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Voto distrital: como dividir a cidade sem rachar o eleitorado

Na implantação do sistema majoritário, o desenho dos distritos é um ponto chave. Estudo do Centro de Liderança Pública mostra que é possível proteger seu traçado da manipulação política

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 24 Maio 2015, 08h45

Conforme avança no Congresso o projeto de voto distrital nas eleições para vereador, ganha relevo uma questão chave para sua adoção: o traçado dos distritos. Pela proposta de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), cidades com mais de 200 mil eleitores seriam divididas em tantos distritos quantas são as cadeiras nas câmaras municipais, e o candidato mais bem votado em cada região é eleito. É um modelo que barateia as campanhas, porque cada candidato só concorre em seu distrito, e aproxima o político do eleitor – com a vantagem adicional de ser fácil de entender, ao contrário do atual sistema, o proporcional, com seu famigerado quociente eleitoral. Os críticos do sistema distrital, contudo, apontam o risco de que o desenho dos distritos seja alvo de manipulação política. É um risco real: o traçado viciado das áreas em disputa pode rachar um determinado reduto eleitoral com o único fim de diluir os votos. Mas não se trata de um risco incontornável, como fazem crer os adversários do voto distrital – em particular petistas e partidos nanicos. Ao contrário. Um estudo elaborado pelo Centro de Liderança Pública (CLP), ao qual o site de VEJA teve acesso, mostra que é possível definir distritos eleitorais com isenção e rigor, a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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“Uma das maiores críticas ao sistema distrital é a de que os distritos não são definidos em função de características geográficas e socioeconômicas, mas segundo interesses eleitorais. Isso ficou eternizado em Boston, nos Estados Unidos, onde pegavam bairros pobres e os anexavam a áreas ricas vizinhas para que não tivessem representação”, conta o estatístico Örjan Olsén, um dos maiores especialistas em opinião pública do país e autor do estudo. O caso de Boston data dos primórdios do século XIX e é tão emblemático que acabou batizando a manobra: “gerrymandering”, termo formado a partir do nome do então governador de Massachusetts, Elbridge Gerry, eleito em 1810, e “salamander” (salamandra), porque o esdrúxulo traçado dos distritos lembrava as formas do anfíbio. Mas Olsén se apressa a lembrar que é possível proteger o sistema distrital desse tipo de distorção. “Nossa ideia é usar dados do IBGE, que foram constituídos há muito tempo e por critérios técnicos”, diz.

Uma simulação para São Paulo, Rio e Belo Horizonte demonstra que o desenho dos distritos pode seguir critérios sólidos. No caso da capital carioca, por exemplo, haveria 51 distritos (conforme o número de assentos na câmara municipal) com cerca de 123.000 eleitores cada. Os partidos inscreveriam apenas um candidato para cada região e seria o mais votado, assim como nas eleições para prefeito, governador e presidente. Servindo-se dos dados do IBGE, os territórios seriam definidos de modo a evitar perfis muito díspares de renda. “O importante é que os distritos sejam compostos de elementos espaciais contíguos e que não apresentem grandes heterogeneidades socioeconômicas, principalmente aquelas que artificialmente diluam o poder de eleger um vereador das comunidades mais carentes”, escreve o estatístico em suas conclusões.

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Para chegar à divisão dos distritos, o pesquisador usa demarcações de bairros e o Setor Censitário – em outras palavras, o CEP, a menor unidade geográfica utilizada nos cálculos do IBGE, que reúne entre 200 e 400 domicílios. “Partimos do critério geográfico e de homogeneidade para que a pesquisa não fosse contaminada pelo critério político, já que os dados do IBGE existem a priori e não tem como mudá-los agora”, considerou. No caso carioca, por exemplo, um único distrito englobaria a favela da Maré, e outro, o bairro da Barra da Tijuca. Como no Rio há favelas encravadas entre bairros nobres e áreas de preservação ambiental pouco habitadas, a divisão exigiu um trabalho minucioso. “Um lugar que acaba misturando um pouco é o das favelas da Rocinha e do Vidigal. Elas acabaram formando um distrito com Alto Gávea, Alto Leblon e São Conrado. Mas, as favelas ficaram com 90.000 votos. Ou seja, são maioria no distrito”, disse. Em São Paulo, foram constituídos 70 distritos para 430.000 eleitores. Em Belo Horizonte, 41 regiões para 57.500 moradores com direito ao voto. Em ambos os casos, a pesquisa encontrou perfis mais homogêneos para cada distrito. “A exceção é Paraisópolis, na capital paulista, onde há um efeito similar ao da Rochinha no Rio”, diz.

Na proposta do senador José Serra (PSDB-SP), o desenho dos distritos ficaria a cargo dos Tribunais Regionais Eleitorais, “observados a contiguidade territorial e igualdade do voto” e respeitando um limite de 5% para diferença entre o número de eleitores dos distritos mais e menos populosos. O projeto de Serra foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado em caráter terminativo no dia 22 de abril – ou seja, seguiu direto para a Câmara sem precisar passar pelo plenário. Atualmente, ele tramita na CCJ da Câmara. Para que o modelo seja instaurado nas eleições municipais de 2016, é preciso que ele seja sancionado até outubro deste ano. O relator do PL na Casa, deputado Índio da Costa (PSD), se mostrou otimista quanto à sua aprovação, embora preveja uma tramitação menos célere. “Nós estamos em maio. Ainda temos quatro meses para discuti-lo”, disse. Entre os maiores opositores do projeto estão os petistas e filiados a partidos nanicos. Não é para menos: estudo anterior, feito a partir da votação para deputado federal em 2010, mostrou que o PT seria, entre as grandes bancadas, a que perderia mais cadeiras (8). O PMDB seria o maior beneficiário, emplacando mais 14 deputados. Segundo a pesquisa, deixariam de chegar à Câmara federal 35 sindicalistas, 21 religiosos e 28 parentes de políticos.

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