A artista dos rostos
Maquiadora mais famosa e influente do mundo, a inglesa Pat McGrath é a força por trás da adesão das mulheres ao bocão vermelho e ao brilho da purpurina
Quando a modelo Naomi Campbell atravessou o tapete vermelho no último Video Music Awards, a premiação da MTV americana, os olhares e suspiros não foram para o vestido, um discreto longo branco, nem para o cabelo, solto e sem adereços. O que hipnotizou a plateia foi a boca vermelha e cintilante de glitter ostentada pela top. Obra de Pat McGrath, a maquiadora — ops, make up artist — inglesa que está para o mundo da beleza como Neymar agora está para o do futebol: no centro de tudo. Pat trilha essa estrada há trinta anos, executando sua mágica no rosto de modelos em passarelas, editoriais de moda e campanhas publicitárias. Nos últimos tempos, ela tornou-se imprescindível: assina atualmente a maquiagem de mais de sessenta desfiles por ano, aí incluídos os da Prada, Givenchy, Versace e Dolce&Gabbana. Também dá consultorias, tem um contrato com a Procter & Gamble e acaba de ser alçada a editora contribuinte da Vogue inglesa. Nas horas vagas, lança produtos próprios, sob a marca Pat McGrath Labs. O último, uma linha de batons anunciada em seu Instagram (1,5 milhão de seguidores) em meados de junho, acabou em duas semanas e um novo lote acaba de chegar às lojas.
“Pat é ‘o cara’ da maquiagem”, derrete-se o maquiador brasileiro Fernando Torquatto. “Ela sabe transportar a dramaticidade da passarela, como o brilho da purpurina e os olhos desenhados, para as mulheres comuns. Hoje, faço até noivas com glitter”, diz Torquatto. A transposição se dá inteiramente nas redes sociais, em que ela circula com desenvoltura, fazendo comentários, postando vídeos (em um deles, ensina como aplicar o glitter sobre batom vermelho nos lábios irretocáveis da modelo Taylor Hill) e lançando seus produtos, cerca de quatro por ano. As edições são limitadas, o preço médio é de 40 dólares para cada item do kit, acomodado em embalagem de paetês, as vendas são feitas on-line e em lojas selecionadas e, invariavelmente, o estoque se esgota em pouquíssimo tempo.
Embora seja famosa pela capacidade de dar à pele uma aparência de frescor natural, a maquiagem de Pat não tem nada de discreta. Os olhos são riscados em preto e realçados por roxo, rosa, dourado. A boca explode em púrpura e vermelho-sangue, em tons “úmidos”. “Eu não me sinto bem fazendo o que todo mundo faz. Fujo da maquiagem chata”, diz ela. Até quando a produção é simples o brilho comparece, como na lantejoula cortada ao meio e aplicada nos cílios de Gisele Bündchen. Gisele é amiga de mandar mensagem agradecendo “por ter me deixado linda, como sempre”, da mesma forma que modelos, estilistas e artistas com quem a inglesa trabalha. Pat, que já recebeu uma honraria da rainha Elizabeth, que foi homenageada pela mais importante associação de moda de Nova York, que é chamada de gênio por Stella McCartney e de “Velázquez do mundo da beleza” em um texto mais exaltado, é universalmente descrita como pessoa simples e calorosa.
Aos 47 anos, sempre de preto, faixa no cabelo e, sim, maquiagem discretíssima, ela nunca se casou. Diz que sua condição de “viciada em moda” é influência da mãe, Jean, costureira jamaicana devotada em igual medida à religião (Testemunhas de Jeová) e ao mundo da beleza, do qual reclamava sempre da falta de produtos para negras. Daí vem sua especialidade: trabalhar com esse tom de pele. Pelas últimas contas, ganha 40 000 dólares em um desfile de grife poderosa e diária de 10 000 dólares em campanha publicitária. Mora em Nova York, mas está sempre para lá e para cá, com suas dezenas de malas de produtos. Tem muitos assistentes, porém faz questão de finalizar, uma a uma, a maquiagem das modelos, usando as pontas dos dedos, que, juram elas, são mais quentes do que as dos comuns mortais. “Acho que esse é meu segredo”, brinca, enquanto continua imperando sobre sua legião de seguidores — inclusive no Brasil, o terceiro maior consumidor de cosméticos do mundo. Ave, Pat.
Publicado em VEJA de 16 de agosto de 2017, edição nº 2543