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Presidente não pode ocultar dados sobre desaparecidos, diz órgão do MPF

Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão saiu em defesa do relatório produzido pela Comissão Nacional da Verdade, chamado pelo presidente de "balela"

Por Estadão Conteúdo 30 jul 2019, 14h12

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal, avalia que a declaração do presidente Jair Bolsonaro sobre o desaparecimento de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira – pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz – “reveste-se de enorme gravidade, não só pelo atrito com o decoro ético e moral esperado de todos os cidadãos e das autoridades públicas, mas também por suas implicações jurídicas”.

Na segunda-feira, 29, Bolsonaro afirmou que poderia “contar a verdade” sobre a morte do pai de Santa Cruz. Em seguida, o presidente apresentou uma versão sobre o desaparecimento que não tem respaldo em informações oficiais.

Em nota pública, o órgão do MPF diz que o crime de desaparecimento forçado é permanente, ou seja, a sua consumação persiste enquanto não se estabelece o paradeiro da vítima. “Qualquer pessoa que tenha conhecimento de seu destino e intencionalmente não o revela à Justiça pode ser considerada partícipe do delito”, afirma o comunicado assinado pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e pelo procurador-adjunto Marlon Weichert.

Ainda de acordo com os dois procuradores, “o desaparecimento forçado por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, apoio ou aquiescência do Estado, é uma grave violação aos direitos humanos, conforme estabelecem duas convenções internacionais promulgadas e ratificadas pelo Brasil”.

A Procuradoria informou que “o desaparecimento forçado é um dos crimes internacionais que merece a mais severa sanção, posto que reúne diversas ações ilícitas que se originam com a prisão ou detenção ilegal, perpassam a prática de tortura, falsidade sobre o paradeiro, subtração de provas, obstrução da Justiça e, quase sempre, culmina no homicídio e na ocultação de cadáver”.

“Qualquer autoridade pública, civil ou militar, e especialmente o Presidente da República, é obrigada a revelar quaisquer informações que possua sobre as circunstâncias de um desaparecimento forçado ou o paradeiro da vítima”, diz a nota.

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Crime contra a humanidade

No documento, a Procuradoria relembra que o Brasil foi condenado em duas oportunidades – nos casos Vladimir Herzog e Gomes Lund – pela Corte Interamericana de Direitos Humanos pela prática de crimes contra a humanidade e de graves violações aos direitos humanos durante a ditadura militar, sentenças nas quais foi determinado que o Estado promovesse a investigação, o julgamento e a punição pelos crimes de desaparecimento forçado de pessoas, execuções sumárias e tortura.

A Procuradoria afirmou que a Comissão Nacional da Verdade (CNV) produziu um relatório que é um “documento legal”, feito para “elucidar fatos que possuíam versões conflitantes, conferindo a expressão da ‘verdade estatal’, a qual deve ser observada pelos órgãos da administração pública”.

Nesta terça-feira, 30, Bolsonaro afirmou que não existem documentos que possam comprovar como ocorreu a morte do pai de Felipe Santa Cruz e classificou os arquivos oficiais sobre mortos e desaparecidos durante a ditadura militar, produzidos pela CNV, como “balela”.

Na nota, a Procuradoria ressalta que o desaparecimento forçado de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi investigado pela CNV, e, anteriormente, pela Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos e pela Comissão de Anistia.

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À época, o pai do presidente da OAB era funcionário público, com emprego fixo e integrava a Ação Popular. Ao contrário de outros militantes da época, não estava na clandestinidade, diz a Procuradoria. “Também não consta registro nessas comissões de que tivesse tido participação em algum ato da luta armada.”

Fernando foi visto pela última vez quando deixou a casa de seu irmão, no Rio, em 23 de fevereiro de 1974. Provavelmente, foi preso junto com Eduardo Collier Filho por agentes do DOI-CODI do I Exército e, em momento incerto, transferido para o DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, à época dirigido por Carlos Alberto Brilhante Ustra. A suspeita é que Fernando Augusto “tenha sido assassinado na Casa da Morte, em Petrópolis (RJ)”.

A CNV, diz a Procuradoria, concluiu que Fernando Santa Cruz foi “preso e morto por agentes do Estado brasileiro e permanece desaparecido, sem que os seus restos mortais tenham sido entregues à sua família. Essa ação foi cometida em um contexto de sistemáticas violações de direitos humanos perpetradas pela ditadura militar instaurada no Brasil em abril de 1964”.

A Procuradoria diz que “não é a primeira vez que o presidente da República se manifesta em aprovação à violação de direitos humanos na ditadura militar”. Para o órgão do MPF, as declarações de Bolsonaro são graves porque “a responsabilidade do cargo que ocupa impõe ao Presidente da República o dever de revelar suas eventuais fontes para contradizer documentos e relatórios legítimos e oficiais sobre os graves crimes cometidos pelo regime ditatorial”.

“Essa responsabilidade adquire ainda maior relevância no caso de Fernando Santa Cruz, pois o presidente afirma ter informações sobre um crime internacional que o direito considera em andamento.”

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A Procuradoria conclui a nota afirmando que não há sigilo sobre esses dados, conforme a Lei de Acesso à Informação”, e que a Constituição “exige do Chefe de Estado que aja com moralidade, legalidade, probidade e respeito aos direitos humanos”.

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