Vacina contra dengue reduz casos da doença pela metade
Laboratório divulgou detalhes de testes finais realizados com mais de 10.000 crianças na Ásia. 'Por enquanto, é o melhor que temos', disse pesquisadora

Os detalhes da terceira e última fase dos testes de uma vacina contra a dengue foram publicados nesta quinta-feira na revista médica The Lancet. Segundo os resultados, a vacina, chamada CYD-TDV e produzida pelo laboratório francês Sanofi Pasteur, tem eficácia moderada, de 56%. Em abril, a farmacêutica já havia anunciado a taxa de proteção, mas a pesquisa completa e os outros resultados ainda não haviam sido divulgados.
CONHEÇA A PESQUISA
Onde foi divulgada: revista The Lancet
Quem fez: Maria Rosario Capeding, Ngoc Huu Tran, Sri Rezeki S Hadinegoro, Hussain Imam HJ Muhammad Ismail e outros
Instituição: Instituto de Pesquisa para Medicina Tropical das Filipinas; Universidade da Indonésia; Instituto da Saúde da Criança, Tailândia; e outros
Resultado: A vacina CYD-TDV reduziu em mais da metade os casos de dengue entre crianças de regiões asiáticas com epidemia da doença. A maior proteção ocorreu contra casos graves de dengue, além das doenças causadas pelos tipos 3 e 4 do vírus.
Atualmente, não há nenhuma vacina disponível para proteger contra a dengue, mas existem algumas sendo desenvolvidas. A CYD-TDV é a primeira cujos testes clínicos chegaram à fase final. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 50 e 100 milhões de pessoas sejam contaminadas todos os anos no mundo.
A CYD-TDV é feita com uma versão do vírus da dengue enfraquecida, que não desencadeia a doença, mas consegue provocar uma reação do sistema imunológico do paciente. Isso faz com que o organismo produza anticorpos contra a dengue e esteja mais protegido caso seja contaminado.
Tipos – Resultados preliminares sobre a vacina CYD-TDV, divulgados em 2012, haviam indicado que a substância não protegia contra o tipo 2 da dengue. A nova etapa da pesquisa, feita com mais pessoas e em cinco países, e não em apenas um, concluiu que a proteção ocorre contra os quatro sorotipos da doença. A eficácia, porém, varia de acordo com a cepa: foi de 75% para os casos da doença dos tipos 2 e 3; 50% para o tipo 4; e 35% para o tipo 1.
“Ainda não sabemos se as outras vacinas que estão sendo desenvolvidas serão mais eficazes. Por enquanto, a CYD-TDV é o melhor que temos, mas 56% de eficácia nunca será uma solução única (para o controle da dengue)”, escreveu Annelies Wilder-Smith, pesquisadora da Universidade Tecnológica Nanyang, em Singapura, em um comentário que acompanhou o estudo. Annelies coordenou uma das etapas anteriores dos testes da vacina.
A nova fase estudo envolveu 10.275 crianças de 2 a 14 anos que moravam em regiões com epidemia de dengue de cinco países da Ásia: Indonésia, Malásia, Filipinas, Tailândia e Vietnã. Elas receberam três doses, com intervalo de seis meses entre cada uma, da vacina ou de placebo. Depois, elas foram acompanhadas por dois anos.
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Proteção – Segundo os resultados, o número de novos casos de dengue entre essas crianças foi 56,5% menor 28 dias após elas receberem a terceira dose da vacina. A proteção da vacina contra a forma hemorrágica da doença foi de 88,5% com as três doses. Além disso, a imunização reduziu em 67% as hospitalizações por complicações da moléstia.
“Estou desapontado com a proteção de apenas 56% da vacina, é uma taxa muito menor do que as metas normais”, disse Martin Hibberd, professor de doenças infecciosas da London School of Hygiene and Tropical Medicine, na Grã-Bretanha, em entrevista à rede BBC. Ele não participou da pesquisa.
Vacinas mais comuns, como a contra sarampo e poliomielite, têm eficácia superior a 95%. Segundo Lucia Bricks, diretora de saúde pública da Sanofi no Brasil, porém, considerar proteção de 56% dentro do contexto da dengue, que apresenta milhões de casos todos os anos no mundo, “é algo muito bom”. “Atualmente não há nenhum tratamento específico contra a dengue, apenas contra sintomas específicos. Por isso, essa é uma boa notícia, já que pela primeira vez uma vacina candidata consegue proteger contra dengue sintomática e suas formas graves.”
Ressalvas – Ainda restam algumas dúvidas em relação à vacina. Por exemplo, as crianças desse estudo foram acompanhadas por dois anos, então não se sabe se a eficácia pode diminuir a longo prazo. Além disso, a taxa de proteção da vacina foi menor em crianças mais novas: de 33,7% entre 2 e 5 anos de idade contra 74,4% de 12 a 14 anos.
Jean Gorinchteyn, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas
“Nós esperávamos uma proteção muito maior de uma vacina contra a dengue. O ideal seria uma redução de ao menos 90% no número de casos. É claro que não devemos desmerecer os resultados, é a vacina que chegou mais longe nos estudos e demonstrou ser segura. Ela pode ser importante no apoio da prevenção contra a dengue, mas sem eliminar a necessidade de outras medidas no combate à doença.”
Outro ponto questionado por alguns especialistas é a necessidade de serem dadas três doses da vacina, já que o estudo demonstrou que uma dose pode ser quase tão eficaz quanto. “Pelo fato de três doses com seis meses de intervalo cada ser uma abordagem cara e inconveniente de incluir em programas de escala nacional, a questão sobre se uma eficácia suficiente poderia ser alcançada com um menor número de doses merece ser estudada”, escreveu Annelies em seu comentário.
Risco? – Quando uma pessoa é infectada pelo vírus da dengue, ela produz anticorpos e se torna imune àquele sorotipo específico, mas não às outras cepas. Sendo assim, cada indivíduo pode ter dengue no máximo quatro vezes. Porém, esses anticorpos aumentam a suscetibilidade de o paciente apresentar formas mais graves da doença caso haja uma nova infecção.
Por isso, especialistas se preocupam com a possibilidade de que os anticorpos produzidos por pessoas que recebam a vacina provoquem o mesmo efeito. “Nós não entendemos a resposta dos anticorpos à dengue suficientemente bem para saber se esse problema também ocorreria com a vacina”, disse Martin Hibberd, da London School of Hygiene and Tropical Medicine.
América Latina – De acordo com Lucia Bricks, há outro teste em andamento em torno da vacina CYD-TDV. O estudo está sendo feito em cinco países da América Latina e Caribe, incluindo o Brasil, com cerca de 20.000 pessoas. Os resultados devem ser divulgados até o fim deste ano. A partir disso, o laboratório deverá entrar com pedido de registro nos órgãos regulatórios dos países para que a vacina passe a ser ofertada.












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