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O passado: cada vez melhor

A mudança de paradigma sobre o regime militar é sinal de rebelião

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 1 jun 2018, 06h00 - Publicado em 1 jun 2018, 06h00

Nunca gostei de nenhum candidato, mas ele é diferente; o politicamente correto chegou a um ponto insuportável; ele fala as coisas como são; é pão, pão, queijo, queijo; vai endireitar o país; até que enfim alguém fala a verdade; por ele faço campanha de graça.

De quem essas pessoas estão falando? Algumas, de Jair Bolsonaro; outras, de Donald Trump. Estas aparecem no livro da única jornalista que previu a vitória de Trump desde o primeiro comício. Enquanto seus colegas escolhiam as fotos mais ameaçadoras do candidato e repetiam os conhecidos mantras sobre ele, Salena Zito ouvia e ouvia. Os colegas viam um candidato raivoso, Salena escutava o “fator entusiasmo”, a adesão espontânea, impossível de ser moldada por sabichões profissionais de campanha ou por influencers, uma das muitas palavras malditas dos tempos atuais.

Depois que Trump ganhou, uma frase dela ficou célebre. Referindo-se à flexibilidade do candidato em relação a números e fatos, anotou: “A imprensa leva o que ele fala ao pé da letra, mas não a sério; seus partidários o levam a sério, mas não ao pé da letra”. Salena Zito escreveu isso dois meses antes da eleição presidencial. Agora lançou um livro, The Great Revolt, tratando exatamente da rebelião popular que produziu a vitória de Trump.

De forma geral, a esquerda promete um futuro melhor e a direita, o retorno a um passado melhorado. Os dois impulsos podem produzir resultados que mudam o paradigma. O passado melhor não significa obrigatoriamente saudosismo, mas uma rebelião de sentimentos sufocados. O slogan “make America great again”, por exemplo, foi uma forma de celebrar a história dos Estados Unidos, de bater no peito e dizer “nós somos o máximo”, sem as desculpas nem as condenações presentes nos meios culturais e acadêmicos.

No Brasil, o paradigma chacoalhado que está fazendo muitos distraídos cair do 3º andar é sobre o regime militar. A época das trevas em que desaparecia gente que foi “militante” ou “atuou na guerrilha”, na descrição liofilizada da narrativa dominante, deu lugar a um tempo tranquilo e ordeiro, em que a bandeira nacional era hasteada nas escolas, os políticos tinham medo dos militares e não havia bandidos. É claro que os dois extremos são absurdamente reducionistas. Mas a história, claro, é o que as pessoas acham que aconteceu.

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Uma das maiores tentações para habitantes do planeta dos explicadores é exagerar no paralelismo. A greve dos caminhoneiros provocou um surto de falsas comparações. A diferença mais importante: a greve de 1973 no Chile foi contra o governo esquerdista e estatizante de Salvador Allende. No Brasil, os paralelos entrariam no ramo da comédia à italiana, como aquela em que Alberto Sordi, no papel do subtenente Innocenzi, liga para seu coronel na manhã de 8 de setembro de 1943 , sem saber que o marechal Badoglio havia assinado o armistício com os Estados Unidos. “Aconteceu uma coisa incrível. Os alemães se aliaram aos americanos”, diz ele, espantado, debaixo do fogo de blindados alemães. O que diria um nada inocente operador político brasileiro? “Presidente, é incrível, a direita se aliou à esquerda contra nós.”

O que a descabelada pitonisa Salena Zito, ridicularizada pelos colegas de inúmeras maneiras, inclusive como “a hipster do populismo”, concluiria sobre um país assim?

Publicado em VEJA de 6 de junho de 2018, edição nº 2585

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