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…E não era bolha

Sem apoio de partidos, dinheiro nem tempo de TV, Bolsonaro cresce nas pesquisas e demonstra ter musculatura para ser competitivo no segundo turno

Por Ana Clara Costa Atualizado em 30 jul 2020, 20h14 - Publicado em 27 jul 2018, 07h00
(Arte/VEJA)

Na primeira vez em que Jair Bolsonaro bateu nos 8% de intenções de voto, ombreando com veteranos como o tucano Geraldo Alckmin e o pedetista Ciro Gomes, a maioria dos analistas disse que sua candidatura à Presidência da República não passava de uma bolha que o vento se encarregaria de levar. Quando o ex-­capitão do Exército chegou aos dois dígitos, os mesmos analistas afirmaram que ele havia batido no teto e, daí em diante, a gravidade se encarregaria de colocá-lo em seu devido lugar. Na última semana, no entanto, Bolsonaro — que oficializou sua candidatura pelo PSL sem vice, sem coligação e sem dinheiro — mostrou que, contrariando vaticínios, desejos e esconjuros, continua de pé, e crescendo. A pesquisa realizada pela Ideia Big Data, encomendada por VEJA, revela que Bolsonaro está se consolidando como líder no primeiro turno — na hipótese eleitoral mais provável, em que o ex-presi­dente Lula não concorre — e é, nesse mesmo cenário, o candidato com mais chances de chegar ao segundo turno.

No último levantamento do instituto Datafolha, divulgado em junho, Bolsonaro tinha 17% dos votos. Agora, na pesquisa da Ideia Big Data, que adota os mesmos critérios do Datafolha, de tal modo que as pesquisas são tecnicamente comparáveis, Bolsonaro mantém os mesmos 17%, mas cresce na intenção de voto espontânea — em que o entrevistado revela em quem pretende votar sem que o entrevistador tenha lhe apresentado opção alguma. Nesse caso, Bolsonaro marca 14%, 2 pontos a mais do que na última pesquisa do Datafolha. É uma posição relevante quando se sabe que, entre os candidatos (exceção feita a Lula), nenhum alcança mais que 2% de intenção de voto espontânea no eleitorado. Nesse quesito do voto espontâneo, Bolsonaro rivaliza com Lula, que tem 17%, o que é um resultado e tanto. Afinal, Lula participa da corrida presidencial há três décadas, e Bolsonaro acabou de entrar.

A preferência pelo deputado, medida pelo voto espontâneo, exibe crescimento consistente desde o início do ano. Há um ano, ele contava com 8%, de acordo com o Datafolha. No mesmo período, Lula marcava 15%, mas caiu para 13% em abril, depois de ser preso. A volta do petista ao patamar de 17%, afirma Maurício Moura, diretor da Ideia Big Data, pode ser atribuída às recentes movimentações de membros do Judiciário em favor de sua soltura. “Qualquer evento que envolva mais ruidosamente o ex-presidente aciona a memória e a convicção de sua base eleitoral”, diz.

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O avanço de Bolsonaro também é notado em praticamente todos os cenários de segundo turno, à exceção daquele em que seu nome é confrontado com o de Lula — nesse caso, o petista ganharia com folga, por 37% a 30%. Até junho, o Datafolha mostrava que Bolsonaro perderia no confronto com todos os candidatos, menos Fernando Haddad, do PT paulista. A nova pesquisa da Ideia Big Data revela que ele melhorou seu desempenho. Agora, Bolsonaro empata, dentro da margem de erro de 2 pontos para cima ou para baixo, com todos os candidatos.

Aos que torcem para a realização da profecia de que a candidatura do ex-capitão do Exército vai murchar tão logo comece o horário eleitoral na TV (malsucedido nas coligações, ele tem ínfimos sete segundos diários de propaganda), a pesquisa reserva dois jatos de água fria. Um levantamento feito pelo instituto com eleitores de São Paulo e do Rio de Janeiro mostrou que o que já foi crucial para uma campanha eleitoral pode não ser mais tão relevante: em 2008, a audiência das inserções em horário nobre rendia, em média, 25 e 22 pontos nas duas capitais, respectivamente. Em 2016, caiu para 7 e 6 pontos.

