Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

A lei do atraso

Ao oficializar Israel como “nação do povo judeu”, Netanyahu alinha-se a outros líderes que defendem identidades nacionais excludentes

Por Diogo Schelp Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 27 jul 2018, 07h00 - Publicado em 27 jul 2018, 07h00

Governantes europeus em viagem a Israel têm por praxe evitar que sua agen­da inclua uma visita ao Muro das Lamentações, epicentro das disputas territoriais entre judeus e árabes em Jerusalém. Nas últimas semanas, em datas distintas, os primeiros-ministros da Áustria, Sebastian Kurz, e da Hungria, Viktor Orbán, ambos expoentes da nova direita xenófoba, foram os primeiros líderes da União Europeia a dispensar esse cuidado com as sensibilidades palestinas. Na sexta-feira 20, ao posar ao lado do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, diante das pedras que, para os judeus, um dia sustentaram o Segundo Templo de Herodes, Orbán nem parecia o mesmo homem que, há apenas um ano, classificou como “estadista extraordinário” um histórico colaborador do Holocausto — o húngaro Miklós Horthy, que, durante a II Guerra Mundial, ajudou a deportar 600 000 judeus para a Alemanha nazista.

O que leva Bibi, como Netanyahu é chamado, a se aproximar de alguém como Orbán? A resposta está em algo que aconteceu no dia anterior, quando o Parlamento israelense aprovou uma lei básica, cujo efeito equivale ao de uma emenda constitucional, dando ao povo judeu o “direito exclusivo de autodeterminação nacional” no território de Israel. O texto também rebaixa o árabe, antes considerado uma língua oficial ao lado do hebraico, a um “status especial” e estabelece que “o Estado vê o desenvolvimento de assentamentos judeus como um valor nacional e vai agir para encorajar e promover seu estabelecimento e sua consolidação”. A nova lei é um duro golpe para aqueles que lutam, em Israel, pela diminuição da segregação das minorias étnicas do país — sendo a maior delas a dos árabes, que representam 21% da população. Como indivíduos, eles têm assegurados os mesmos direitos de qualquer cidadão israelense. Os direitos coletivos, porém, não são iguais, pois, na prática, o Estado privilegia os interesses da população judaica em geral. Os árabes israelenses reclamam, por exemplo, de que as verbas públicas são destinadas em maior volume a regiões habitadas por judeus e que é praticamente impossível conseguir autorização para construir em novas terras — dificuldade que os judeus não enfrentam. “Do ponto de vista prático, a lei não era necessária. Ela vem apenas para lembrar à minoria árabe que Israel não é a sua casa”, diz o cientista político Ronald Krebs, da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos. É um passo que viola o espírito que pautou a criação de Israel, em 1948, quando seu ideal era dar direitos iguais “a todos os seus cidadãos, independentemente de religião, raça ou gênero”. Agora, alija-se na lei.

A mudança é outra prova cabal de que o governo de Bibi se move cada vez mais para a extrema direita, rendendo-se aos defensores de uma identidade nacional excludente em detrimento da democracia liberal da qual muitos israelenses seculares costumavam se orgulhar. Parte da discussão para a aprovação da lei ancorou-se no medo, compartilhado por muitos judeus israelenses, de que a população árabe possa superá-los em número, no futuro. Na realidade, os judeus ultraortodoxos é que formam o grupo que mais cresce (veja o quadro).

Continua após a publicidade

A nova lei agrada especialmente ao eleitorado pró-nacionalismo religioso. Nesse ponto está a justificativa para a aproximação de Netanyahu com líderes autoritários e xenófobos da Europa — e com Donald Trump, que reconheceu Jerusalém como capital de Israel. Diz Tamir Sorek, professor de estudos judaicos da Universidade da Flórida: “Essas alianças são baseadas não apenas em interesses comuns, mas na proximidade ideológica: a aversão à democracia liberal e à imprensa livre, a nostalgia de um passado glorioso e a islamofobia”.

Publicado em VEJA de 1º de agosto de 2018, edição nº 2593

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.