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Duas grandes perdas na arte: Rubem Fonseca e Moraes Moreira

O autor e o músico faleceram nesta semana

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 18 abr 2020, 21h15 - Publicado em 17 abr 2020, 06h00

Em seu primeiro plantão como policial, em dezembro de 1952, Rubem Fonseca registrou as seguintes ocorrências: ferimento por arma de fogo, atropelamento, furto, choque de veículos com morte, agressão a faca. Aos 27 anos, formado em direito, o mineiro de Juiz de Fora crescido no Rio de Janeiro começava a testemunhar o submundo do crime e a selvageria humana que serviriam de inspiração para sua obra. Pouco mais adiante, deixaria a delegacia para se aventurar, a partir da década de 60, na literatura. Se o gênero policial pop costuma se pautar pela pergunta “quem matou?”, subterfúgio barato para prender o leitor até o final, pode-se dizer que Fonseca conferiu nova estatura à ficção criminal brasileira explorando outra modalidade de questão: “Que mundo-cão é este?”.

Não à toa, o estilo cru revelado na narrativa de contos (alguns entre os grandes da língua), crônicas e romances ganhou o apelido de “realismo feroz”. Seus bandidos são amorais e cruéis. Seus heróis não são lá muito melhores. É o caso do cínico advogado Mandrake, figura frequente em diversos livros do autor, como o romance A Grande Arte (1983), e que ganhou uma série no canal HBO em 2005. Recluso e avesso a entrevistas, Fonseca criou uma aura de mistério sobre si que só amplia a atração por sua obra. Entre seus grandes momentos estão os devastadores contos de Feliz Ano Novo (1975) — censurado no regime militar —, assim como o ácido Agosto (1990), no qual destrincha o ninho de cobras que liga o mundo do crime aos políticos, adaptado com sucesso pela Globo em 1993. Ele morreu na quarta-feira 15, aos 94 anos, de infarto, no Rio de Janeiro.


Paz, amor e alegria

ALQUIMISTA - Moraes Moreira: ele inovou da MPB ao Carnaval baiano (Selmy Yassuda/Dedoc)

Nas festas de São João da sua Ituaçu de origem, na Bahia, o menino Moraes Moreira já revelava pendor para músico popular: ele divertia o público tocando a sanfona de doze baixos, instrumento exótico que remete a um violino. Ao se mudar do sertão para a capital, Salvador, enfronhou-se de vez na carreira musical. Em 1969, quando a ditadura militar entrava em sua fase mais sombria, compôs doze músicas em apenas quinze dias em um quartinho de pensão, ao lado do amigo Luiz Galvão. Começava assim o grupo Novos Baianos, no qual Moraes, junto com Galvão, Dadi, Paulinho Boca de Cantor, Baby do Brasil e Pepeu Gomes, oferecia antídotos ao baixo-astral da repressão: amor livre, pirações hippies, futebol — e boa música, feita para cantar, dançar e pensar. Na última entrevista, quatro dias antes de morrer, ele disse que os Novos Baianos tinham vindo para levantar a autoestima do povo brasileiro em tempo de pandemia. Mais que ninguém, Moraes personificava a genuína, e por vezes genial, alegria na MPB.

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Com os Novos Baianos, inovou ao misturar bossa nova com rock, samba, frevo e baião. Ao ouvir uma história do bossa-novista João Gilberto sobre um erro de expressão infantil da filha, Bebel Gilberto, Moraes e companhia cunharam o nome de seu álbum mais antológico, Acabou Chorare, de clássicos como A Menina Dança e Preta Pretinha. Em uma empreitada “paz e amor”, todos foram morar em um sítio em Jacarepaguá. Em carreira-solo desde 1975, fez história no Carnaval da Bahia no ano seguinte ao ser o primeiro a cantar em cima de um trio elétrico. Um mês antes de morrer, escreveu um cordel sobre a quarentena. “Queremos mais liberdade / Para que tudo isso mude”, pregava. Ele morreu na segunda 13, aos 72 anos, de infarto, no Rio.

Publicado em VEJA de 22 de abril de 2020, edição nº 2683

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