O nó dos novatos
O “novo” era para ser a estrela das eleições, mas os presidenciáveis cogitados para encarnar esse papel ainda não conseguiram decolar nas pesquisas
Diante dos escândalos de corrupção suprapartidários e da altíssima rejeição ao Congresso e ao governo, pareciam favas contadas: os nomes de fora da política tradicional despontariam como favoritos na campanha deste ano. Além dos analistas, os próprios líderes dos principais partidos partilhavam dessa impressão, tanto que, para desidratá-la, passaram a manifestar preocupação com a vitória de um “aventureiro” ou um “salvador da pátria” na corrida presidencial. Nos discursos, o “novo” aparecia como ameaça ao “velho” e incomodava até Lula, o líder nas pesquisas agora convertido em ficha-suja. A oito meses da eleição, porém, são só dois os pré-candidatos novatos — e ambos têm 1% de intenção de voto. Outros dois nomes reúnem porcentuais superiores, mas nada que, até aqui, supere os rivais da política tradicional.
Ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa tem conversado com diferentes partidos desde o ano passado. As negociações avançaram depois que uma pesquisa fez duas constatações favoráveis: Barbosa é o nome com o maior potencial de crescimento, e a qualidade que o eleitor mais valoriza num candidato é a intolerância à corrupção. A combinação dos dois indicadores animou Barbosa, que se tornou ícone do processo do mensalão ao sentenciar à cadeia a antiga cúpula do PT. Com 5% na rodada mais recente do Instituto Datafolha, o ex-ministro negocia para ser o candidato do PSB. Depois da segunda condenação de Lula, conversou com o marqueteiro Diego Brandy, que trabalhou na campanha presidencial do PSB em 2014, e com o advogado Acilino Ribeiro, que assumirá a secretaria de movimentos populares do partido. Desde janeiro, já se reuniu com dirigentes e deputados do PSB.
“Temos outros candidatos, mas, no quesito eleitoral, não há dúvida de que o ministro é o mais forte”, admite Acilino Ribeiro. “Joaquim Barbosa tem uma grande capacidade de captação de apoio nos setores mais populares e despolitizados.” Barbosa não descarta uma aliança com o próprio PT e só manifesta restrições a composições com PSDB, MDB e DEM. Ele, no entanto, não corre sozinho. O PSB já tem dois pré-candidatos a presidente, o ex-ministro Aldo Rebelo e o ex-deputado federal Beto Albuquerque, ambos da “velha política”. Barbosa teme perder a disputa interna para eles e, caso vença, ser abandonado pelos correligionários durante a campanha. Sua preocupação é pertinente. “Na política, temos de fazer mais do que apenas investigar, julgar e dar sentenças. Temos de construir consenso, dialogar e compreender essa dinâmica. Se o Joaquim Barbosa se filiar, será muito bem-vindo. Daí a ser candidato é outra discussão”, diz Albuquerque. Quem quiser disputar a Presidência tem até 7 de abril para se filiar a algum partido.
O apresentador Luciano Huck é o novato mais bem cotado nas pesquisas, embora seus 6% o deixem tecnicamente empatado com outro representante da “velha política”, o governador Geraldo Alckmin (PSDB). Huck já declarou que não disputará a eleição, mas não conseguiu convencer todo mundo. Pediu que seu nome continuasse sendo testado nas pesquisas e, na semana passada, recebeu um senhor empurrão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que incentivou publicamente sua candidatura. “É bom ter gente como o Luciano porque precisa arejar, botar em perigo a política tradicional, mesmo que seja do meu partido”, disse FHC em entrevista à rádio Jovem Pan. Não é uma manifestação isolada. Com Alckmin empacado nas pesquisas, cresce entre os políticos do centro a vontade de lançar Huck. Mas o apresentador tem dois dilemas à frente. Primeiro, para concorrer, terá de deixar a Globo e seus patrocinadores, mudando radicalmente de vida. Segundo, precisará montar uma coligação competitiva, o que requer sangue, suor e sorte. Nada garante que o PSDB, presidido por Alckmin, cerraria fileiras com Huck. O PPS está de portas abertas para o apresentador. Diz o presidente do partido, deputado Roberto Freire: “O que nos resta é representar a perspectiva do novo. O Huck é forte nos grotões”.
Até agora, a bandeira do “novo” é empunhada por João Amoêdo, do Partido Novo, e pelo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, do PSC, mas ambos patinam miseravelmente nas pesquisas. Amoêdo prega a cartilha liberal e quer abocanhar eleitores desencantados com o PSDB e avessos ao radicalismo direitista de Jair Bolsonaro, o vice-líder nas sondagens. Os desafios de Rabello de Castro são ainda mais espinhosos. Ele foi alvo de um mandado de busca e apreensão no âmbito da investigação que apura desvios no Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios. Motivo: uma empresa dele, segundo os investigadores, avalizou um negócio que resultou em prejuízo de 109 milhões de reais ao Postalis. Rabello de Castro nega qualquer irregularidade.
Para Mauro Paulino, o diretor-geral do Datafolha, representar o “novo” pode ajudar um candidato, mas não se constituirá em fator decisivo. “O eleito será aquele que conseguir transmitir soluções para as principais aflições dos brasileiros, como segurança pública, saúde e estabilidade econômica. Será também aquele que melhor fizer frente ao ambiente de rejeição aos políticos em geral, cujo pano de fundo é a corrupção.”
Publicado em VEJA de 14 de fevereiro de 2018, edição nº 2569