As tulipas do século XXI
Vertiginosa valorização do bitcoin atrai especuladores e preocupa autoridades, que temem que as bolhas virtuais contaminem o mundo real
As tulipas, flores de origem asiática, caíram no gosto dos holandeses no início do século XVII. A Holanda vivia a sua fase áurea de crescimento comercial, e a nova classe de burgueses investia nas artes, em artigos de luxo — e também nas então flores exóticas. Bulbos diferenciados alcançavam valores elevadíssimos. Investir em tulipas virou uma verdadeira febre. A percepção de que o preço seguiria sempre em alta atraiu especuladores. Pessoas chegaram a vender suas propriedades para especular na ciranda financeira das tulipas. Até que, em 1637, no pico da valorização, não havia mais compradores — e o preço ruiu. O episódio é considerado a primeira grande bolha especulativa. Agora a história tem sido relembrada diariamente quando o assunto é outra mania especulativa: as criptomoedas digitais, em particular o bitcoin. Apesar de já ter quase uma década de existência, a moeda virtual chamou atenção mais recentemente em decorrência de sua vertiginosa valorização. Em 2017, teve uma alta de 1 500% em relação ao dólar. Quem colocou 10 000 reais na poupança no início deste ano lucrou cerca de 700 reais. Alguém que tenha comprado a mesma quantia em bitcoins possui agora mais de 165 000 reais. Para os entusiastas do dinheiro digital, não se trata de uma bolha, mas sim do início de uma revolução no sistema financeiro. Além do bitcoin, ganham adeptos pelo mundo outras moedas virtuais, entre elas o ethereum e o litecoin — todas criadas ao largo das instituições e concebidas por ases da computação. As autoridades começam a se preocupar. Temem que as bolhas virtuais contaminem o mundo real. O fato é que, sob a liderança de jovens libertários aficionados de tecnologia, essas moedas ganham legitimidade e são aceitas por um número crescente de estabelecimentos comerciais. A cada dia surgem notícias de jovens que faturaram alto com a valorização, o que atrai novos compradores. Mas e se, como no caso das tulipas holandesas, os preços caírem de uma hora para outra?
Publicado em VEJA de 27 de dezembro de 2017, edição nº 2562