Adeus às trevas
Ozzy Osbourne, um dos pais do rock pesado, está em sua última grande turnê, que passa pelo Brasil em maio. Agora quer se dedicar à família e aos cachorros
O inglês John Michael Osbourne é um pacato cidadão de 69 anos. Casado há três décadas e meia com a também inglesa Sharon e pai de seis filhos (três do casamento anterior), passa os dias em sua mansão em Los Angeles pintando quadros e assistindo a Game of Thrones. “Minha diversão é tentar adivinhar quem vai morrer na série”, disse ele a VEJA. Bem mais tempestuoso é o alter ego que esse respeitável senhor encarnou em sua longa carreira musical. Ozzy Osbourne fez por merecer o apelido de Príncipe das Trevas. Entre outras maldades, arrancou a cabeça de uma pomba e de um morcego a dentadas (a ave foi decapitada em uma reunião do cantor com executivos de uma gravadora; já o mamífero foi jogado por um fã no palco — e Ozzy pensou que fosse de borracha), aspirou uma fileira de formigas (os militantes da Peta devem adorá-lo) e redecorou as paredes do quarto de um hotel com excrementos. Infelizmente, Ozzy não foi só uma persona do showbiz. Também se manifestou em episódios de violência doméstica: em um surto causado por álcool e drogas, ele tentou estrangular Sharon. “É algo como Dr. Jekyll e Mister Hyde”, admite o aparentemente pacificado Osbourne — que, no futuro, tentará ser mais John e menos Ozzy. Em novembro último, ele anunciou uma turnê de despedida, que no mês que vem passa por São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Rio. “Não vou deixar definitivamente os palcos, mas não farei temporadas tão longas. Sinto saudade da minha família e dos meus cachorros.”
Ozzy — apelido que carrega desde os tempos de escola primária — é um dos pais do heavy metal. À frente do Black Sabbath — cujo disco de estreia foi lançado em uma sexta-feira 13 de 1970 —, ele inaugurou um estilo musical caracterizado por andamentos pesados e letras que namoravam o macabro. “Os riffs de guitarra de Tony Iommi não permitiam que eu cantasse sobre temas alegres”, ironiza. A fama satanista do grupo provocava reações curiosas: “Viviam me dando Bíblias de presente. Ganhei mais de 1 000, mas nunca as abri”. Ozzy foi expelido do Black Sabbath no fim dos anos 70. Fez shows esporádicos com a banda nos anos 90, e há cinco anos voltou a se reunir com dois integrantes da formação original — Iommi e o baixista Geezer Butler — para gravar o disco 13. O Black Sabbath excursionou até fevereiro de 2017, quando finalmente se despediu dos palcos. Na carreira-solo, Ozzy compõe canções aceleradas que estão mais para o hard rock americano do que para o peso gótico de seu antigo grupo. Lançou seu último disco, Scream, há oito anos. Ele tem planos para um novo álbum, mas não o gravará neste ano.
Quem assistiu ao impagável reality The Osbournes, exibido pela MTV de 2002 a 2005, ficou com a impressão de que o pater familias estava sempre fora da casinha — e o roqueiro, em autobiografia, conta que de fato usava drogas quando o programa era gravado. Hoje, ele jura que conseguiu se afastar delas. Pesou na decisão a morte de amigos que também experimentaram os excessos do rock (entre eles o baixista e ocasional parceiro Lemmy Kilmister, líder do pesadíssimo Motörhead). “É melhor estar vivo do que morto. Um pouco de imortalidade não me faria mal”, brinca. John Osbourne é mortal, mas Ozzy é eterno.
Publicado em VEJA de 18 de abril de 2018, edição nº 2578