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Um basta ao feitiço da insensatez

Os catalães precisam sair do transe que só conduz a opções ruins

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 13 out 2017, 06h00 - Publicado em 13 out 2017, 06h00

AS RECEITAS para o sucesso nacional podem ser difíceis de definir, mas o momento do fracasso é fácil de ser identificado em muitos países mergulhados em tragédias: quando seus habitantes são intoxicados pelo ódio a tal ponto que isso se torna um fator absoluto em suas vidas. Não têm mais opção: a bandeira, a tribo, a religião, a nação, os ressentimentos reais ou exagerados do passado e a estridência com que isso tudo é tratado no presente criam uma espécie de transe coletivo. Uma característica de desvarios assim é que pessoas comuns abandonam os processos habituais de decisão, guiados pelo pragmatismo, e se deixam arrastar pelo delírio. Vizinhos passam a agredir, expulsar ou matar vizinhos. Está acontecendo na Síria e aconteceu na história recente durante as guerras de fragmentação da Iugoslávia e no genocídio de 1994 em Ruanda, quando uma parte do país passou a exterminar a outra usando facões. Apesar do método artesanal, demorou apenas cerca de três meses para que 900 000 tútsis, uma minoria étnica, acabassem picados. Muitos tinham o tendão de aquiles cortado e as vítimas se arrastavam em agonia pelo chão durante dias antes dos golpes finais. Era uma maneira literal de fazer os tútsis, que têm um tipo físico mais alto e longilíneo, descer do pedestal.

Será que os catalães a favor da independência de alguma maneira querem que os “espanhóis” também caiam do pedestal, ainda que metaforicamente? É quase inacreditável que isso possa acontecer na Espanha democrática e pluralista de hoje, empurrada para um buraco de opções ruins pelo transe nacionalista que se apossou dos secessionistas. Não são a maioria, mas são os que votam, ocupam as ruas e desejam cada vez mais fervorosamente a ruptura, mesmo que saiam prejudicados, percam empresas e empregos, fiquem no limbo na União Europeia e se tornem cidadãos de um país não reconhecido.

Por que indivíduos normais, pacíficos, vivendo num dos melhores lugares do mundo, com todos os meios para falar sua língua, cultivar suas origens e exercer os direitos da democracia — entre os quais não se inclui o da independência unilateral —, se tornaram irracionais?

A Espanha em geral e a Catalunha em particular viveram um tipo similar, e radical, de paroxismo durante a Guerra Civil. Nos três anos malditos entre 1936 e 1939, a brutalidade e a ilegalidade dos nacionales, os nacionalistas de Francisco Franco, não deixaram opções: ou se era a favor dos republicanos ou de um tipo de fascismo perverso e delirante, quase uma seita macabra simbolizada pela frase “Viva la muerte”, o lema dos falangistas. As matanças entre facções de esquerda e o Terror Vermelho empataram em barbaridade, embora ficassem longe em número de vítimas, entre as quais 6 832 padres, frades e freiras.

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Um dos mais desastrosos reis da Espanha foi Carlos II, conhecido como O Enfeitiçado pelo conjunto de síndromes cromossômicas herdadas da endogamia compulsiva dos Habsburgos. Enfermiço, deformado e impotente, não conseguiu ter herdeiros e abriu as portas da guerra e da intervenção na Espanha. Chegou a ser exorcizado. Na falta dessa opção, são os cidadãos conscientes que precisam quebrar o feitiço da insensatez. Agora.

Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2017, edição nº 2552

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