Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Por entre as frestas

Um adolescente que vislumbra outro mundo mas não sabe como chegar a ele é o fio condutor de 'Ciganos da Ciambra',fusão neorrealista de documento e ficção

Por Isabela Boscov Atualizado em 4 Maio 2018, 06h00 - Publicado em 4 Maio 2018, 06h00

Radiante, Pio (Pio Amato) bebe da alegria dos refugiados africanos aos quais entregou um televisor roubado, e que cantam seu nome em coro. O garoto vai levar o dinheiro da transação para sua mãe, o que já o enche de orgulho; essa aprovação calorosa é um bônus — algo raro na vida desse menino da parte mais esquálida da cidade de Gioia Tauro, no sul da Itália. Pio vive sequioso de se provar e fazer a travessia para a vida adulta. Mas é um náufrago de uma evanescente cultura roma (ou cigana), cuja tradição e sentido se esgarçaram até dela sobrarem quase que só a marginalidade e o sentimento de clã. “Na estrada, éramos livres”, lamenta o patriarca dos numerosos Amato — que, em Ciganos da Ciambra (A Ciambra, Itália/Brasil/Estados Unidos, 2017), já em cartaz no país, vivem versões ficcionais de si mesmos. De livre, Pio não tem nada: está preso à pobreza, à ignorância (aos 14 anos, é analfabeto) e ao tribalismo dos códigos que o regem. Já percebeu que existe um mundo além deles, no entanto não faz ideia de como alcançá-lo. Seu único amigo verdadeiro, Ayiva (Koudous Seihon), um imigrante de Burkina Faso, tenta abrir uma ou outra fresta que lhe permita espiar novas possibilidades. Mas é alguém de fora, e será vencido pela lealdade de Pio à família.

Em seu segundo longa (produzido por, entre outros, Martin Scorsese e pelo brasileiro Rodrigo Teixeira), o diretor ítalo-americano Jonas Carpignano pinça o personagem secundário Pio de seu trabalho de estreia, Mediterranea, para torná-lo agora protagonista. Filmando com tessitura documental e extraordinária riqueza de detalhe, mas em registro de saga, Carpignano agride os sentidos do espectador com as vozes discordantes dos Amato, os monturos de lixo, as crianças — até as muito pequenas — fumando cigarros e trocando xingamentos. À medida que adentra o mundo de Pio, o diretor faz com que o choque dê lugar à empatia, depois à afeição, e então a uma profunda tristeza pela maneira como os desejos do protagonista se desfazem nessa existência atordoante. Pio Amato é um estupendo ator espontâneo; Carpignano poderia fazer toda uma carreira de acompanhá-lo vida afora.

Publicado em VEJA de 9 de maio de 2018, edição nº 2581

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.