Cadê o programa de governo e o ministro da Fazenda?
Quem exige esses compromissos pode estar desconectado da realidade brasileira e das barreiras que se interpõem ao autoritarismo na política econômica
Tornou-se habitual demandar do candidato Lula, líder nas pesquisas de opinião, a apresentação de suas ideias para a economia, a que se associaria a divulgação do nome que vai ocupar o cargo de ministro da Fazenda em seu eventual governo. Em caso de recusa, Lula receberia, caso fosse o vencedor, um cheque em branco ou um salvo-conduto para fazer o que quisesse, especialmente o aumento descontrolado de gastos e uma política econômica irresponsável. Será?
O ideal seria que o eleitorado conhecesse as propostas dos candidatos, particularmente as de sua política econômica, consideradas chave para deslanchar o crescimento do PIB. É assim nos países ricos, em que os candidatos ao cargo máximo e suas equipes se esmeram em elaborar plataformas eleitorais atrativas ao eleitorado. Além da relevância atribuída pela maioria ao programa, este será checado por eleitores bem-informados para verificar a credibilidade de suas diretrizes.
Infelizmente, não é assim no Brasil. A demanda pelo programa é restrita a uma diminuta parcela da sociedade, irrelevante em termos de votos. Dificilmente chega a 10% do eleitorado. Mesmo os que apresentam seus programas costumam defender ideias genéricas. Na delicada situação fiscal deste momento, um programa minimamente correto deveria incluir, por exemplo, cortes nos gastos obrigatórios, compostos por despesas de pessoal, Previdência, educação, saúde e transferências de renda em favor dos mais pobres. Se Lula explicitasse tais ideias, seria perda de votos na certa.
O efeito eleitoral negativo também ocorreria se Lula anunciasse o futuro ministro da Fazenda. Um nome palatável pela minoria seria Henrique Meirelles ou outra pessoa com suas qualificações ou com credenciais políticas de um Antonio Palocci. Qualquer nome causaria desconforto em áreas do eleitorado, em especial dos que esperam um ministro que aumente gastos com investimentos e outros programas governamentais.
O mais provável é que Lula faça esses anúncios apenas se for eleito, como ocorreu em 2002. Ao contrário, ele tem esposado ideias fiscalmente irresponsáveis, como as da extinção do teto de gastos, de aumentos reais do salário-mínimo (que elevaria os gastos previdenciários), de intervenção no mercado de exportação de carnes e de elevação das despesas de educação, saúde e programas sociais. Ele pode até renunciar a elas se for eleito, repetindo o pragmatismo de seu primeiro mandato, mas imagina que tais propostas, feitas ao longo da campanha, reforçam o apoio de segmentos menos informados.
Também se fala em cheque em branco e em salvo-conduto. Pressupõe-se que Lula, uma vez eleito, gozaria de poderes autoritários para fazer o que lhe desse na telha. Os defensores da ideia esquecem que as ações do governo estão balizadas por regras institucionais e pelos freios e contrapesos da democracia brasileira. Haverá resistência do Congresso a medidas impopulares. Estará em jogo o papel de última instância exercido pelo Supremo Tribunal Federal. Não há mais como ser um ditador no Brasil.