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As favelas e o escritor José Lins do Rego

Por Lucila Soares
13 abr 2010, 08h17

O ano era 1951, e o escritor José Lins do Rego morava numa casa vizinha à Lagoa Rodrigo de Freitas, ao lado do Jockey Clube. Ao sair para um passeio, deparou-se com um movimento inesperado. “Vejo, então, o que não queria ver. Era o povo do morro que descera com os seus barracos na cabeça para enfincá-los ali. Uma cidade, de lata, de barro, de capim, de lama, de tábuas, surgia, como por encanto, pegado às paredes altas da cidadela dos cavalos ricos”, descreveu Lins do Rego com seu estilo desabrido em crônica publicada no jornal O Globo. O final do texto traz um apelo que, lido 59 anos depois, ganha força de profecia. “Eu aconselharia o Sr. Prefeito a ver a cidade nova que vem nascendo.”

O prefeito era o gaúcho João Carlos Vital, um dos muitos nomes esquecidos na história da cidade capital do Brasil, portanto sede do governo federal. A favela cujo nascimento Lins do Rego descreve não teve vida longa. Sequer chegou a ganhar um nome. Provavelmente, as pessoas que ali se instalavam foram retiradas quando da ampliação da Avenida Borges de Medeiros, que margeia a Lagoa pelo lado do Jardim Botânico e do Leblon. Esse duplo anonimato é quase simbólico. Mostra o quanto o surgimento e o crescimento das favelas deu-se no vácuo absoluto de qualquer ação do poder público. Desde sempre. Quando esse texto foi escrito, o Brasil entrava em seus anos dourados, e o Rio de Janeiro era o cenário privilegiado desse sonho coletivo de nação que tomaria forma no governo Juscelino Kubitschek. Mas as favelas já faziam parte da paisagem, e não paravam de crescer.

Remoções – Do outro lado da Lagoa, quase em frente à favelinha descrita por Lins do Rego, a Catacumba ocupava toda a encosta onde hoje fica o parque de mesmo nome. Os primeiros barracos começaram a ser erguidos nos anos 1930, e a população explodiu na década seguinte, com a chegada de uma leva de migrantes do Nordeste. Para além do Morro Dois Irmãos, a Rocinha já era quase uma cidade dentro do bairro de São Conrado, que pela dificuldade de acesso ainda não fora ocupado pela classe média. A Catacumba foi removida no governo de Francisco Negrão de Lima (1965-1970), na sequência do programa iniciado por Carlos Lacerda em 1960, que resultou na transferência da população de 12 favelas para conjuntos habitacionais. Embora correta como medida de disciplina urbana, a política adotada nessa época cometeu uma série de equívocos que, até hoje, dão munição aos que baniram a palavra “remoção” do arsenal de soluções possíveis para as favelas. A Cidade de Deus, conjunto habitacional erguido na Zona Oeste do Rio, sintetiza todas as mazelas desse modelo. Foi erguida numa região distante do centro do Rio, sem infra-estrutura alguma de transporte. Rapidamente transformou-se numa outra favela, numa história triste que ganhou o mundo em 2002, no filme de Fernando Meirelles.

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