Americanas: “Impossível desconhecer o rombo”
Participantes de conselhos de grandes empresas e bancos desconfiam da versão de que controladores da varejista não sabiam do rombo de R$ 20 bilhões
Acionistas que estão fora do dia a dia financeiro e operacional de uma companhia geralmente exercem seu poder nos conselhos de administração. Mas estar fora da rotina administrativa não significa que eles desconheçam o que se passa na empresa – no fim, tudo deve passar por eles. Este é o ponto central que leva muitos executivos e sócios de bancos ouvidos por esta coluna a colocar em xeque a versão de que Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Alberto Sicupira foram pegos de surpresa pela descoberta de um rombo de R$ 20 bilhões na contabilidade da Americanas. E um rombo que, pelas informações disponíveis, se formou ao longo de anos. “O acionista que era o controlador só fala com os executivos nas reuniões de board?”, questiona um grande empresário. “E só vê o material que é apresentado nas reuniões do conselho? Não liga nunca para os seus executivos? Não pede nada?”
Para esses empreendedores, os três acionistas da Americanas sabiam de tudo e mantiveram uma linha de conduta considerada no mínimo antiética sem receio de punições. “Há uma segurança estrutural de que nada seria descoberto e, se fosse, não aconteceria nada com eles, na medida em que têm muito poder econômico”, afirma um banqueiro. “Não saber de nada é argumento absurdo. Uma ficção. Impossível desconhecer o rombo desse tamanho”, afirma um empresário, presidente de um conselho. Aliás, esse tem sido um dos argumentos apresentados pelos bancos credores da Americanas que escolheram a Justiça para tentar reparar seus prejuízos. O Bradesco, por exemplo, chegou a falar em “maior fraude da iniciativa privada” no País.
Mas, afinal, para que serve um conselho de administração de uma empresa? Trata-se de um órgão superior normativo, consultivo e orientador da organização. O conselheiro exerce a função de escutar, orientar, aconselhar, encaminhar e acompanhar os casos. Na prática, por meio dele, é possível descentralizar as decisões de CEOs e diretoria, tornando coletiva a responsabilidade pelo futuro do negócio.
Aos olhos da lei, um conselheiro pode responder pela “culpa in eligendo”. E o que é isso? É quando atos praticados com culpa ou dolo pelos administradores que foram nomeados justamente pelo acionista (e conselheiro) causam prejuízos para a empresa. ‘É impossível não saber. Até porque há auditoria e conselho fiscal”, afirma um presidente de conselho de um banco, para quem a manipulação do balanço da Americanas nos últimos anos deveria ser do conhecimento de, “no mínimo, entre 10 e 15 profissionais”. “Seria impossível não saber de uma fraude desse tamanho.”