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Pois é, retrocedemos…

Pobre universidade brasileira: além de ver reduzida sua presença no ranking global do ensino superior, registra a 1ª perda de alunos em mais de duas décadas

Por Luisa Bustamante Atualizado em 8 set 2017, 06h00 - Publicado em 8 set 2017, 06h00

As universidades brasileiras estão no pelotão de trás, revela um novo ranking mundial divulgado na ter­ça-feira 5. Na tradicional lista da revista inglesa Times Higher Education, despontam no topo, como sempre, instituições britânicas, Oxford e Cambridge, e americanas, Stanford, MIT e Harvard. A Universidade de São Paulo (USP) situa-se numa faixa não numerada que abrange o grupo entre as posições 251 e 300. A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que já chegou a superar a USP, está na turma que oscila entre a 401 e a 500. No geral, o Brasil, que havia emplacado 27 entre as 1 000 melhores do mundo, agora tem só 21. Sim, voltamos atrás, mas não só aí: o número de jovens matriculados no ensino superior também encolheu pela primeira vez em 25 anos. A constatação, extraída do mais recente Censo do Ensino Superior do Ministério da Educação, aponta uma queda, entre 2015 e 2016, de 16 500 matriculados nas salas de aula das faculdades privadas, que abrigam 75% dos universitários brasileiros. “Nesse ritmo, em dez anos o número estará no mesmo nível de duas décadas atrás”, diz o sociólogo Carlos Monteiro.

(Arte/VEJA)

O que impediu o número total de matrículas de cair ainda mais, abaixo da casa dos 8 milhões, foi o ensino a distância, modalidade mais barata que vem se expandindo em alta velocidade. Nas instituições públicas, ficou tudo igual. A média baixou, portanto, no conjunto das particulares. A crise econômica, que ceifou empregos e deixou os que têm trabalho com medo da demissão, tem espantado muitos aspirantes à universidade. Também a taxa de evasão dos que já estão lá dentro saltou 44% em cinco anos, a maioria por não conseguir arcar com as mensalidades. “O sonho do diploma está sendo postergado”, diz Monteiro.

O marasmo de hoje contrasta com a euforia que se instaurou no ensino superior a partir dos anos 2000, período em que se abriam faculdades privadas a cada dia, impulsionadas pela flexibilização do novo marco regulatório para o setor. Em paralelo, subia o poder aquisitivo da classe C, que podia então ingressar em terreno acadêmico, onde nunca pisara antes. Além da crise, as recentes limitações de acesso ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) — uma iniciativa necessária, aliás, de financiar quem merece e não tem dinheiro — fizeram reduzir ainda mais o apelo das faculdades particulares.

A diminuição das matrículas vai na exata contramão da tarefa de casa que o Brasil deveria fazer com afinco: acelerar o passo para se aproximar das nações mais desenvolvidas. Atualmente, apenas 16% dos brasileiros de 25 a 34 anos têm um canudo de ensino superior. Só ganhamos dos sul-africa­nos, que patinam em 14%. A média da OCDE (organização que reúne os países mais ricos) é de 40%, patamar em que se encontram Inglaterra, Estados Unidos e Finlândia. É curioso ver a Coreia do Sul disparada na frente, com 68% dos jovens diplomados — tendo criado sua primeira universidade em 1895, quase um século depois do Brasil e três depois dos Estados Unidos. Uma das razões é a obsessão sul-coreana por educação desde o jardim de infância. A outra é a maneira sistemática como o país foi aumentando e aprimorando o ensino em todos os níveis, de forma organizada e uniforme. “O Brasil deu um salto de quantidade sem resolver a qualidade”, diz o economista Claudio de Moura Castro, articulista de VEJA.

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Muitas questões mantêm as universidades brasileiras distantes das primeiras colocações nos rankings internacionais. As joias do ensino público, seja estadual, seja federal, estão engessadas por um modelo de gestão antiquado e inflexível, altamente dependente dos governos. Algumas se encontram em estado de penúria por isso. Também lhes falta uma maior exposição à academia mundial. “Os resultados do Brasil refletem a crescente pressão que as universidades do país sofrem devido à crise econômica e à concorrência global no setor. Os brasileiros precisam libertar suas instituições da burocracia desnecessária, se quiserem ficar entre os melhores”, afirma Phil Baty, diretor de rankings globais da Times Higher Education. Um atraso ideológico pesa contra o sistema brasileiro como um todo. “O ensino superior aqui é excessivamente teórico, academicista, e isso desestimula uma leva de alunos que se identifica com um aprendizado mais prático e voltado para o mercado, como o que existe em outros países”, observa Moura Castro. O que isso tem a ver com PIB, produtividade e renda? A resposta é: tudo. Um brasileiro formado recebe mais que o dobro de um sem diploma. O Brasil não pode abrir mão dessa vantagem.

Um dos medidores mais certeiros sobre a capacidade de um país avançar no conhecimento e produzir riqueza se baseia na qualidade de suas instituições de ensino superior e na quantidade de jovens ali matriculados. É da concentração de cérebros bem preparados que brotam os prêmios Nobel, as descobertas que alçam a ciência a um patamar elevado e as tão valiosas patentes — tudo isso ainda escasso no Brasil. Visto sob os dois prismas, o da quantidade e o da qualidade acadêmica, o país vai mal na comparação global. E o pior: não só não progride como, nos últimos tempos, vem retrocedendo a ponto de disparar um alerta. Se a paralisia atual não for vencida, as estatísticas continuarão a pôr o Brasil onde sempre esteve, atolado na incômoda zona da mediocridade e em franca desvantagem na competição internacional.

Publicado em VEJA de 13 de setembro de 2017, edição nº 2547

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