Bolsonaro conta ainda com outro fator capaz de minimizar sua desvantagem na TV: a baixa vulnerabilidade de seus eleitores a essa plataforma. A pesquisa encomendada por VEJA revela que o eleitorado do ex-capitão da reserva é o único majoritariamente formado por pessoas com nível superior, jovens (de 16 a 34 anos) e com renda superior a quinze salários mínimos. Essa é a fatia de eleitores mais propensa a consumir informações via grupos de Whats­App, redes sociais e sites na internet — e não pela TV. O deputado é, dos principais candidatos, o que ostenta mais seguidores no Facebook, Instagram e Twitter: 7 milhões — quase o dobro do que tem Lula.

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(Arte/VEJA)

Contra a tese de que bateu no teto, há outra, bem mais favorável ao deputado — a de que ele ainda contaria com uma quantidade de “votos envergonhados”. São assim chamadas as escolhas dos eleitores que, em pesquisa presencial, ficam constrangidos com a opção pelo ex-capitão. Em pesquisas telefônicas, e sobretudo na solidão da urna, esses eleitores não escondem o voto em Bolsonaro. Moura vê indícios de que o fenômeno pode estar ocorrendo — e pode ser mais forte entre as mulheres, cuja antipatia ao candidato é hoje seu maior problema. De todos as pessoas que responderam à pesquisa, 28% dos homens disseram votar em Bolsonaro, enquanto, no caso das mulheres, apenas 11% deram essa resposta. Moura, mestre em ciências políticas pela Universidade George Washington, lembra que o “voto envergonhado” foi uma das variáveis ignoradas em 2016 por institutos de pesquisa dos Estados Unidos, que não foram capazes de antecipar a vitória de Donald Trump.

Bolsonaro nunca ocultou sua admiração pelo presidente americano, com quem gosta de se comparar. Ao contrário do brasileiro, no entanto, que reina no eleitorado mais escolarizado, Trump garantiu a vitória com os votos de eleitores com nível mais baixo de instrução nos cinturões do desemprego nos Estados Unidos. Ganhou a disputa prometendo “grandeza nacional”. Já Bolsonaro direciona seu arsenal retórico para a segurança pública e a denúncia da corrupção. Em 2015, 5% dos brasileiros consideravam o combate à criminalidade uma questão importante na hora de escolher seu candidato. Hoje, essa porcentagem mais que dobrou: é de 11%. Quanto à corrupção, o índice subiu de 15% para 31%.

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Mas os pontos a favor de Bolsonaro não atenuam a altíssima rejeição ao seu nome — 28% dizem não votar nele de jeito nenhum (Lula é rejeitado por 31%). Mesmo assim, Bolsonaro tem se negado a suavizar o discurso. Teme que, ao mirar a queda da rejeição e a conversão de votos indecisos — cerca de 61 milhões de brasileiros ainda não sabem em quem votar —, termine frustrando os eleitores cativos. Sua estratégia é manter o discurso radical e apostar na fragmentação do centro para chegar ao segundo turno ao lado de, preferencialmente, um candidato petista indicado por Lula. Se isso ocorrer, suas chances de vitória tenderão a subir, dado que a eleição ganhará contornos de um plebiscito sobre a volta, ou não, do PT ao poder — e, para Bolsonaro, nada é melhor do que não estar no centro do palco. O embate entre seu nome e o de Haddad, em que o petista perderia (com 15%, contra 31% de Bolsonaro), demonstra que, sem Lula, os eleitores não estão dispostos a resgatar a herança do partido. Bolsonaro, portanto — um candidato que representa um nicho radical minoritário da população —, tem possibilidades reais de tornar-se presidente do Brasil. E isso é sério.


Sem marqueteiro, mas com “marquetólogo”

(Marcelo Vitorio/.)

