Saúde privada é pouco eficiente no tratamento de câncer de pulmão
Maior estudo já publicado sobre o tema mostrou que a sobrevida de pacientes com a doença está décadas atrás em relação a outros países
O câncer de pulmão é uma das doenças que mais mata no mundo. Em 2020, foram registradas 1.794.144 mortes, segundo o levantamento Globocan 2020, realizado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS). Esse número pode chegar a 3,01 milhões em 2040 (66,7 % a mais), se nada for feito para mudar o quadro atual. No Brasil, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), são esperados 30.200 casos em 2021, sendo que, anualmente, são registradas cerca de 30 mil mortes por câncer de pulmão no país. Os números são assustadores e por aqui o futuro não parece muito promissor – mesmo para pacientes da rede privada. Foi isso que mostrou um estudo publicado no mês passado no jornal JCO Global Oncology (JCO GO).
A pesquisa avaliou como é a trajetória de um paciente com o câncer de pulmão de células não pequenas (responsável por 80% dos casos) no sistema privado de saúde brasileiro no período entre 2011 a 2016. “Os objetivos principais foram descrever a jornada e as taxas de sobrevida de pacientes com este tipo de câncer de pulmão atendidos na saúde suplementar. Os resultados mostram um alto número de diagnósticos de doença metastática, baixas taxas de sobrevida e altos custos relacionados à assistência médica”, afirma o oncologista torácico Carlos Gil Ferreira, que liderou o estudo.
É o maior estudo em tamanho de amostra já publicado referente ao tema no Brasil e também um dos maiores de dados do mundo real sobre câncer, conduzidos globalmente em países de renda média. Foram estudados 5016 pacientes, a maioria tinha entre 60 e 69 anos (33,6%) e ensino fundamental completo (52,2%). Havia uma proporção maior de homens (58,1% x 41,9% mulheres). Os dados foram retirados de bases administrativas, de registros de instituições privadas de câncer e coletadas ao longo dos anos. “Desses registros constam a data da entrada do paciente, os tratamentos a que foram submetidos e data do desfecho (resposta ao tratamento, progressão ao tratamento ou óbito)”, explica Carlos Gil Ferreira. O estudo incluiu hospitais e planos de saúde de nível médio, mas não os de elite. “Pacientes com acesso a essas instituições em geral são tratados com medicamentos que nem existem no Brasil. Por isso não foram incluídos. Queríamos dados da população brasileira do sistema privado de saúde que fosse tratada de forma homogênea por oncologistas não necessariamente torácicos”, completa ele.
Atraso de décadas
O estudo mostrou que o perfil de sobrevida de pacientes com a doença no ambiente privado de saúde é de 6,5 meses nos casos mais graves. Esse número é comparável às taxas de sobrevida de outros países de décadas atrás. Isso significa que as baixas taxas de sobrevida mostradas na pesquisa são comparáveis com as anteriores à chamada oncologia de precisão, desenvolvida a partir dos anos 2000, cujos recursos, nesses casos, permitem uma sobrevida global mediana de 8-12 meses.
Para o oncologista, os motivos da alta mortalidade devem ser investigados e discutidos para melhorar a sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes. “O que ficou claro é que há espaço para melhorar, estimulando a detecção precoce do tumor e a abordagem multidisciplinar e fornecendo acesso a testes moleculares, quimioterapia, terapias direcionadas e imunoterapias” diz.
Outra descoberta relevante do estudo foi que entre a primeira consulta até o início do tratamento são decorridos dois meses. “O tempo ideal entre a primeira consulta, diagnóstico e tratamento não deveria ser superior a trinta dias. Em uma doença grave como câncer de pulmão, esse atraso pode ter impacto negativo no tratamento”, afirma Carlos Gil Ferreira.
A equipe de especialistas iniciará um novo estudo para analisar os dados de 2016 a 2021. É torcer por notícias melhores!