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Por quem os sinos dobram

Já não dobram tanto assim pelos relógios tradicionais, cujas vendas estagnaram com o avanço dos smartwatches, que marcam as horas e fazem muito mais

Por Giovanni Magliano Atualizado em 25 ago 2017, 15h22 - Publicado em 25 ago 2017, 06h00

Não há símbolo mais conhecido da dança das horas do que as badaladas do Big Ben, o sino do relógio da torre do Parlamento, em Londres. Ao meio-dia da segunda-feira 21, ele deixou de tocar e ficará mudo pelos próximos quatro anos, até o término da mais profunda restauração em seus 158 anos. É irônico que a reforma coincida com um dos momentos mais frágeis da indústria de relógios de pulso: a venda dos modelos tradicionais está estagnada há cinco anos. Cresce, contudo, o apelo dos relógios inteligentes, os smartwatches, que são uns computadores em miniatura.

O faturamento com a venda de relógios inteligentes da Apple já é o segundo maior do mundo. Perde apenas para o da mais conhecida das marcas, a suíça Rolex. Cinco anos atrás, em 2012, o mercado dos smartwatches era quase inexistente: somente 70 000 unidades foram comercializadas no mundo. Naquele momento, os poucos modelos disponíveis ofereciam funções básicas, como o registro de atividades físicas. Neste ano, serão 35 milhões de unidades, segundo a Euromonitor, empresa especializada em pesquisa de mercado. Isso significa que os smartwatches vão responder por 15% de todo o faturamento mundial com a venda de relógios. O baque para as fabricantes tradicionais é imenso. Em 2016, a venda de relógios suíços em todo o mundo foi a mais baixa desde 2009, o ano seguinte ao da crise financeira global. A americana Fossil, o terceiro maior grupo do setor, perdeu um terço da receita em dois anos.

O apelo dos relógios inteligentes é maior entre os mais jovens, que estão habituados com aparelhos que desempenham múltiplas funções. Um em cada cinco fabricantes suíços considera o smartwatch uma ameaça ao seu negócio. Mas analistas dizem que não se pode atribuir a crise do relógio de pulso tradicional só ao novo concorrente. Há um fator comportamental: com a popularização dos celulares, hoje ninguém depende mais de relógios para ver as horas. Além disso, há razões que afetam particularmente os modelos mais caros. “Não existe competição dos smartwatches com os relógios mecânicos de luxo”, diz Jorge Martin, chefe de pesquisas da Euromonitor. Ele explica que mercados relevantes como a China e Hong Kong foram afetados pela desaceleração da economia e — esta é impagável — por medidas de combate à corrupção, pois relógios são um dos presentes preferidos por quem deseja corromper. No Brasil, cuja relevância para o mercado mundial é pequena, a crise tem sido ainda maior, mas não por causa da Lava-Jato. É economia mesmo: a recessão derrubou as vendas de relógios tradicionais em 40% desde 2012.

FIM DE UMA ERA  - Britânicos e turistas registram os últimos momentos do Big Ben antes do começo da reforma
FIM DE UMA ERA  – Britânicos e turistas registram os últimos momentos do Big Ben antes do começo da reforma (RICHARD BAKER/Getty Images)

A Suíça domina a indústria de relógios desde a II Guerra Mundial: o país declarou neutralidade no conflito e as vendas não foram afetadas, em oposição ao que ocorreu com empresas inglesas e americanas. Mas sua ligação com o produto é mais antiga. A criação do relógio de pulso, em 1868, é atribuída ao polonês Antoni Patek e ao francês Adrien Philippe, que dão nome a uma das marcas de luxo mais conhecidas do mundo, a Patek Philippe. Na época, os modelos suíços não eram sinônimo de alta qualidade. Isso só começou a mudar no início do século XX, graças a investimentos na melhoria do produto.

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Diante do cenário desafiador, as marcas tradicionais decidiram redobrar a aposta em uma estratégia já conhecida: tratar o relógio como peça de status e beleza. Assim como as joias, ele seria um artigo para ser passado entre gerações. A estratégia é eficaz para atender um público cativo, colecionador de exemplares raros. A Sotheby’s, a mais famosa casa de leilões de arte do mundo, vende o equivalente a 130 milhões de dólares por ano em modelos antigos, a maioria deles das marcas Rolex, Patek Philippe e Audemars Piguet. As empresas também recorrem a novas formas de atingir o público jovem, como a interação em redes sociais. As grifes mais renomadas estão cada vez mais ativas em seus perfis e postam fotos e vídeos regularmente. A Rolex tem 5 milhões de seguidores no Instagram. Outro recurso é o patrocínio de esportistas populares, como o tenista Roger Federer e o atacante Cristiano Ronaldo. E as celebridades do cinema, é claro. Desde os tempos de Sean Connery até o atual Daniel Craig, Bond, James Bond sempre se notabilizou por seus relógios. Há uma incessante busca de adaptação às mudanças de comportamento, mas será difícil reverter tendência tão forte. Na próxima vez que o sino do Big Ben tocar, em 2021, ele possivelmente tocará pelos smartwatches. E Bond ostentará um deles no pulso.

Publicado em VEJA de 30 de agosto de 2017, edição nº 2545

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