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O maior enigma da física

Em sua nova obra, o físico best-seller Carlo Rovelli se debruça sobre a questão que vem intrigando pensadores há milênios: a natureza do tempo

Por Filipe Vilicic Atualizado em 27 abr 2018, 06h00 - Publicado em 27 abr 2018, 06h00
(Arte/VEJA)

No século VI a.C., o filósofo grego Anaximandro especulava: “As coisas se transformam umas nas outras segundo a necessidade e reconhecem o valor uma das outras segundo a ordem do tempo”. Essa é a constatação mais antiga de um pensador sobre qual elemento explicaria o fluxo do mundo — a saber, o tempo. Como ensina o físico quântico italiano Carlo Rovelli em seu novo livro, o impacto dessa ideia foi duradouro: “A astronomia e a física se desenvolveram seguindo a sugestão de Anaximandro: compreender como os fenômenos acontecem segundo a ordem do tempo”. Ao nomear seu tratado sobre o tema de A Ordem do Tempo, Rovelli faz referência óbvia ao postulado com mais de dois milênios de idade. Pensadores da Antiguidade explicavam os movimentos de estrelas e planetas de acordo com ciclos temporais. Equações só ganham sentido ao se considerar como as coisas mudam com o passar do tempo. Ocorre que Rovelli também contesta a concepção ancestral que vai, não sem ironia, embutida no título de seu livro. O tempo, afinal, é o maior enigma da física, e, quanto mais a ciência evolui, menos certezas há sobre sua natureza — e até existência.

Aos olhos da física, nossas noções mais intuitivas de tempo — o passar dos minutos que compõem uma hora, ou das horas que fazem o dia, ou mesmo o movimento do Sol no céu — são duvidosas. “O que chamamos de tempo não funciona como uma característica real do universo”, afirmou Rovelli em entrevista a VEJA.

O autor toma o leitor pela mão num passeio pela busca de respostas, ao longo dos séculos, para essa questão essencial. De gênios da ciência como Newton, que falava em duas formas de tempo, e Einstein, para quem o espaço-tempo resultaria de deformações do campo gravitacional que permeia o cosmo, chega-se até o estágio atual dos estudos da física, cuja vertente mais vanguardista simplesmente conclui: o tempo não existe — pelo menos não como o imaginamos. O tempo, na compreensão mais avançada da física contemporânea, é térmico. Em vez de medida cronológica, teorizam hoje os cientistas, ele é uma variável que resultou do aumento da entropia do universo no decorrer de seus 13,8 bilhões de anos.

O texto de Rovelli é, recorrendo a um adjetivo caro aos físicos, elegante. Ele explica teorias quânticas deliciosamente intricadas sem, porém, simplificá-las em demasia, como fez em sua obra de maior sucesso comercial, Sete Breves Lições da Física, lançada no país em 2014. No novo livro, Rovelli não se abstém de detalhar minuciosamente o significado de fórmulas que culminam no entendimento atual sobre o tempo. E mostra-se hábil ao relacionar as complexas teses da física moderna à procura pelo entendimento de questões filosóficas que incomodam o homem desde que aprendeu a pensar. Refletir sobre o tempo é conjecturar a respeito do motivo de estarmos vivos, envelhecermos e morrermos. No último capítulo, o físico de 61 anos arrisca uma nota lírica, ao afirmar que a morte seria “uma irmã gentil que logo virá fechar meus olhos e acariciar-me”.

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Rovelli convida a desconfiar dos ponteiros do relógio: a percepção que temos de que as coisas são mutáveis, indo do passado para o presente e rumo ao futuro, é ilusória. O tempo não seria essa linha reta e perfeita, mas antes algo como uma ampulheta que flutua em torno de cada um de nós, e que muda de figura conforme os pontos de vista individuais. Essa imagem pode ser difícil de digerir, mas Rovelli lembra de outras grandes certezas há muito superadas: “Assim como um dia tivemos de combater percepções rasteiras para compreender que a Terra não é plana, precisamos começar a observar tudo o que acontece como uma sequência de eventos relativos”.

‘A Ordem do  Tempo’, de Carlo Rovelli (tradução de Silvana Cobucci; Objetiva; 192 páginas; 34,90 reais ou 23,90 reais na versão digital) (//Divulgação)

Publicado em VEJA de 2 de maio de 2018, edição nº 2580

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