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Na estrada, rumo a Marte

Lançamento do mais potente foguete da atualidade, levando um carro para o espaço, pode abrir nova era de viagens cósmicas — ou, ao menos, intercontinentais

Por André Lopes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 20h27 - Publicado em 9 fev 2018, 06h00

Parecia um show de marketing — e era mesmo. Não por acaso, foi planejado nos mínimos detalhes. E nada saiu fora do script no lançamento, na terça-feira 6, do Falcon Heavy, o mais potente foguete da atualidade, fabricado pela SpaceX, empresa do bilionário empreendedor sul-africano Elon Musk. Para começar, um cenário icônico: a mesma plataforma de Cabo Canaveral, na Flórida, de onde partiu o Saturn V, que levou o homem à Lua, em 1969. Com 70 metros de altura e 27 motores — que, juntos, têm a força de propulsão de dezoito aviões 747 —, a nave, capaz de transportar 64 toneladas, dividia as atenções com o que carrega dentro de si: um carro elétrico da Tesla, outra companhia de Musk, tinindo de vermelho. Sentado no banco do motorista, trajando roupas espaciais, postava-se um manequim, batizado de Starman — para combinar com a trilha sonora do espetáculo, Space Oddity e Life on Mars?, de David Bowie (1947-2016).

Quando os relógios marcavam precisamente 15h45, no horário da Flórida, o Falcon Heavy zarpou com sua inusitada carga, que foi lagarda no espaço para que tomasse o rumo da órbita de Marte, transformando-se no primeiro automóvel cósmico da história. A viagem até a órbita de Marte deverá durar seis meses; depois disso, o bólido seguirá vagando pelo espaço até ser engolido pelo Sol. “É meio bobo e divertido, mas as coisas bobas e divertidas podem ser importantes”, disse Musk após o feito.

Que é bobo e divertido não há dúvida — está longe de ser uma coincidência que o evento tenha sido acompanhado pela internet por milhões de pessoas, o que acabou derrubando o site da SpaceX. Mas por que seria “importante”? Antes de tudo, foi a primeira vez que um projeto dessa envergadura não teve no comando a Nasa, a lendária agência espacial americana, e, portanto, dinheiro público — a SpaceX é uma empresa privada. Há, contudo, algo bem mais extraordinário a considerar em relação ao que aconteceu aos olhos espantados da humanidade: aquele pode ter sido, de fato, o primeiro capítulo da realização do sonho de, no futuro, levar pessoas, até mesmo turistas, a fazer viagens intergalácticas — e a preços razoáveis. O principal trunfo em favor dos planos da SpaceX é seu custo por lançamento: o Falcon Heavy é de cinco a dez vezes mais barato que o próximo projeto da Nasa (o SLS, um foguete similar ao Saturn V). Em números: enquanto o lançamento da nave de Musk pode rondar os 90 milhões de dólares, o foguetão da agência espacial bate a casa do 1 bilhão de dólares.

Como o empreendedor sul-africano pode conseguir tal milagre? O pulo do gato: reciclagem. Nos lançamentos espaciais tradicionais, boa parte do material utilizado é descartada. Já nos foguetes de Musk os propulsores são reaproveitáveis — vão ao espaço e retornam, pousando em menos de dez minutos, e podem ser usados outra vez, em uma nova missão. Com essa tecnologia, já dá para pensar — deixando os pés bem na terra, na Terra — em substituir aviões por foguetes em viagens intercontinentais. O percurso entre Londres e Nova York levaria 29 minutos, em vez das oito horas atuais. Voando acima de 28 000 quilômetros por hora, qualquer trajeto de um ponto a outro do planeta seria feito em menos de uma hora.

Neste momento, porém, Musk ainda está abastecendo o caixa para poder aumentar sua lista de façanhas. A Força Aérea dos EUA já garantiu que quer os seus serviços para lançamentos de satélites secretos e pode aumentar a encomenda até que a montagem dos novos foguetes da SpaceX se inicie. O próximo passo do magnata é a criação de uma nova geração de propulsores, a Big Falcon Rocket, que pode ser lançada, se tudo correr bem, em 2020.

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É verdade que a empresa do sul­-africano está na frente dessa, digamos, corrida espacial. Contudo, como se trata de um negócio de bilhões de dólares, a concorrência já está em seu encalço. A gigante europeia Airbus tem no gatilho o projeto Adeline. O nome é uma sigla em inglês para Advanced Expendable Launcher with Innovative Engine Economy, algo como Propulsor Descartável Avançado com Economia Inovadora de Motor. Trocando em miúdos: ao contrário da SpaceX, a ideia é reaproveitar apenas o motor. Para fazer isso, a Airbus colocou o lançador dentro de uma espécie de avião com asas e rodas. Após ser descartada, a estrutura é capaz de aterrissar como um drone em qualquer aeroporto, trazendo de volta o motor para uma futura reutilização. Também na disputa está Jeff Bezos, fundador da Amazon — o homem mais rico do mundo. Ele prometeu que lançará com sua empresa de exploração espacial, a Blue Origin, um foguete ainda maior que o Falcon Heavy; isso, já em 2020. O objetivo: levar gente rica para dar uma volta no espaço.

Musk reconhece que tem de voar, e que, às vezes, não consegue cumprir a agenda que se autoimpõe. Ainda assim se arrisca anunciando períodos curtos entre o lançamento de um foguete e outro. Nas contas dele, a primeira missão da SpaceX até Marte — sem seres humanos a bordo — deverá ocorrer em 2022. Como o Falcon Heavy estava previsto para 2016, é preciso considerar a possibilidade de atraso de, ao menos, alguns meses. Entretanto, o que seria esse tempo diante dos milhões de anos que vão transcorrer até que o veículo da Tesla seja tragado pelo Sol? “Adoro a ideia de um carro rodando sem destino pelo espaço e sendo descoberto por uma raça alienígena daqui a milhões de anos”, brincou Musk no Twitter. Essa foi a razão pela qual ele fez questão de gravar num dos processadores de computador do automóvel cósmico um recado: “Fabricado na Terra por humanos”. Vai que um alienígena lê o recado e entende… É meio bobo e divertido — mas pode ser importante.

Publicado em VEJA de 14 de fevereiro de 2018, edição nº 2569

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