Carta ao Leitor: O alívio em etapas
É fundamental entender que não há uma bala de prata definitiva contra o coronavírus, mas um processo de aprendizado e conquistas, feito de avanços e recuos
Nos últimos dias, algumas boas notícias iluminaram uma avenida de esperança contra a pandemia no Brasil. A média móvel diária de mortes por Covid-19 chegou a 711, a menor marca desde o início de janeiro. É ainda alta e inaceitável, mas não para de cair. A taxa de ocupação de UTIs no estado de São Paulo atingiu 37,8%, índice do período anterior à eclosão do vírus, em 2020. A vacinação ganhou tração, com 27% da população completamente imunizada, embora precise ser expandida. Contudo, apesar do otimismo, convém evitar celebração exagerada. No Rio de Janeiro, por exemplo, com 60% dos registros da doença atrelados à variante delta, que se dissemina com mais velocidade, mesmo que com menos gravidade, houve crescimento exponencial de casos e até aumento no número de mortes.
Após um ano e meio de quarentena e do medo diante de um vírus desconhecido, ainda não temos todas as respostas sobre quando e como tudo voltará ao normal. E talvez assim permaneçamos durante algum tempo, em um vaivém de humores (basta olhar para os Estados Unidos, com os novos picos de surto). Um dado, porém, é incontestável: o Sars-CoV-2 veio para ficar. Mas não cabe desespero em razão disso. O momento é de atenção, com necessidade de distanciamento, uso de máscaras, testes e, evidentemente, vacinas. A elevada quantidade de mortos só terá fim quando um número suficiente de pessoas (algo em torno de 70% da população adulta) tiver adquirido imunidade por meio de vacinação ou infecção — preferencialmente vacinação, com duas doses ou dose única, a depender do fabricante. E então o novo coronavírus, já não tão novo, passará a ser endêmico, como são os microrganismos da gripe. Não será eliminado da face da Terra, mas tampouco revirará nossa vida como vem acontecendo desde o ano passado. Para que isso aconteça, porém, talvez tenhamos de nos vacinar anualmente — inclusive crianças —, e é quase certo que uma terceira dose seja compulsória.
É fundamental, portanto, entender que não há uma bala de prata definitiva, mas um processo de aprendizado e conquistas, feito de avanços e recuos. A saída para a mais grave tragédia sanitária do século (no avesso de uma “gripezinha”) será feita por etapas, de mãos dadas com a ciência e o conhecimento, contra o negacionismo, que é um retrocesso da civilização. Só assim, com extrema racionalidade, haverá a retomada da normalidade possível, como vemos em países como Espanha, Suíça, França e Alemanha, que já permitem shows em espaços públicos e autorizam a entrada de brasileiros — desde que vacinados. Durante um bom tempo (ou para sempre, insista-se) teremos de respeitar o vírus. Em resumo: será uma batalha longa, cansativa e dramática para a humanidade, com muitas vítimas pelo caminho, mas certamente vamos ganhá-la.
Publicado em VEJA de 1 de setembro de 2021, edição nº 2753