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Tasso Jereissati: “Esperavam mais de nós”

Aplaudido pelo público, mas atacado por tucanos, o presidente da sigla afirma que o sistema político faliu e admite ter até vergonha de dizer que é senador

Apresentado por Atualizado em 25 ago 2017, 15h15 - Publicado em 25 ago 2017, 06h00

Governador do Ceará por três vezes, senador no segundo mandato e agora presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati admite que, como todo político dotado de ouvidos, já percebeu que fora das fronteiras de seus gabinetes a categoria não vem agradando faz tempo. Há dois meses, quando o presidente Michel Temer foi denunciado por corrupção, Jereissati defendeu o desembarque dos tucanos do governo — foi voto vencido. Duas semanas atrás, bancou um vídeo em que o PSDB admite ter aderido a práticas fisiológicas e “defendido o indefensável”. A autocrítica foi um sucesso de público (o filme teve mais de 1 milhão de visualizações nas redes sociais), mas deixou furiosos tucanos que consideraram o filmete um sincericídio não autorizado da parte de Jereissati. Não é coincidência que as reações mais violentas tenham vindo dos ministros que mais apreço têm demonstrado por seu cargo no governo de Temer. Aos colegas que cogitaram pedir sua renúncia, o senador avisou: vai fincar pé na interinidade, pois acha que o PSDB tem conserto e que ele pode ajudar a restaurar a confiança que tantos já perderam no partido. O tucano falou a VEJA em seu gabinete, no Senado Federal.

No hoje famoso vídeo em que o PSDB admite que errou, fala-se dos escândalos de corrupção que “abalaram a confiança do nosso povo”. O envolvimento dos principais tucanos na Lava Jato foi o que mais afetou a imagem do partido? Tudo afetou, a Lava Jato afetou. Mas o que quisemos mostrar no programa quando falamos do “presidencialismo de cooptação”, essa expressão que irritou tanta gente, foi que vivemos no Brasil um sistema político falido, que quebrou e precisa ser substituído. E faz parte desse presidencialismo de cooptação a disputa por cargos, por poder, por mais espaço na política — práticas que volta e meia acabam dando em corrupção. A nossa autocrítica foi de que acabamos agindo como se a política fosse assim mesmo. Ficamos de braços cruzados nesse cenário, às vezes até nos misturando com ele.

Não apenas se misturando como participando dele, segundo a L­­ava Jato. Afinal, Aécio Neves responde a cinco inquéritos no Supremo, José Serra responde a um e Geraldo Alckmin corre o risco de responder a inquérito no STJ. Tivemos problemas, sim, e esses problemas nos afetam seriamente. Agora, achamos que todos esses que têm problemas vão se defender, já estão se defendendo para provar a sua inocência. É o que a gente espera. Mas não posso negar que esses problemas nos afetaram seriamente. Isso é perceptível nas manifestações da população.

O que o senhor ouve das pessoas? Ouço uma indignação muito grande em relação à questão da Lava Jato e à falta de espírito público dos políticos, cada qual cuidando de si. Com tantos problemas na saúde, na educação, tantos desempregados, só cuidamos de nós, só pensamos em nós — é assim que somos vistos.

O senhor se refere aos tucanos ou aos políticos em geral? Existe essa má vontade para com os políticos em geral e com os tucanos em especial, porque as pessoas acreditavam mais no PSDB. O PSDB era um partido diferente. As pessoas esperavam mais de nós. E, quanto mais se espera, maior é a decepção quando a resposta vem diferente. E a decepção pode até virar ressentimento. Isso tudo está constatado. Infelizmente, chegamos ao nosso pior nível de aprovação. Mas vamos reconquistar essa confiança. Agora, sobre a classe política em geral, em qualquer roda de botequim, churrasco, fim de semana com a família, você vai ouvir a mesma coisa: que os políticos são horrorosos, que não prestam, que são todos iguais. E todos nós reconhecemos isso.

Reconhecem? Todos aqui (refere-se ao Congresso) comentam. Todos, sem exceção, sentem esse clima. Há 100% de acordo entre nós quando o assunto é esse. “Poxa, nossa imagem está péssima e tal.” Só que ninguém faz nada para corrigir. Não é possível que 80% da população nos rejeite e isso seja culpa da imprensa e dos procuradores — acho até que existem alguns exageros por parte do Ministério Público, mas isso não é o principal. Há alguma coisa errada conosco. Então, nós, no PSDB, quisemos dar uma parada e começar um processo de avaliação e rediscussão — como retomar os nossos princípios básicos, de postura, de ética, de honestidade, de responsabilidade fiscal, de respeito aos recursos públicos. Resolvemos pensar quando nós nos desviamos desses princípios e olhar para o futuro.

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O senhor acha possível fazer essa rediscussão ética estando num governo em que o presidente foi denunciado por corrupção e oito ministros são investigados pela mesma acusação? Olhe, eu não me preparei para ser presidente do partido, foi uma crise que gerou essa situação, e eu de repente tive de assumir. Essa discussão de ficar ou não no governo veio no contexto daquela ideia mais antiga de fazer uma autocrítica no partido, não veio solta. Eu e um grupo de deputados, senadores, lideranças achamos que era incompatível partir para uma grande discussão interna estando dentro desse governo — isso tiraria nossa liberdade de ter uma agenda própria. Nosso objetivo é fazer a agenda do partido. Quem está no governo quer fazer a agenda do governo, agenda que nem sempre, ou na maioria das vezes, é a mesma do partido. Então, as duas agendas iriam se chocar. A questão não era partir para a oposição, na linha do PT, gritar “fora, Temer” e votar contra as reformas. Pelo contrário: era sair para continuar aprovando todas aquelas reformas que até fazem parte do nosso programa e ficar livre para fazer a nossa agenda sem ser contaminado — e essa palavra vai me causar problemas de novo — pelo fato de ser governo. Defendi, como outros defenderam, que nós deveríamos sair do governo.

