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Pesquisa: Os parlamentares ‘influencers’ que dominam as redes sociais

A atual legislatura no Congresso inaugurou um vale-tudo por likes e é movida pelo ainda obscuro mundo virtual

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 15 dez 2020, 15h47 - Publicado em 10 Maio 2020, 09h34

Num passado não tão distante, cenas de políticos passeando por um lugar de grande concentração popular e seguidos por uma tropa de assessores representavam o auge de uma campanha. A sensação de proximidade e a imagem de que o candidato era um ser comum que compartilhava dos mesmos hábitos do eleitor sempre atraiu votos. Fechadas as urnas, tudo mudava, principalmente no caso de deputados e senadores que, ao se mudarem para Brasília, se tornavam praticamente inalcançáveis para grande parte de seus apoiadores. As redes sociais restabeleceram essa conexão e mudaram a relação entre os eleitores e o Parlamento.  Atualmente, todos os congressistas mantêm pelo menos uma conta ativa em alguma rede social – fenômeno, portanto, que já contagiou todo o espectro partidário e ideológico.

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Além da já conhecida “bancada do YouTube”, cujos entusiastas fotografam, filmam e transmitem tudo em tempo real, as redes inauguraram no Congresso um novo e controverso modelo de legislar: aquele que é guiado pelo clamor da internet. A pedido de VEJA, o Instituto FSB Pesquisa elaborou um ranking dos parlamentares mais influentes nas redes ao longo de 2019. O resultado foi atingido com base no monitoramento de todas as publicações feitas no Facebook, Instagram e Twitter a partir de 1º de fevereiro, quando a legislatura teve início, e no grau de engajamento de cada uma delas. Para o cálculo, foram levados em consideração o número de seguidores, a quantidade de postagens, o alcance delas e o nível de interação – representada por curtidas, comentários e compartilhamentos. Há pesos diferentes para cada rede e para cada item analisado. O monitoramento é feito diariamente e, a cada semana, é encaminhado aos congressistas que, com base nele, definem suas estratégias digitais. A reportagem listou os dez deputados e dez senadores mais bem posicionados no ranking . Na Câmara, dos cinco primeiros colocados, só um não está no primeiro mandato: Eduardo Bolsonaro, o filho Zero Três do presidente Jair Bolsonaro. Os demais são estreantes na política e, usando e abusando das redes sociais, souberam surfar na onda que provocou uma histórica renovação nos quadros da Casa.

Já no Senado, o ranking é misturado entre figuras já tarimbadas. Lá, o ex-governador e ex-candidato à Presidência em 2018 Alvaro Dias (Podemos) foi o primeiro colocado entre os mais influentes. Atualmente, ele tem 1,4 milhão de seguidores no Facebook, 201.000 no Instagram e cerca de 420.000 no Twitter. Os números são grandiosos, mas não se configuram em um fenômeno absoluto – o senador de primeiro mandato e colega dele de partido Marcos do Val, por exemplo, tem quase o triplo de seguidores no Facebook, mas fica atrás no ranking por causa das outras métricas aplicadas pelo instituto.  Alvaro Dias já tem em sua rotina uma dinâmica específica para as redes sociais.

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“Vou dormir com o telefone na mão e acordo com o telefone na mão. Antes de fazer a barba, eu já fiz alguma coisa na rede para deixá-la atualizada”, conta. Além de ele próprio ser o principal encarregado de manter suas páginas virtuais, o senador conta com uma tropa de dez assessores para auxiliá-lo no ofício. Por isso, raramente é possível vê-lo andando desacompanhado no Senado. A cada discurso, há pelo menos um fotógrafo e um cinegrafista a postos para registrar a fala – as mais populares, normalmente pautas anticorrupção e relacionadas à Lava-Jato, são imediatamente transmitidas ao vivo. Há um time escalado também para fazer montagens, escrever as publicações e ainda ler cada um dos comentários e respondê-los individualmente. Todos são funcionários do seu gabinete, e, portanto, pagos com a cota específica para contratação de pessoal.

