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Raridade histórica

Na política mundial, há diversos casos de ex-presidentes condenados à cadeia por corrupção, mas poucos, pouquíssimos, eram tão populares quanto Lula 

Por Diogo Schelp Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 20h41 - Publicado em 13 jul 2017, 12h54

Todo e qualquer governante ou grupo político atua para se manter no poder pelo maior período de tempo possível. Assegurar que sua visão de mundo e seus valores continuem sendo postos em prática está na raiz da sua razão de existir. Presidentes corruptos, no entanto, têm ao menos dois incentivos a mais para continuar à frente de um país ou conseguir que sejam sucedidos por apadrinhados políticos. O primeiro é manter de pé os esquemas para continuar enriquecendo ou usufruindo as benesses de ter o controle dos meios estatais. O segundo é não perder a influência necessária para ficar longe de qualquer punição. É assim até em democracias consolidadas, pois praticamente todas elas garantem aos governantes algum tipo de imunidade ou privilégio diante da lei. Faz sentido que seja assim, para evitar que o chefe de governo ou de Estado seja alvo de retaliação ou vingança de fundo político.

“Em países ditatoriais, quando um governante ou ex­-governante é punido por um ato de corrupção, em geral isso ocorre porque ele foi o perdedor de uma disputa interna ou de uma troca de regime e se tornou alvo de vingança política”, diz o americano Michael Johnston, cientista político da Universidade Colgate, nos Estados Unidos, e professor da Academia Internacional Anticorrupção (Iaca). “Em democracias, por sua vez, pôr um líder político contra a parede será sempre um processo tanto jurídico quanto político”, completa Johnston. E o fator político tem ligação direta com a popularidade do governante corrupto. Ao longo da história mundial, diversos presidentes ou ex-presidentes foram condenados — e presos — por corrupção. Raros são aqueles, porém, que foram punidos num momento em que desfrutavam alta aprovação popular. Lula, que na última pesquisa do Datafolha aparecia em primeiro lugar nas intenções de voto para presidente, é uma das poucas e notáveis exceções.

Talvez o único ex-presidente a manter apoio respeitável entre uma parcela dos eleitores mesmo depois de condenado e preso seja Alberto Fujimori, do Peru. Ele governou entre 1990 e 2000, ano em que, acusado de corrupção, fugiu para o Japão e tentou renunciar via fax. O Congresso não aceitou a renúncia e, em vez disso, submeteu-o a um processo de impeachment. Após um período no exílio, Fujimori ensaiou um retorno triunfal ao seu país, confiando na alta popularidade que ainda mantinha entre os peruanos. A manobra deu errado. Em 2005, ele viajou para o Chile, onde terminou preso. Dois anos depois, foi extraditado para o Peru e acabou condenado por corrupção e violações de direitos humanos. A fidelidade de muitos eleitores peruanos ao fujimorismo pode ser atestada pela alta votação recebida por sua filha, Keiko Fujimori, que ficou em segundo lugar nas eleições presidenciais do ano passado.

Nas circunstâncias certas, um processo por corrupção pode ter o efeito de elevar a popularidade de um líder político, se houver uma percepção de que as motivações são torpes e a acusação é injusta. Indira Gandhi, primeira-ministra da Índia entre 1966 e 1977 (e que, por um longo período, governou por decreto, com poderes excepcionais), foi presa por corrupção meses depois de fracassar na tentativa de conseguir um novo mandato por meio do voto. O julgamento que se seguiu, iniciado e incentivado por seus adversários políticos, que agora estavam no poder, acabou devolvendo a Indira Gandhi boa parte do apoio popular perdido em seus últimos anos de governo. Como resultado, nas eleições de 1980, ela voltou ao cargo de primeira­-ministra. Indira foi assassinada quatro anos depois, por motivos religiosos, por dois de seus guarda-costas.

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PARADOXO – Indira Gandhi, ao deixar a prisão, em 1978: julgamento por vingança lhe devolveu boa parte do apoio popular (India News/)

À parte casos excepcionais como o de Alberto Fujimori e Indira Gandhi, a condenação ou a prisão de ex­-governantes acusados de corrupção quase sempre ganham força ou encontram respaldo no clamor popular por punição. Em outubro de 2016, surgiram as primeiras denúncias contra a presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye. Uma amiga de infância, Choi Soon-sil, extorquia empresas em seu nome. A popularidade da presidente caiu de 30% para 4% no fim do ano passado, quando o Parlamento votou pelo impeachment. Em março, Park Geun-hye foi presa. Em Taiwan, o presidente Chen Shui-bian teve o genro e a esposa presos por suspeita de corrupção, em 2006. Com isso, sua aprovação caiu para 6%. Dois anos depois, ao terminar seu mandato, ele também foi parar atrás das grades. Sem perdão popular.

Na fila dos ex-presidentes que podem acabar atrás das grades estão o peruano Ollanta Humala e sua mulher, Nadine Heredia. Durante seu mandato, que terminou em meados de 2016, Humala foi acusado de corrupção. Era tão odiado que nem sequer indicou um nome para disputar sua sucessão. Como o empresário Marcelo Odebrecht declarou ter dado 3 milhões de dólares para sua campanha de 2011, Humala e a mulher correm o risco de ter a prisão preventiva decretada. Além de financiar campanhas, o suborno garantia o favorecimento para empreiteiras em licitações.

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(Arte/VEJA)

Com reportagem de Luiza Queiroz

Publicado em VEJA de 19 de julho de 2017, edição nº 2539

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