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‘TCU deve quebrar tradição em nome da moralidade’, diz procurador sobre Cedraz

Julio Marcelo de Oliveira explica por que se posicionou contra a recondução do atual presidente da corte de contas. Eleição ocorre nesta quarta-feira

Por Pieter Zalis 2 dez 2015, 15h12

Em uma atitude pouco usual, o procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Julio Marcelo de Oliveira, resolveu tomar partido nas eleições para presidência da corte, que ocorrem nesta quarta-feira. Desde a semana passada, o procurador vem usando sua página pessoal no Facebook para questionar a legitimidade da recondução do ministro Aroldo Cedraz à presidência do tribunal. O filho do ministro, Tiago, foi citado em depoimentos do empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia e um dos delatores da Operação Lava Jato. Segundo Pessoa, Tiago recebia 50.000 reais mensais para repassar à empreiteira informações de seu interesse na corte de contas. Na rede social, Oliveira afirma que “os envolvidos, direta ou indiretamente, na denúncia constante da colaboração premiada devem ficar afastados da relatoria e participação nos julgamentos dos processos relacionados com a operação Lava Jato” e que “a condução da Casa deve recair sobre os membros que não estão envolvidos nas denúncias ainda sob investigação”. Na entrevista a seguir, o procurador explica os motivos que o levaram a se posicionar e fala das dificuldades do TCU para prosseguir nas apurações da Lava Jato.

Por que o senhor adotou uma postura pública contra a recondução do ministro Aroldo Cedraz à presidência do Tribunal de Contas da União? Nunca houve uma circunstância em que o ministro no exercício da presidência tenha sido citado em fatos tão graves como esses da Lava Jato. Em delação premiada, o presidente da UTC informou ter pago um milhão de reais por uma decisão do tribunal na obra de Angra 3 e ainda afirmou que pagava 50.000 reais por mês a Tiago Cedraz. São denúncias muito graves, que colocam sob suspeita a idoneidade das decisões do tribunal. A legitimidade do TCU está no trabalho dos auditores, dos ministros, e do ministério público que atuam no órgão. O trabalho precisa ser técnico e, se não for, o tribunal perde sua credibilidade.

Em um texto, compartilhado em sua página pessoal no Facebook, o senhor questiona o papel do Aroldo Cedraz nas investigações do TCU sobre a Lava Jato. Por que? A mobilização da força tarefa no TCU para investigar a Lava Jato está muito aquém do que deveria. A quem compete alocar servidores entre as diversas atividades do TCU? Ao seu presidente. A quem compete definir o que é prioritário? Ao seu presidente. A priorização não está adequada. No Tribunal, temos apenas doze auditores dedicados a Lava Jato, num grupo total de 1500 auditores. A Polícia Federal possui quarenta agentes e peritos dedicados à Lava Jato. Já no Ministério Público Federal são doze procuradores, fora os funcionários da instituição. Você pode imaginar como esses doze auditores do TCU vão dar conta de todos esses processos envolvendo bilhões de reais em um prazo minimamente aceitável? É impossível. Não se pode priorizar processos de tomada de 50.000 reais ou 100.000 reais e deixar para depois processos de bilhões, como esses da Lava Jato.

Mas o senhor acredita que os outros dez ministros, que são responsáveis pela eleição, estão dispostos a não reconduzir Aroldo Cedraz? Acredito que os ministros da casa estão preparados para responder esse desafio. Quando os problemas se apresentam, temos que ter a coragem de enfrentá-los e resolvê-los. Não é fingindo que os problemas não existem que a gente vai resolver. Eu tenho a esperança que haja uma sensibilização dos ministros, no sentido de perceber que a gravidade da suspeição recai hoje sobre a administração como um todo. Eles vão precisar quebrar uma tradição em nome de um princípio muito maior que é a moralidade da administração pública e da credibilidade dessa instituição.

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Qual essa tradição que precisa ser quebrada? O ministro mais antigo que ainda não foi presidente do tribunal é eleito por um ano e a prática é que o ministro seja reconduzido por mais um ano. Ou seja, geralmente exercem a presidência por dois anos e a tradição diria que o ministro Aroldo Cedraz seria reconduzido agora. O voto também é secreto e apenas os ministros podem votar. De novo: eu tenho esperança que haja uma sensibilização dos ministros, no sentido de perceber que a gravidade da suspeição do presidente recai hoje também sobre a administração de todo o TCU.

Qual a participação do TCU na Lava Jato? Há uma relação de cooperação com a Justiça Federal e o Ministério Público. Todos os elementos que o TCU identificou em suas auditorias, antes e depois da Lava Jato, foram compartilhados e fornecidos para a operação. Da mesma forma, as provas colhidas na investigação criminal, e que tiveram autorização do juiz Sergio Moro, foram compartilhadas conosco. Então, estamos falando de um papel institucional alimentando outras instituições com informações relevantes que permitirão conhecer a verdade e dar combate efetivo às irregularidades que foram identificadas. Por isso, é importante que o TCU possa estar adequadamente engajado e aparelhado. Esse engajamento não pode ser retórico. É preciso traduzir em alocação de força de trabalho porque a quantidade de dados a ser analisados é imensa.

Estão previstos protestos populares contra a recondução do ministro Cedraz à presidência. Desde o julgamento das pedaladas, os olhos da opinião pública ficaram mais atentos ao TCU? Sem dúvida. Pela primeira vez na história, no julgamento das contas do governo de 2014, tivemos uma sessão pública do tribunal transmitida ao vivo em um canal de televisão. Centenas de pessoas estavam na frente do TCU esperando resultado. Isso é inédito. Daqui para frente, o nível de consciência que a população adquiriu em relação ao papel do TCU vai resultar em uma maior cobrança da sociedade. Mais do que nunca, a sociedade vai esperar que o tribunal mantenha um alto padrão de rigor nos exames das despesas públicas. Sempre que surgir um grande escândalo, a população vai perguntar: onde está o TCU? O que ele estava fazendo para combater esse escândalo? Por isso, não podemos deixar que essa eleição coloque a credibilidade do tribunal em jogo.

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