Transição energética a caminho: conheça os tipos de bioenergia
Agronegócio tem desempenhado papel vital na conversão energética global
As bioenergias têm surgido como uma das alternativas mais promissoras para solucionar os problemas das emissões, mudanças climáticas e do aquecimento global. O termo “bioenergia” pode ser definido como a geração de energia (capacidade de um corpo em realizar um trabalho) obtida a partir de matérias-primas renováveis.
Essas fontes de matéria-prima englobam materiais orgânicos, conhecidos como biomassa, que têm grande importância para o setor do agronegócio, tais como: subprodutos do processamento da cana-de-açúcar (palha, vinhaça e bagaço); subprodutos de outras culturas (cascas de arroz e de café, licor negro); resíduos da produção animal (dejetos); e resíduos florestais. Há, ainda, fontes da natureza, como sol, vento, água, energia térmica do núcleo da Terra e das marés.
Além da divisão entre a origem da matéria-prima utilizada na produção de bioenergia, é possível realizar a divisão de acordo com a finalidade da bioenergia, separando a bioenergia entre biocombustíveis e bioeletricidade. Em um modelo desenvolvido por nós, chamado de “Matriz da Transição Energética”, podemos identificar as diferenças entre esses conceitos e as principais fontes que abrangem.
Biocombustíveis
Biocombustíveis representam a bioenergia utilizada como combustível para veículos, substituindo ou somando-se aos combustíveis fósseis, como gasolina, diesel e gás. Dentre os biocombustíveis, temos:
- Etanol: o biocombustível mais utilizado e conhecido no Brasil. Com potencial de abastecer mais de 40 milhões de veículos, o etanol brasileiro é produzido principalmente pela fermentação da cana-de-açúcar. Além da cana, o milho é outra matéria-prima que tem ganhado força, como já é tradicionalmente realizado nos Estados Unidos. No Brasil, a mistura obrigatória de etanol na gasolina é de 27,5%.
- Biodiesel: combustível produzido a partir de óleos vegetais ou gorduras animais. No Brasil, a principal matéria-prima para produção é o óleo de soja, 80% do total. É utilizado como substituto do diesel tradicional em veículos pesados, podendo ser usado puro ou em misturas com o diesel convencional. No Brasil, a mistura obrigatória de biodiesel no diesel veicular tradicional é de 14%.
- Biometano: biocombustível gasoso produzido a partir da digestão anaeróbia da matéria orgânica, como resíduos agrícolas e urbanos. Sua produção ocorre após um processo de upgrade que purifica o biogás e eleva a sua concentração de metano para mais de 90%. Pode ser utilizado como combustível veicular em veículos adaptados para o uso de combustíveis gasosos. No Brasil, já existem veículos movidos 100% a base de biometano.
- Sustainable Aviation Fuel (SAF): o mais novo “cliente” do agro. O “SAF” é um combustível para aviação produzido a partir de fontes renováveis como etanol, pellets de madeira, óleos vegetais, gorduras animais e outros resíduos orgânicos. O setor de aviação é um dos que mais contribuem com emissões de gases de efeito estufa. Portanto, a implementação do “SAF” representa uma inovação que pode mudar o rumo da sustentabilidade global. A produção em larga escala ainda não é realizada no Brasil.
- Hidrogênio Verde: considerado um dos biocombustíveis com maior potencial de crescimento pela emissão zero de gases de efeito estufa, o hidrogênio verde é produzido a partir da eletrólise da água, método que separa o hidrogênio do oxigênio e utiliza fontes renováveis, como a solar, hídrica ou eólica. A produção em larga escala ainda não é realizada no Brasil.
Bioeletricidade
Já a bioeletricidade é a eletricidade gerada a partir da queima de biomassa ou conversão de energia cinética/térmica em usinas. Dentre os principais produtos da bioeletricidade, temos:
- Biogás: combustível gasoso produzido pela decomposição anaeróbica de matéria orgânica, como vinhaça, torta-de-filtro e bagaço da cana-de-açúcar. O Brasil é uma potência emergente na produção de biogás, com um potencial de produção que pode atingir 10% da atual demanda por eletricidade do país, especialmente com matérias-primas advindas do agro.
- Eletricidade da biomassa: representa, aproximadamente, 5% da eletricidade consumida no Brasil. É gerada a partir da queima de biomassa em usinas termelétricas. A principal matéria-prima utilizada para sua produção provém do setor sucroenergético, por meio da utilização do bagaço da cana-de-açúcar (80% do total) e do licor negro, subproduto da indústria de papel e celulose (também do agro).
- Solar: respondendo por 16,5% da matriz elétrica brasileira, é uma das fontes com maior potencial de crescimento. Os painéis fotovoltaicos que convertem a luz solar diretamente em eletricidade tem a vantagem de serem instalados em residências, além da produção em fazendas solares.
- Eólica: geração de energia elétrica a partir do vento. Turbinas eólicas convertem a energia cinética do vento em energia elétrica. Com cerca de 13% da eletricidade consumida no Brasil, a produção se concentra na região Nordeste, local onde as características de clima favorecem a produção.
- Hidrelétrica: principal fonte de eletricidade do país, com mais de 51% do total. A água armazenada em barragens flui através de turbinas, transformando energia cinética em eletricidade.
A bioenergia desempenha um papel fundamental em políticas ambientais, como a política de “net zero” (compensação das emissões) e as metas estabelecidas pelo Acordo de Paris. A política “net zero carbon emissions” almeja a neutralidade das emissões de carbono por meio da redução da emissão de gases de efeito estufa. Dentro do acordo de Paris, cuja principal meta é manter o aumento da temperatura global abaixo de 2°C até o final do século, a redução das emissões é essencial.
A bioenergia contribui para a redução dessas emissões por meio da transição do uso de combustíveis fósseis, mais nocivos ao meio ambiente, para renováveis, além de promover a captura de carbono da atmosfera através do crescimento das plantas utilizadas como matérias-primas. Além de contribuir para o meio ambiente, a bioenergia pode gerar empregos e renda para milhões de pessoas ao redor do mundo, consolidando-se como pilar essencial para o futuro sustentável do planeta.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) da FGV (São Paulo – SP) e fundador da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em harvenschool.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves). Agradecimentos a Vinicius Cambaúva e Rafael Rosalino.