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Contradições bélicas

O Brasil fabrica armas rechaçadas pela comunidade internacional

Por Maria Laura Canineu
Atualizado em 5 ago 2017, 06h00 - Publicado em 5 ago 2017, 06h00

Em 7 de julho, junto a 121 países, o Brasil adotou um novo tratado sobre a proibição de armas nucleares, que será aberto para assinatura na Assembleia-Geral da ONU em setembro. Em artigo no mesmo mês, o ministro das Relações Exteriores Aloysio Nunes comemorou o feito e ressaltou que a comunidade internacional tem “o dever ético e moral” de proteger civis ao redor do mundo dessas armas terríveis, “as únicas capazes de aniquilar a vida no planeta”. Ele tem razão. Avançar o quadro jurídico a fim de proibir as armas de destruição em massa é uma vitória. A participação do Brasil nesse esforço é louvável. Mas, em relação ao uso de outras armas letais, o país não faz jus ao verdadeiro espírito desse compromisso.

Vejamos o caso do Iêmen. Mais de 5 000 civis foram mortos e 8 500 feridos desde 2015, de acordo com a ONU, em ataques aéreos e terrestres promovidos por uma coalizão de países liderada pela Arábia Saudita contra as forças hutis, que tinham tomado o controle de parte do Iêmen, e aliados de seu presidente. Desde então, a coalizão matou civis de forma indiscriminada ou desproporcional, atingindo escolas, casas, hospitais e funerais, inclusive com o uso de armas de fragmentação, as chamadas “munições cluster”. No fim de 2016, essas munições foram lançadas pela coalizão nas proximidades de duas escolas de Saada, no norte do Iêmen, matando dois civis e ferindo seis, entre eles uma criança. Khaled Rashed, uma testemunha, disse: “Ouvimos dois barulhos de explosão, um mais alto que o outro e, depois disso, mais explosões, menores, vindo do céu como brasas, caíram por toda parte, sobre reservatórios de água, sobre casas”. No início deste ano, foguetes de munição cluster foram utilizados novamente e atingiram uma fazenda no norte do país, ferindo dois meninos.

Aí entra o Brasil. Fotos tiradas após os ataques mostram restos de um foguete fabricado pela empresa Avibras, em São José dos Campos, além de danos de fragmentação característicos de submunições a partir de um ataque com munição cluster.

Essas armas são amplamente proibidas pela comunidade internacional. Por uma boa razão. Contêm múltiplas submunições explosivas menores que se espalham indiscriminadamente por uma vasta área. Muitas não são detonadas de imediato e deixam submunições carregadas, que se tornam verdadeiras minas terrestres, criando uma ameaça a civis por muito tempo após o conflito. Por causa desse perigo, 102 países ratificaram e outros dezessete assinaram a Convenção sobre Munições Cluster de 2008, que proíbe sua produção, transferência, armazenamento e uso. O Brasil não assumiu nenhum desses compromissos.

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Como brasileiros, deveríamos estar inconformados com o fato de que munições fabricadas em nosso país são empregadas em ataques ilegais no Iêmen. Deveríamos insistir para que o governo se comprometa a acabar com a produção e a exportação dessas armas de efeitos indiscriminados. O Brasil já participa do tratado que proíbe minas terrestres. Por que não faz o mesmo com seu “tratado-irmão” para cessar o sofrimento humano causado por munições cluster? O “dever ético e moral” do Brasil de proteger os civis também se estende a essas armas.

Publicado em VEJA de 9 de agosto de 2017, edição nº 2542

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