Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Carta ao Leitor: A teimosia criminosa

Passados cinco anos do incêndio na boate Kiss, o clamor por “nunca mais” caiu num vazio absoluto

Por Da Redação Atualizado em 31 jan 2018, 15h46 - Publicado em 19 jan 2018, 06h00

A tragédia da boate Kiss, que matou 242 jovens em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, é um daqueles horrores capazes de abalar um país inteiro. Ocorrido na madrugada de 27 de janeiro de 2013, o incêndio na casa noturna foi recebido com desespero, revolta — e um clamor único: nunca mais. Pedia-se que nunca mais a negligência e a irresponsabilidade voltassem a se somar para ceifar tantas vidas e ainda tão jovens. A capa de VEJA apelava para que, em memória dos mortos, ninguém mais fosse vítima “do descaso, da negligência, da corrupção de valores”.

Na semana passada, uma equipe de VEJA revisitou a cidade gaúcha. Durante quatro horas, os jornalistas da revista, acompanhados por Flávio José da Silva, o pai de uma das vítimas, examinaram os escombros da boate — filmaram, fotografaram, e deixaram o local “com um nó na garganta”, nas palavras de Silvio Navarro, editor que coordenou a equipe. A reportagem começa na página 76 e está, também, disponível no site de VEJA, com depoimentos e amplo material visual.

Além da dor provocada por um episódio tão dramático, há um enorme desalento em constatar que, passados cinco anos do incêndio, o clamor por “nunca mais” caiu num vazio absoluto. À exceção de três bombeiros, julgados por um tribunal militar, ninguém foi punido. Da carnificina, não se extraiu uma única lição útil. A chamada Lei Kiss, aprovada em 2017, recebeu tantos vetos que se tornou uma peça praticamente inócua, incapaz de dissuadir a ação de gente despreparada e irresponsável.

É lamentável que nada disso seja, de fato, uma novidade. As tragédias nacionais — enchentes devastadoras, naufrágios amazônicos, desabamentos urbanos, intermináveis mortes no trânsito — são costumeiramente recebidas com promessas eloquentes por parte das autoridades, mas nada, ou quase nada, acontece depois que os corpos são enterrados e os sobreviventes deixam os holofotes e se recolhem no silêncio de uma dor que não passa.

Continua após a publicidade

Os estudiosos dizem que existem acidentes de três tipos: os que resultam de uma falha humana, os causados por uma falha de engenharia e os acidentes de sistema — esses últimos, decorrentes de uma sucessão de erros, são praticamente inevitáveis. Em Santa Maria, a negligência — dos donos da boate, dos músicos, dos bombeiros, da prefeitura — chegou a tal ponto que não há exagero em dizer que ocorreu uma quarta categoria de acidente: uma sucessão de falhas humanas. E, no entanto, mesmo tudo isso sendo evitável e passível de correção, nem assim se fez nada, nem assim os responsáveis foram punidos. Até hoje. É uma teimosia criminosa.

Publicado em VEJA de 24 de janeiro de 2018, edição nº 2566

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.