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O portão se abriu

A USP é a última grande universidade a adotar modelo de cotas que reserva até metade de suas vagas para alunos da rede pública, negros e índios

Por Roberta Vassallo e Mariana Barros
Atualizado em 8 jul 2017, 06h00 - Publicado em 8 jul 2017, 06h00

As portas do vestibular da Universidade de São Paulo (USP) estarão mais largas neste ano. Na semana passada, a USP se tornou a última universidade pública do país a aderir ao sistema de cotas raciais. A pioneira foi a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que iniciou o experimento ainda em 2003. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal determinou por unanimidade a constitucionalidade das cotas, “essenciais para a correção do histórico de desigualdade no Brasil”, segundo o tribunal. No mesmo ano, o Congresso aprovou a Lei de Cotas, que estabeleceu a reserva de metade das vagas em universidades federais para alunos de escolas públicas. Nesse porcentual foram incluídos também critérios para contemplar grupos raciais e étnicos, condicionados ao tamanho destes em cada estado, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na USP, a meta é ter 50% de alunos egressos da rede pública, incluindo negros, pardos e índios, até 2021.

No Estado de São Paulo, a Unesp e a Unicamp, mesmo sendo estaduais, já haviam anunciado a implantação da política de cotas prevista na lei federal. A Unesp, em 2013, e a Unicamp, em maio deste ano. Só a USP permanecia de fora. Na semana passada, o conselho da universidade decidiu adotar o modelo e definiu um calendário gradual para a inclusão dos alunos. A medida visa a evitar que o peso financeiro da mudança inviabilize o orçamento da universidade. A USP enfrenta uma grave crise financeira desde 2014. Em 2016, fechou suas contas com 660 milhões de reais no vermelho. A adoção da política de cotas neste momento implicará gastos ainda maiores, sem que haja aumento de receita. O fato de que se trata de uma medida gradual, a ser concluída só em 2021, deve mitigar parcialmente o baque. Quase 10% dos 90 000 estudantes da USP precisam de auxílio-­moradia. As refeições nos câmpus são subsidiadas.

O objetivo para 2018 é fazer com que a média atual da USP de 37% de estudantes egressos de escolas públicas seja replicada em todas as faculdades, inclusive na de medicina. A expectativa é que em 2021, quando o modelo terá se consolidado, metade dos alunos se encaixe nesse perfil. “A USP não pode ser um ambiente segregado como é hoje, precisa refletir a sociedade”, afirma o reitor Marco Antonio Zago (leia a entrevista ao lado). Para Zago, o novo modelo não implicará piora no desempenho geral dos alunos — a crítica recorrente dos que são contrários às cotas —, já que, segundo estudos da universidade, a origem dos estudantes não determina seu rendimento em sala de aula. Um desses estudos analisou a performance dos alunos que entraram na USP por meio do Enem. No primeiro semestre de 2016, eles tiveram as maiores médias de notas em cursos como engenharia de materiais, engenharia química, ciências econômicas, história, física, química e ciências biomédicas. Considerados todos os cursos da USP, a diferença máxima entre as médias de notas dos ingressantes via Enem e as dos demais não superou dois pontos. Tem sido assim desde o princípio. Em 2003, um estudo da Uerj mostrou que 49% dos cotistas foram aprovados em todas as disciplinas no primeiro semestre do ano, contra 47% dos estudantes que ingressaram pelo sistema regular.


“Surgirá um novo perfil de estudante”

A adoção da política de cotas é um dos últimos projetos concluídos por Marco Antonio Zago à frente da reitoria da USP. Seu mandato termina no fim de 2017. Em seu gabinete na Cidade Universitária, ele falou a VEJA.

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DIVERSIDADE – Zago: A USP deixará de ser um ambiente segregado (Lailson Santos/VEJA)

Por que a USP foi a última grande universidade a aprovar o sistema de cotas? Somos como um enorme transatlântico, impossível de virar de uma hora para a outra, mas que, depois que muda, pega a outra direção e vai embora. Após um processo de maturação interno, ficou claro que havia uma con­vergência no conselho no sentido de adotar uma medida como essa, que já existia nas federais.

Quais as principais adequações para comportar os cotistas? Esses estudantes vão demandar muito mais apoio financeiro para permanecer em seus cursos, seja de assistência social, seja de moradia ou alimentação. Poderia dizer que essa é uma desvantagem das cotas, pois, ao mesmo tempo que os custos aumentam, a universidade está saindo de uma grave crise financeira. Por isso, é importante que a mudança se­ja gradual, como está previsto no plano que adotamos.

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Os cotistas serão mais suscetíveis a abandonar a universidade do que os demais alunos? São pessoas que, em geral, sempre enfrentarão mais dificuldades, pela própria condição de vida. Por outro lado, ao chegarem à USP, já lutaram muito para se manter, e por isso devem alcançar tanto sucesso quanto os demais. Em relação ao desempenho, estudos demonstram que a origem não determina o rendimento de nenhum aluno.

Quais serão as vantagens de adotar as cotas? A principal é criar um novo perfil de aluno. É muito bom que as pessoas que se formarão na USP estudem em um ambiente de diversidade social e étnica maior que a existente. Nós, hoje, for­mamos alunos em um ambiente so­cial muito segregado.

 

Publicado em VEJA de 12 de julho de 2017, edição nº 2538

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