Sob pressão petista
Com a derrota de Lula no STJ, o PT se volta para a presidente do STF: em suas mãos pode estar a última chance de o ex-presidente se livrar da cadeia
Primeiro foi a caravana de parlamentares petistas. Mesmo sem audiência marcada, Gleisi Hoffmann, Benedita da Silva e Maria do Rosário, escoltadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, visitaram “de surpresa” a presidente da Corte, Cármen Lúcia, na quinta-feira 1º. O objetivo era convencer a magistrada a pôr na pauta de votação do Supremo o pedido de habeas-corpus preventivo impetrado pela defesa do ex-presidente Lula, que, se concedido, blindaria o petista da prisão após o julgamento do seu último recurso na segunda instância. Em seguida, vieram as manifestações dos próprios colegas da ministra. De formas diferentes — um por despacho e outro por declaração —, Dias Toffoli e Celso de Mello sugeriram que a presidente do STF, a quem cabe determinar a pauta da Corte, incluísse nela o habeas-corpus de Lula. Na terça-feira, depois que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou por unanimidade um HC semelhante, também pedido pela defesa do petista, a pressão contra Cármen chegou ao ponto máximo. Em nota divulgada poucas horas depois da conclusão da sessão no STJ, Gleisi Hoffmann, presidente do PT, afirmou que o STF “tem a obrigação de se pronunciar urgentemente” sobre a decretação da prisão após condenação em segunda instância.
Cármen Lúcia tem resistido a tudo e a todos. Ela já declarou que retomar agora a discussão sobre prender ou não prender condenados após a confirmação da sentença seria “apequenar” o STF. Isso porque, em 2016, o Supremo já havia julgado a questão. Na ocasião, o plenário da Corte decidiu por 6 votos a 5 que os condenados em segunda instância podem começar a cumprir pena imediatamente. Foi esse entendimento que norteou o julgamento de terça-feira pela 5ª Turma do STJ. Seus integrantes, os desembargadores Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik, concordaram que o Supremo já discutira a questão e apenas seguiram a jurisprudência do tribunal.
Ocorre que, recentemente, ministros do STF que em 2016 votaram a favor da execução da pena para condenados em segunda instância — entre eles Gilmar Mendes — sinalizaram ter mudado de ideia. Foi aproveitando-se dessa sinalização que a defesa de Lula entrou no STF com o pedido de habeas-corpus que quer agora ver julgado. Duas ações que questionam a chamada “execução antecipada da pena” também estão pendentes na Corte, uma impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a outra pelo PEN. Pelo fato de elas desembocarem na mesma pergunta (os condenados em segunda instância podem ou não ser presos imediatamente?), a inclusão de qualquer uma na pauta do STF é uma chance — talvez a última — de Lula se livrar da cadeia.
Em janeiro, o TRF4 confirmou a condenação do ex-presidente decretada pelo juiz Sergio Moro e sentenciou o petista a doze anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. A defesa de Lula entrou com pedido de embargos de declaração, recurso que não tem o poder de modificar uma condenação — serve apenas para esclarecer pontos da sentença considerados obscuros. Esses embargos devem ser julgados em abril. Se, quando isso acontecer, nada tiver mudado na decisão que o STF tomou em 2016, Lula deverá ser preso. Na segunda feira 5, a Procuradoria Regional da República da 4ª Região pediu o início imediato do cumprimento da pena imposta ao petista após o julgamento dos embargos.
Nos três julgamentos a que Lula foi submetido no caso do tríplex, os nove juízes votaram contra ele. Com isso, Lula começa a dar mostras públicas de que considera sua prisão uma possibilidade próxima. Na terça-feira 6, em entrevista à Rádio Metrópole, de Salvador, ele reafirmou sua inocência e, sem se referir explicitamente à possibilidade de ir para a cadeia, declarou que terá de ser “considerado um preso político”, uma vez que, segundo disse, não se conseguiu provar que ele “roubou um dólar”. O ex-presidente afirmou que quem o acusa vai “arcar com o preço” de decretar a sua prisão e sugeriu que não pretende tentar driblar uma ordem nesse sentido. “Tem gente que acha que eu deveria fugir para outro país, ir para uma embaixada. Eu não vou. Vou para casa. Amo este país.” O petista declarou ainda confiar nos tribunais superiores. Se essa “confiança” será mantida mesmo diante da resistência demonstrada por Cármen Lúcia às pressões de seus partidários e aliados é algo que se saberá em breve.
Publicado em VEJA de 14 de março de 2018, edição nº 2573