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Por que partilha só no IR?

Melhor seria considerar toda a arrecadação

Por Maílson da Nóbrega Atualizado em 4 jun 2024, 10h52 - Publicado em 22 abr 2023, 08h00

Em tempos de ajuste fiscal, em que o governo pode vir a aumentar a carga tributária, costuma-se pensar basicamente no imposto de renda (IR). É o que pode acontecer com o novo arcabouço fiscal, no qual as despesas estarão limitadas a 70% do aumento da receita.

Seria a hora de rediscutir a partilha do IR com estados, municípios e fundos regionais de desenvolvimento, mesmo porque o imposto foi desmontado pela Constituição e atos posteriores, como se verá adiante. Caberia ressuscitar proposta apresentada na Assembleia Constituinte e basear a partilha na arrecadação total, em vez de concentrá-la no IR (o IPI é partilhado, mas sua relevância é bem menor).

Fala-se que pode haver tributação de dividendos, mas isso só faria sentido com uma redução correspondente na incidência do tributo no lucro da pessoa jurídica. A ideia de que somente o Brasil e a Estônia não tributam os dividendos é incorreta. Na verdade, no governo FHC, optou-se por tributar o lucro na pessoa jurídica, isentando-o na distribuição. Por isso, nas empresas que operam pelo regime do lucro real, os lucros pagam 34%. No mundo, cobra-se em torno de 20%.

É comum errar quando se estima o aumento da arrecadação do IR no contexto de medidas para reduzir o desequilíbrio fiscal. Isso porque é preciso cobrar o dobro do necessário, pois a partilha consome 50% da receita. Como isso aconteceu?

Em 1974, a partilha correspondia a 12% do IR. Começou, então, por pressão de estados e municípios, a busca de crescente participação na receita do tributo. No governo Geisel, passou para 20%; no governo Figueiredo, para 28%; no início do governo Sarney, para 30%; na Constituição de 1998, para 47%, incluindo 3% para fundos regionais; nas emendas constitucionais posteriores, para os atuais 50%.

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“Milhares de prefeitos continuarão indo a Brasília para ganhar mais uma fatia do IR”

A União perdeu, portanto, 38% da arrecadação do IR, mas o prejuízo foi mais amplo. Em 1984, criou-se a vinculação de 13% do imposto à educação, porcentual elevado para 18% na Carta Magna. Mais tarde, vinculou-se 15% das receitas líquidas federais para a saúde. Descontando-se tudo isso, a União fica com apenas cerca de um terço do IR. Esse desmonte sem paralelo pode piorar. Milhares de prefeitos continuarão indo a Brasília para ganhar mais uma fatia do IR e gastá-la geralmente com o funcionalismo.

O efeito colateral desse processo foi desinteressar a União de recorrer ao IR quando o aumento de receitas fosse justificável. Parte disso adveio da elevação dos gastos sociais acarretada pela Constituição. Era melhor recorrer a tributos incidentes sobre o consumo, que pertencem integralmente ao governo federal. Piorou-se a qualidade do sistema tributário, que virou um manicômio prejudicial à produtividade. Caiu o ritmo de crescimento da economia e o sistema tornou-se cada vez mais regressivo (os pobres pagam proporcionalmente mais do que os ricos).

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Sem corrigir tais distorções, o Brasil continuará prisioneiro da armadilha do baixo crescimento.

Publicado em VEJA de 26 de abril de 2023, edição nº 2838

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