Céu azul, mas nem tanto
Mirando estratégia e novos negócios, o fundador da Amazon deixou o comando da empresa em seu melhor momento - mas uma ameaça está à espreita de seu sucessor
Admirador confesso de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, a ponto de dar uma festa em casa para assistir ao episódio final da série poucas semanas antes de fundar, em 1994, sua amada Amazon, Jeff Bezos é o gênio nerd mais determinado do mundo. Dono de uma gargalhada estridente e irascível com os funcionários – em certo momento foi aconselhado a buscar ajuda profissional para lidar com eles –, Bezos decidiu parar de olhar o dia a dia de sua criança para pensar mais no futuro dela. Em mensagem aos colaboradores, comunicou que passará o comando a Andy Jassy, um experiente profissional que está com ele há 24 anos. Assumindo exclusivamente o cargo de presidente do conselho de administração (que, na prática, aprova as decisões estratégicas), Bezos, de 57 anos, terá o desafio de expandir os negócios ao infinito e além, incluindo aí o espaço sideral, enquanto joga aos leões do senado americano seu executivo-chefe.
Para entender o processo de sucessão, é preciso olhar, simultaneamente, o passado, o presente e o futuro da empresa, como se este último já estivesse escrito. A Amazon − cujo nome, inspirado no poderoso rio Amazonas, foi escolhido pelo próprio Bezos – nasceu como uma start-up de venda de livros pela internet, um segmento de mercado inexistente à época. Quase vinte e sete anos depois, a gigante do e-commerce faz cumprir os desígnios de seu fundador, que é o de ser a “loja de tudo”. Ou seja, se pode ser vendido, a Amazon o fará. Nessa visão de vender e entregar rápido pelo menor preço, que algoritmos rondando a internet sempre sabem qual é, ela varreu o mercado como um tsunami, levando à falência cadeias inteiras de comerciantes bem-estabelecidos.
A loja virtual, no entanto, é apenas um dos muitos negócios da corporação e nem é o mais importante. A divisão de computação em nuvem AWS − Amazon Web Services (rede de servidores que atende universidades, governos e empresas, incluindo a concorrente Netflix) teve, no último ano, um lucro líquido 13,5 bilhões de dólares maior que o da varejista on-line. Por sinal, o novo executivo-chefe é egresso da AWS e foi fundamental para que ela se tornasse líder em seu segmento – e justamente por isso o mercado recebeu com naturalidade o anúncio da sucessão.
Agora, o braço direito de Bezos cuidará do cotidiano do e-commerce, do streaming de filmes e séries, do desenvolvimento de produtos, além, claro, da bilionária AWS. Enquanto isso, Bezos, dono de uma fortuna de quase 200 bilhões de dólares, poderá dar atenção a outros empreendimentos que irão moldar o futuro. Sabe-se que ele é fascinado por Hollywood e pela mídia (em 2013, em um movimento inusitado, comprou o jornal The Washington Post, famoso por ter precipitado a renúncia do presidente Nixon em 1974). Porém, ao que tudo indica, a menina dos olhos não é o cinema nem o periódico, mas a Blue Origin, companhia aeroespacial que concorre com a SpaceX, de Elon Musk, na produção de satélites, cápsulas e transporte de carga. O fundador disse abertamente que, se necessário, venderá todo ano 1 bilhão de dólares de suas ações da Amazon para financiar a empresa de foguetes.
Enquanto isso, Jassy, além de cuidar da operação, enfrentará demandas de funcionários, que parecem dispostos a se sindicalizar, além da pressão de ONGs para não mais fornecer serviços de web a empresas de combustíveis fósseis. A maior dor de cabeça, entretanto, é a comissão antitruste do senado americano, que promete não dar descanso à Amazon nos próximos anos. Alguns senadores ventilam que Jassy será chamado para audiências em Washington antes que tenha tempo de esquentar a cadeira. Em decorrência disso, se a big tech for obrigada a vender parte de suas operações ou tiver seus planos de expansão cerceados, será um revés para a corporação e seus acionistas.
Desde 1994, Bezos é guiado pela premissa de vender melhor e mais barato. Ele acredita que os fabricantes, antes da Amazon, ficavam com margens de lucro exageradas, quase nunca repassadas ao consumidor pelos varejistas. Em suas próprias palavras, a Amazon seria uma empresa missionária, não mercenária, que surgiu para equalizar a situação. Sob sua gestão, as ações valorizaram impressionantes 225 000% desde que o capital foi aberto em 1997, chegando a 1,7 trilhão de dólares em valor de mercado, sem sinais de que irá parar de crescer. Talvez justamente por isso a comissão antitruste esteja desconfiada: os missionários estariam ficando com uma parte do bolo grande demais.
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