Jair Bolsonaro jacta-se de não precisar de marqueteiro. Há uma semana, questionado se contrataria um profissional da área para sua campanha, o deputado voltou a ser taxativo: “Não vou. Por que eu vou querer marqueteiro para sete segundos de TV?”. Desde maio, no entanto, sua pré-campanha conta com os serviços de uma empresa de comunicação especializada em eleições. Dono da agência 9ideia, de João Pessoa, na Paraíba, Lucas Salles, de 55 anos, estava preparado para fazer a campanha de Julio Lossio, candidato da Rede ao governo de Pernambuco, até que recebeu o convite para trabalhar para Bolsonaro. Em entrevista ao repórter Gabriel Castro, da sucursal de VEJA em Brasília, Salles diz que escolheu o mote da campanha, produziu o jingle e está bolando a estratégia para aproveitar de “maneira surpreendente” os dois programas diários de TV de três segundos e meio de duração cada um. Ele, porém, faz uma ressalva: não é marqueteiro, cujo termo abomina. “Usa-se marquetólogo”, explica.

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Como o senhor foi para a campanha de Bolsonaro? Fui levado a Brasília pelo Julian Lemos (vice-presidente do PSL) há cerca de dois meses. No gabinete, logo que me sentei, o deputado Bolsonaro perguntou: “Você está preparado para a missão?”. Respondi que estava absolutamente preparado para trabalhar em uma campanha presidencial. Disse isso por causa da minha história. Venho trabalhando com vereador, deputado estadual, federal, prefeito e governador. Eu me sinto preparado para o desafio.

Não é curioso trabalhar para um candidato que diz não precisar de marqueteiro? Ele me disse que não gosta de marqueteiros. Eu respondi: “Somos dois”. Não sou marqueteiro. Estou há anos trabalhando para desconstruir esse termo, que é pejorativo. Usam-se marquetólogo, profissional de marketing ou consultor político. O marketing é ciência. A gente faz análise do cenário, das propostas, do candidato, do programa de governo. E equaciona a comunicação da forma mais verdadeira possível.

O que é preciso corrigir no candidato Bolsonaro? Não vou mudar nada, não vou fazer nenhuma perfumaria. Ele será apresentado em sua essência. Uma das coisas que ele me disse foi: “Eu não quero que me mude”. As pessoas buscam essa autenticidade. Quem tentar mexer com isso não vai conseguir e ele não vai aceitar, porque chegou aonde está assim.

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Qual será o mote da campanha? Nas nossas conversas, ele falava muito da verdade. Então, nós chegamos a “Muda Brasil de verdade”, que já usamos na convenção. O jingle traz o mesmo conceito. Tem gente trabalhando o tempo todo para desconstruir a imagem dele. Nosso trabalho vai ser apresentar Bolsonaro e repor a verdade.

Ele precisa moderar o linguajar? Essa é uma decisão pessoal dele. O Bolsonaro já foi assimilado pelo povo brasileiro. Cada vez mais, as pessoas compreendem que ele é verdadeiro, fala o que pensa e não mede as palavras. É tudo muito natural.

O que dá para fazer em três segundos de TV? Não posso falar da estratégia. Por enquanto é sigilosa. Mas vamos otimizar o tempo da forma mais criativa possível. As novas regras favorecem quem se posicionou mais cedo. Há alguns anos, cerca de 70% dos eleitores decidiam o voto com base na propaganda eleitoral na TV. Hoje, fala-se em 30%. As redes sociais serão muito importantes.

Quanto vai custar o marquetólogo do Bolsonaro? Não tenho essa resposta. A gente vai trabalhar com os recursos disponíveis. Fui criado na adversidade, no Nordeste. Aqui tudo é mais difícil. Isso nos estimula a trabalhar mais o lado da inovação e da criatividade.

Qual o tamanho da sua equipe? Eram dezesseis pessoas. Duas pediram demissão quando começamos a trabalhar com Bolsonaro. Alegaram desconforto.

Publicado em VEJA de 1º de agosto de 2018, edição nº 2593

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