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Quanto custa a democracia

Em 2017, mais de 11 bilhões de reais devem deixar os cofres públicos para financiar o Congresso Nacional e as atividades de partidos políticos

Por Guilherme Venaglia
Atualizado em 29 set 2017, 14h29 - Publicado em 28 set 2017, 22h55

Onze bilhões, centro e trinta e dois milhões, quinhentos e setenta e nove mil, duzentos e noventa reais. É essa a cifra estratosférica que manterá girando em 2017 as principais instituições da democracia representativa brasileira: a Câmara dos Deputados, o Senado Federal e os partidos políticos.

Para chegar a esse valor, levantamento de VEJA considerou o orçamento previsto para as duas Casas legislativas neste ano, mais os valores do Fundo Partidário e da renúncia de impostos para emissoras de rádio e TV que a União faz todo ano para sustentar o horário eleitoral “gratuito”. Esse valor tende a crescer ainda mais em 2018, com eleições gerais e com a aprovação de um fundo especial para financiar campanhas – o novo caixa com dinheiro público já passou pelo Senado e agora será avaliado pela Câmara. Tudo isso somado ao ritmo de melhora na economia, que deve permitir reajustes nos orçamentos e reduzir os contingenciamentos que ocorreram neste ano.

Do total, cerca de 1,3 bilhão de reais tem a função de sustentar de forma direta, ano a ano, o trabalho de deputados federais e senadores, considerando vencimentos, benefícios, verbas e ajudas de custo. O valor médio anual por parlamentar é estimado em 2,3 milhões para cada senador e 2,1 milhões de reais para cada deputado.

Os maiores gastos que entram na conta são as verbas de gabinete, utilizadas para bancar os assessores aos quais os políticos têm direito, nos limites de 101.971,74 reais para a Câmara e 127.024,36 reais no caso do Senado – o primeiro previsto em lei, o segundo calculado a partir da quantidade e categorias dos servidores comissionados permitidos hoje por senador.

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No caso dos deputados, além do gabinete, foram contabilizados o salário de 33.700 reais pago aos parlamentares, o auxílio-moradia (para os que não ocupam apartamentos funcionais), a cota parlamentar de 39.800 reais mensais, e a ajuda de custo, de dois salários ao longo dos quatro anos de mandato. Os senadores têm o mesmo vencimento, a ajuda para habitação – caso não residam em imóveis públicos – e o auxílio para outros custos, além de uma cota variável por estado de, em média, 32.600 reais.

Não foram considerados valores com serviços médicos, que estão relacionados às necessidades de cada parlamentar e não são pré-estipulados. O auxílio-moradia foi calculado da seguinte forma: somamos o gasto com os 150 deputados que utilizaram o benefício no mês de julho e dividimos o total pelos 513 parlamentares, partindo do princípio que o valor só é pago porque os colegas ocupam os apartamentos funcionais disponíveis. Para chegar ao valor mensal da ajuda de custo, consideramos a soma de dois salários, cerca de 67.000 reais, e dividimos pelo período do mandato, quatro anos ou 48 meses.

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Orçamento

A maior parte do custo da democracia representativa brasileira envolve o orçamento das duas casas do Congresso Nacional, previsto para chegar a 10,1 bilhões de reais neste ano. Desse total, mais de 80%, tomando como base o efetivamente pago em 2016, contempla os gastos com a remuneração e benefícios de servidores atuais e valores destinados a financiar o sistema de previdência, as aposentadorias e pensões de inativos.

Completam o bolo os custos de processo legislativo, fiscalização e representação política; gastos técnicos e administrativos do Parlamento; a comunicação e divulgação institucional; os setores de imprensa e veículos institucionais da Câmara; as contribuições para órgãos de representação internacional; e eventuais obras e reformas na estrutura do Congresso.

Ao menos nos últimos cinco anos, de 2013 para cá, o valor subiu cerca de 30%, próximo ao Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), da Fundação Getulio Vargas (FGV), que mede a inflação. Os dados, do Sistema de Informação de Planejamento e Orçamento (SIOP) do Ministério do Planejamento, mostram que as contas do Parlamento tiveram um baixo índice de contingenciamento em tempos de crise econômica, de cerca de 5%. Outras áreas da União tiveram cortes bem mais expressivos, como o Ministério da Ciência e Tecnologia, que terminou 2016 com 40% a menos do que no começo do ano.

