incentivar a vida em comunidade e o crescimento pessoal e profissional” como anunciam no site da empresa.
Uma realidade bem diferente dos estudantes que moram na USP, eleita pela Times Higher Education como a única instituição de ensino superior da América Latina que está entre as 100 melhores do mundo no quesito reputação. Apesar desse lugar privilegiado no ranking de ensino, as instalações das moradias estudantis da USP estão reprovadas. O Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo (CRUSP) tem cerca de 1.600 vagas, disponibilizadas para estudantes dentro da própria área da universidade e estão localizadas na capital paulista, no Butantã e nas cidades de Ribeirão Preto, Bauru, Piracicaba, São Carlos e Pirassununga. A moradia é oferecida de forma gratuita e faz parte da política de permanência da USP, que tem como objetivo diminuir a evasão de cursos por dificuldades socioeconômicas. Por isso, a seleção dos alunos para morar no conjunto é feita por critérios socioeconômicos.
O dia a dia dessas suas moradias universitárias é bem diferente. Enquanto seu colega rico tem serviços de primeira, segurança, conforto e festas, o estudante da USP convive em um ambiente precário com mais de 20 anos sem reforma. A estudante Luana Nascimento narra seu cotidiano como estudante e moradora da Universidade na rede social Tik Tok, onde é possível constatar as condições do ambiente.
Seria ótimo que a Administração Pública se inspirasse no sucesso e nos cuidados que as empresas privadas estão tendo com seus moradores e investisse mais um pouco nas suas instalações, ajudando os estudantes de baixa renda com seus sonhos de estudarem em uma Universidade tão renomada com conforto e segurança.