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Os casais que reinventaram a troca de alianças após casamentos cancelados

Por causa do coronavírus, a opção de quem não quer adiar a subida ao altar é dizer o “sim” via aplicativo ou mesmo em uma igreja vazia

Por Maria Clara Vieira Atualizado em 24 abr 2020, 10h49 - Publicado em 24 abr 2020, 06h00

Tudo estava nos conformes para o casamento da advogada Laíss Casullo, de 33 anos, com o corretor de imóveis Erik Guerrieri, de 30, marcado para 21 de março em um charmoso restaurante italiano de Brasília, fechado para 55 convidados. A quatro dias da festa, a pandemia de Covid-19 baixou na capital federal e, com ela, a proibição de aglomerações. Assim, não mais que de repente, lá se foi o sonho milimetricamente planejado pelo casal durante dez meses. À medida que se aproxima maio, o mês das noivas, vai ganhando altura a montanha de convites que perdem a validade por causa do vírus infame, triste e inescapável. E, em meio à frenética correria para reagendar tudo, até a lua de mel, um punhado de noivos ousados está preferindo manter a data e casar como dá: em casa, via aplicativo, sem altar, sem convidados e sem música — mas de vestido de noiva, o único item do qual não se pode abrir mão. Laíss e Guerrieri foram ao cartório enquanto isso ainda era possível e lá, vestidos a caráter, trocaram votos diante de uma testemunha improvisada e uma tela de celular, que transmitiu o “sim” em tempo real para pais, padrinhos e amigos. “Fiquei um pouco triste, porque tinha planejado cada detalhe, mas a experiência serviu para resgatar a essência do casamento, que somos nós dois”, filosofa a noiva.

Agora que nem o civil no cartório é opção, o normalmente saudável mercado de festas de casamento está na UTI: no Estado de São Paulo, onde os casórios movimentam 5 bilhões de reais por ano, registrou-se o cancelamento de todas as grandes comemorações entre o fim de março e meados de julho (a data remarcada pelos mais otimistas), um corte de 40% na receita de cerimonialistas, doceiros e floristas. “Os adiamentos são uma tragédia sem precedentes no ramo. As empresas vão ter dificuldade em sustentar os custos fixos até a retomada das atividades”, lamenta o presidente da Associação Brasileira de Eventos Sociais (Abrafesta), Ricardo Dias.

BÊNÇÃO EXCLUSIVA - Raquel e Lombardi na igreja vazia: além deles, só o padre, os pais, quatro padrinhos e uma daminha de honra (David Zoëga/.)

Quando a ordem é ficar todo mundo em casa, improvisa-se o ritual da melhor forma possível. No Recife, Denise Guimarães, de 37 anos, e Marcelo Siqueira, de 40, resolveram se casar via videoconferência — eles em um lugar, o juiz em outro. A festa, pensada para setenta pessoas, limitou-se à reunião dos pais, irmãos e uma amiga na casa da mãe da noiva. “A gente riu muito durante a cerimônia. Estressante mesmo foi cancelar todos os serviços”, relata Denise. Diante das dificuldades de locomoção, o “sim” dos noivos perante o juiz (separados por quilômetros de distância, embora conectados por um smartphone) passou a ser considerado um casamento civil válido. Já o religioso é mais complicado. No catolicismo, o sacramento do matrimônio concentra o maior número de regras canônicas — e uma delas é justamente ter gente em volta. “É um ritual essencialmente comunitário e dificilmente será flexibilizado”, acredita o teólogo Felipe Magalhães, da PUC-­MG. Quem insiste, porém, consegue. No caso da delegada Raquel Gallinati, de 44 anos, e do investigador de polícia Marcel Lombardi, de 40 — ela, budista, ele, católico —, a festa para 120 pessoas em São Paulo deu lugar a uma cerimônia na Paróquia de Sant’Ana celebrada por um padre e presenciada pelos pais, quatro padrinhos e uma daminha. “Decidimos que o mais importante era a bênção e não nos arrependemos”, assegura Raquel.

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Tudo indica que, passado o pior da pandemia, casamentos voltarão a ser motivo de festança, visto que o ato de união — presente em todas as culturas, sem exceção — requer algum tipo de comemoração desde seus primórdios, que remontam às primeiras religiões politeístas. “O casamento é um rito de passagem relevante por marcar uma troca de papel diante da sociedade. Por causa disso, exige muito mais preparo do que uma festa qualquer”, explica o psicólogo Ailton Amélio, da Universidade de São Paulo (USP). Ao longo da história, a cerimônia foi ganhando pompa e circunstância, tomando como espelho as suntuosas celebrações nas cortes da Idade Média, que se estenderam com todo o vigor às monarquias modernas — preservando, contudo, os pilares originais. “Para preencher seu valor simbólico, o rito do casamento envolve juramento solene, testemunhas que certifiquem sua validade, trajes e comidas especiais e uma boa dose de emoção”, arremata Amélio. Isso, claro, quando o novo coronavírus for embora e pudermos voltar a viver em feliz aglomeração.

Publicado em VEJA de 29 de abril de 2020, edição nº 2684

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