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O bolo dos partidos

Os brasileiros, cada vez mais, não pagam apenas para manter a atividade dos políticos depois que eles chegam a Brasília, mas também o custo das campanhas eleitorais que os levaram até lá. A proibição do financiamento empresarial de campanhas, em 2015, ocorreu simultaneamente a uma elevação de mais de 100% no valor do Fundo Partidário, sustentado exclusivamente com dinheiro público, que passou de 371,7 milhões (2014) para 867,6 milhões de reais em apenas um ano.

Criado para pagar as contas da manutenção dos partidos, o fundo acabou servindo, no pleito de 2016, para suprir a falta do dinheiro das empresas na hora de arcar com as contas salgadas das campanhas. Em 2017, em meio a cortes em diversas áreas, o governo pediu e a Câmara autorizou que parte do valor fosse economizado para diminuir o rombo nas contas públicas, reduzindo provisoriamente para cerca de 641,4 milhões.

A expectativa, no entanto, é que a melhora da economia garanta o pagamento do valor integral em 2018, que ainda pode ser reajustado e beirar os 900 milhões de reais. Pelas regras atuais, 5% são divididos entre todos os partidos existentes, enquanto o restante é partilhado de acordo com o resultado das últimas eleições para a Câmara dos Deputados. Em 2016, os três partidos que mais receberam foram o PT, o PSDB e o PMDB, que, somados, chegaram à cifra de 286 milhões de reais.

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Gratuito para quem?

Projeto de lei do senador Armando Monteiro (PTB-PE) aprovado pelo Senado estabeleceu um fundo estimado em 1,7 bilhão de reais para bancar as campanhas de 2018 e chamou a atenção para um de seus componentes: a verba que hoje é destinada como renúncia fiscal às emissoras de rádio e TV que exibem o horário político. Pela legislação atual, os partidos têm direito a espaços semestrais nos veículos de comunicação, mesmo em períodos não eleitorais, para apresentar seu programa partidário.

As inserções são exibidas pelos canais sob a pecha de horário eleitoral “gratuito”, porque, de fato, as legendas não precisam desembolsar um único real para exibi-las. O que não significa, é claro, que ninguém pague: as empresas de comunicação têm direito a abater o valor comercial das propagandas do total que seria pago a título de Imposto de Renda. Um levantamento feito pela ONG Contas Abertas, a partir de demonstrativos da Receita Federal, estimou que o valor deve chegar a 1 bilhão de reais com o pleito do ano que vem.

O valor total das renúncias fiscais oscila em cada ano, sendo maior quando acontecem eleições gerais, vindo na sequência os anos com pleitos municipais e depois os anos sem votação, quando os únicos programas partidários exibidos são os periódicos. A proposta de Monteiro foi um substitutivo ao projeto original do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que previa o fim completo do horário eleitoral e a destinação de 100% dessa verba para financiar campanhas, evitando novos gastos públicos.

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Aprovado, o substitutivo de Monteiro, no entanto, limitou a realocação apenas aos anos em que não há eleições, mantendo os programas às vésperas de pleitos. Para substituir e complementar o caixa, o Senado decidiu destinar 30% das emendas de bancada, que financiam projetos nas regiões de deputados e senadores, como obras de infraestrutura e até reforma de hospitais e escolas. Portanto, um novo montante, que não era direcionado à atividade política, vai reforçar ainda mais o custo da democracia.

Presidente da Câmara, casa que avalia agora o projeto, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já avisou que há restrição entre os deputados a respeito da aplicação das emendas para esse fim e que o assunto ainda será bastante debatido. O tempo é curto e os parlamentares têm até o fim da próxima semana, quando faltará um ano para a próxima eleição, para definir qualquer regra que valerá no pleito de 2018.

A esperança de uma reforma política ampla e que dê resposta aos anseios da sociedade se mostra cada vez mais como um sonho distante. A aprovação do projeto como saiu do Senado se apresenta como um aumento no já caro preço da política brasileira.

Essenciais a qualquer sociedade que preza pela democracia e pela representação popular, as instituições políticas consomem um alto valor do bolso dos contribuintes e precisarão fazer o preço valer e dar respostas às demandas dos brasileiros. O risco é diminuir ainda mais a confiança nos políticos e ampliar a crise institucional brasileira.

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