Mas o PSDB não quis entregar os ministérios que tem no governo. Essa ideia não prevaleceu. Temos grandes nomes lá, fazendo um belo trabalho para o governo Temer, e muita gente achou que não fazia sentido pedir a esses nomes que se retirassem. Prevaleceu a ideia de que esses ministros, dependendo do interesse deles e do próprio presidente, deveriam continuar. Foi isso que prevaleceu, e agora eu considero essa história uma página virada. E vamos seguir com a nossa agenda, de maneira independente.
É um desfecho insatisfatório, na sua opinião? Infelizmente, a gente nem sempre consegue fazer as coisas da forma que acha melhor, mas da forma que é possível. E hoje a situação que nós podemos ter é essa.

Voltando ao vídeo, ele suscitou reações positivas também, além das críticas de integrantes do seu partido? Muitas! Nunca recebemos tantas menções no Facebook nem tantos acessos no YouTube. O filme bateu todos os recordes de propaganda eleitoral. Conseguimos o sonho de qualquer partido, que é ter sua propaganda vista. Outra coisa ótima que aconteceu: muita gente que tinha abandonado o partido está voltando — basicamente todos os economistas, intelectuais, sociólogos que fizeram parte da fundação do partido pediram uma reunião comigo porque querem participar dessa discussão agora.

O senhor tem sido abordado na rua? Sim, até isso está acontecendo. E olhe que eu não apareço no vídeo. Talvez as pessoas me reconhecessem antes, mas não falavam comigo. Agora elas vêm, me dão parabéns: “Até que enfim alguém reconhece que errou”. Mas sinto que têm certa desconfiança: “Será que é para valer?”. Então, é uma responsabilidade muito grande a que temos agora. Tem de dar certo. Eu tenho de fazer com que as coisas aconteçam. E me anima muito contar com tanta gente boa, de qualidade, querendo participar do debate. Edmar Bacha, Gustavo Franco, Elena Landau, Pérsio Arida. Mas outra razão de eu estar tão disposto é ver a quantidade enorme de jovens dentro do partido com vontade de mudar e que podem representar isso tudo que a população está querendo. Não desconsidero nenhuma parte do partido, dispomos de grandes quadros, mas devemos reconhecer que temos uma geração que vem entendendo melhor o que a sociedade quer e o que nos distancia dela.

Disseram que a iniciativa do programa se deve ao seu desejo de se candidatar à Presidência da República em 2018. O senhor tem essa vontade? Nenhuma. Com toda a franqueza, olhando aqui nos seus olhos, eu digo: nenhuma. Não serei candidato nem à presidência do meu partido. Nós temos aqui uma agenda até dezembro, e estou convicto de que só posso levá-la adiante se não for candidato a nada — nem à presidência do meu partido, quanto mais à Presidência da República. Agora, a esse processo de interinidade até dezembro eu não renuncio. Primeiro, porque me foi dada essa incumbência. Depois, porque eu tenho certeza de que estou fazendo o melhor pelo meu partido. Não tenho a menor dúvida disso. Mas sou interino, e acidentes podem acontecer. Ninguém precisa me pressionar. Há um presidente efetivo (Aécio Neves), e ele pode tomar essa decisão com uma simples canetada.

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Doria ou Alckmin em 2018? São dois ótimos nomes que o nosso partido tem. Geraldo Alckmin é o governador de São Paulo e faz uma gestão de enorme sucesso. O João Doria teve uma eleição histórica na prefeitura da cidade ao ganhar no primeiro turno e num clima como esse. E há outros nomes que podem ser candidatos também. Mas, se não tivermos uma solução de consenso no partido — e eu, como presidente, não tenho nenhuma definição tomada —, iremos para uma prévia. E o calendário está mantido: será até dezembro.

Doria disse que não participará de prévias. É uma opção dele.

O senhor é político há mais de trinta anos. Tem orgulho disso? Vou dizer uma coisa sinceramente: hoje, nem tanto. Já tive momentos de muito orgulho. Até porque fui governador do meu estado, e ser governador é sempre uma honra. Noto que as pessoas tendem a separar o político que ocupa cargos no Executivo — o governador, o prefeito — dos “políticos de Brasília”. Claro que os segundos levam a pior. Percebo uma mudança em relação aos primeiros anos em que fui senador. Você chegava a qualquer ambiente e sentia que o mandato inspirava respeito, era um sinal de prestígio. Hoje não é assim. Em alguns lugares a que você chega — meus pares que me perdoem, mas acontece comigo também, e por isso eu relato —, você até evita dizer que é senador.

Mas o senhor consegue escapar de ser reconhecido? Sim. Outro dia, fui a um hospital em São Paulo visitar uma pessoa. Cheguei a uma sala em que estavam falando de políticos, descendo a lenha. Não me reconheceram e confesso que não falei nada, saí de fininho. Vejo muitas histórias como essa. O que acho impressionante é que a gente discute isso todo dia e, quando bota na televisão, o pessoal fica indignado.

 

Publicado em VEJA de 30 de agosto de 2017, edição nº 2545

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