Carta ao leitor: O que realmente importa
A pesquisa exclusiva publicada por VEJA aponta o que os eleitores esperam do presidente Jair Bolsonaro
Não é preciso grande capacidade de análise para perceber que vivemos tempos de profunda transformação. Diversas novidades, nas redes sociais e fora delas, vêm mudando a maneira como as pessoas vivem, consomem e se expressam. Tal cenário, marcado pela velocidade e pela instabilidade, tem repercutido de modo inconteste na cena política brasileira — nem sempre de forma positiva. A sensação é de uma enorme confusão, como se não houvesse espaço para a reflexão ou um julgamento mais ponderado dos fatos. A partir dessa nova dinâmica, muitas vezes impulsionada pelo comportamento do próprio presidente Jair Bolsonaro, miudezas ganham destaque desproporcional a sua importância e o país vai trocando de polêmica a cada semana, quando não todos os dias, esquecendo a querela anterior com a mesma rapidez.
Diante de um quadro tão anárquico, avaliar o desempenho da gestão Bolsonaro não é uma tarefa simples. Sem dúvida, há méritos inequívocos na atual administração, a exemplo da reforma da Previdência, da MP da Liberdade Econômica e das privatizações que serão implementadas pela equipe econômica. Por outro lado, as inúmeras declarações do presidente e alguns posicionamentos equivocados, como a sua política de desmonte ambiental, provocam um imenso tumulto na condução do governo — e rombos na imagem do país junto aos investidores.
E os eleitores? O que acham disso tudo? Qual é a percepção das pessoas em relação a Jair Bolsonaro? Para responder a essas perguntas, VEJA publica nesta edição uma pesquisa exclusiva com a avaliação dos brasileiros sobre o atual governo, sua agenda, as políticas públicas e os cenários eleitorais para 2022.
O resultado, como era esperado, reflete uma ambiguidade. Produzido pela FSB Pesquisa, o levantamento revela uma enorme esperança de que o Brasil cresça — e uma evidente torcida para que este governo dê certo. Aliás, se as eleições fossem hoje, mesmo em um pleito simulado com nomes como Luciano Huck e João Doria, o capitão sairia vencedor novamente. Ele também teria um desempenho contra a esquerda muito melhor que seu ministro mais popular, o ex-juiz Sergio Moro (veja os números na reportagem desta edição). Nem tudo, porém, “talkey” para o presidente. A maioria dos entrevistados desaprova a maneira como ele vem conduzindo os rumos do país. Um dado expressivo refere-se justamente às suas falas, mencionadas antes. Quase 70% acham que elas atrapalham o Brasil. Cerca de metade considera que atrapalham muito.
Outro dado igualmente importante da pesquisa é a visível insatisfação com o problema do desemprego — eis um ponto de atenção crucial para o governo. Esse item aparece como o segundo mais negativo, atrás apenas da saúde, na avaliação dos eleitores. A questão é que a paciência das pessoas não vai durar até a próxima eleição. Talvez não dure nem até o fim do ano que vem. Embora conte com a boa vontade de parte significativa da população, Bolsonaro terá de fazer entregas concretas. Se a situação permanecer semelhante à atual, o apoio tenderá a minguar — e suas tiradas, polêmicas diárias e frases de gosto duvidoso dificilmente vão obnubilar a visão de quem deposita tanta expectativa na melhora do Brasil. Como disse Abraham Lincoln (1809-1865), o mais célebre presidente da história americana: “Você pode enganar uma pessoa por muito tempo; algumas por algum tempo; mas não consegue enganar todas por todo o tempo”. Muito menos em tempos como estes, de transformação.
Publicado em VEJA de 28 de agosto de 2019, edição nº 2649