O avanço dos fascistas
Na Itália, berço do fascismo de Benito Mussolini, partidos com discurso racista podem ganhar poder com ajuda do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi

Desde que Benito Mussolini foi fuzilado e seu corpo pendurado de cabeça para baixo ao lado do de sua amante em uma praça de Milão em 1945, o fascismo nunca arredou pé da bota da península italiana. Em 2018, a ideologia totalitária que Il Duce, como era chamado, criou terá um momento glorioso. Dois partidos de toada nacionalista e racista devem ganhar espaço no próximo governo com a provável vitória da coalizão de direita do ex-premiê Silvio Berlusconi. Apesar de ter completado 81 anos e estar inelegível até 2019 por uma condenação de fraude fiscal, Berlusconi orquestrou uma aliança com os partidos radicais Liga Norte e Irmãos da Itália. Segundo as pesquisas de opinião, eles poderão ter 38% dos votos nas eleições de 4 de março, 12 pontos porcentuais à frente do provável segundo colocado, o Movimento Cinco Estrelas, do comediante Beppe Grillo. A investida política ainda vem acompanhada de agitação social. Grupos fascistas estão recrutando novos membros em ritmo acelerado e realizando um número recorde de ataques a imigrantes. Desde 2014, eles fizeram 142 investidas violentas contra minorias.
Em 3 de fevereiro, o segurança de boate desempregado Luca Traini, de 28 anos, saiu com um carro Alfa Romeo atirando em todos os negros que apareceram à sua frente durante duas horas na cidade de Macerata, na região central da Itália. Cinco homens e uma mulher ficaram feridos. Envolto em uma bandeira da Itália, ele fez a saudação fascista com a mão e gritou “Viva a Itália!” ao ser detido pelos policiais. Grupos fascistas, como o Forza Nuova, ofereceram-se para pagar os custos advocatícios de Traini. O criminoso, que tinha distúrbios mentais, era um dos apoiadores do partido Liga Norte, nacionalista e xenófobo. O presidente da agrupação, Matteo Salvini, disse no início de 2017 que a Itália precisa de uma limpeza de massa, rua por rua, vizinhança por vizinhança, expulsando os imigrantes. Como seu partido, que tem 14% da preferência do eleitorado, está na coalizão de direita e Berlusconi não pode assumir cargos, Salvini nutre esperanças de se tornar o próximo primeiro-ministro. Giorgia Meloni, do partido Irmãos da Itália, também ambiciona o cargo de premiê.

Entre os quatro grupos mais conhecidos da direita radical, dois são claramente fascistas: o CasaPound e o Forza Nuova. Eles combinam os sentimentos xenófobos com um programa que pede intervencionismo estatal na economia. Os dois partidos que integram a coalizão de Berlusconi, contudo, são liberais em economia e defendem a iniciativa privada. “O totalitarismo não poderia acontecer em uma economia privatizada”, diz o historiador italiano Matteo Albanese, professor da Universidade de Lisboa. Deixando de lado as diferenças em economia, o CasaPound e o Forza Nuova também apoiam Berlusconi, que vem fazendo críticas à imigração. O ex-premiê já declarou que o fenômeno é uma bomba-relógio social e falou em deportar 600 000 imigrantes ilegais caso sua coalizão volte ao governo.
Diferentemente da Alemanha, que depois da II Guerra eliminou todos os símbolos nazistas e criou leis que proíbem o incitamento ao ódio, as saudações nazistas e a negação do Holocausto, a lei italiana barra apenas a tentativa de ressuscitar o Partido Nacional Fascista ou o discurso de ódio. Os partidos fascistas driblam a legislação dizendo-se democráticos e usando símbolos dos anos 1960, como a cruz céltica, com um círculo em volta. O lema “Itália para os italianos” lembra os chavões do presidente americano Donald Trump e não parece abertamente racista. Na prática, tais legendas atacam os centros de acolhimento de imigrantes e as ONGs que resgatam estrangeiros no Mar Mediterrâneo. Diz Albanese: “Esses grupos deslocaram o debate eleitoral para a questão da imigração e ameaçam arrastar os demais partidos com eles”.
Publicado em VEJA de 28 de fevereiro de 2018, edição nº 2571
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