Kajuru: gravações de roupão durante licença médica
Kajuru: gravações de roupão durante licença médica (Cristiano Mariz/VEJA)

É também na mais pura intimidade que os seguidores gostam de ver os políticos. Alguns não se encabulam de atender a demanda à risca. No fim do ano passado, enquanto estava de licença médica, o ex-jornalista e senador Jorge Kajuru (Cidadania) chegou a fazer uma live dentro do quarto do hotel em que aparecia descalço e vestindo apenas um roupão – vestimenta que, aliás, ele fez questão de usar para registrar a imagem desta reportagem (dessa vez, colocou apenas o chinelo a mais). Outra estratégia usada por ele é escrever mensagens sempre em letras garrafais e em tom catastrófico. “Quebrou os pratos do Senado” e “Chutando o balde e falando o que a pátria também falaria” são exemplos de chamadas de publicações em que criticava os gastos da Casa e o engavetamento da CPI do Judiciário. Não houve nenhum quebra-quebra ou canelada na tribuna, mas os cliques foram garantidos.

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Tamanha é a dedicação de Kajuru às redes sociais que, no início da legislatura, ele chegou a registrar em cartório que os internautas definiriam seus votos em temas mais espinhosos. O efeito virou contra ele. Com o bolsonarismo nadando de braçada na internet, o senador se viu obrigado a votar favorável à Reforma da Previdência, apesar de ser contrário à medida por considerá-la danosa ao trabalhador. O senador traiu a própria convicção para atender a um pedido virtual. Ao fim, diz que se arrependeu: “A ideia era só fazer isso no primeiro ano de mandato. Não vou repetir nos próximos”, afirma. Kajuru alimenta dezenas de páginas no Facebook, tem 360.000 seguidores no Instagram e 271.000 no Twitter. Ele aparece como sétimo colocado no ranking dos mais influentes – posição que lhe causa insatisfação. “Se eu estiver perdendo para o Flávio Bolsonaro, eu renuncio”, afirma ele, que está cinco posições abaixo do filho do presidente. “Não posso acreditar nessa pesquisa”, continua.

A popularidade nas redes nem sempre vem acompanhada de relevância ou força política. Considerado um articulador de peso para o avanço das reformas econômicas no ano passado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), nem sequer aparece entre os top 10 dos influenciadores nas redes – ele tem apenas 194.000 seguidores no Facebook. Já o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM), consta apenas na nona colocação – mesmo tendo ainda menos seguidores (96.000).

Fahur: famoso pelo 'bang-bang'
Fahur: famoso pelo ‘bang-bang’ (Cristiano Mariz/VEJA)

Enquanto isso, o ex-policial militar e deputado de primeiro mandato Sargento Fahur (PSD), com seus mais de 4,5 milhões de seguidores no Facebook, é uma figura conhecida na propagação de cenas de bang-bang. No ano passado, um vídeo em que um policial sai de dentro de um carro e, armado, aborda um motoqueiro que havia acabado de assaltar uma mulher atingiu quase 15 milhões de visualizações e foi compartilhado por mais de 354.000 vezes. A legenda era no clima de festa: “Como é bom ver uma cena dessas!!!”. Fahur é considerado o quinto deputado mais influente nas redes sociais, mas admite ter dificuldades com a tecnologia – não tem nem o aplicativo do Facebook instalado em seu telefone, e delega a um assessor a função de publicar os textos e vídeos que ele lhe envia.

Amigo do presidente Jair Bolsonaro, o deputado diz concordar com praticamente todas as pautas dele, mas já prevê uma tensão quando chegarem ao Congresso as mudanças na regra do funcionalismo público. “Eu tive benefícios por 30 anos e agora vou tirar dos outros? O Bolsonaro que me desculpe”, antecipa. Ele relata o que significa ir de encontro às ondas das redes sociais. Contrário à proposta que pune policiais e juízes por abuso de autoridade, o congressista votou favorável à aceleração da tramitação da matéria, visando justamente mandá-la logo ao arquivo. Foi massacrado pelas redes. “Perdi, em média, mais de 5.000 seguidores por dia. Era gente me chamando de vendido, vagabundo e traidor, sem entender o que aquilo significava”, lembra.

Humberto Costa: um estúdio dentro do gabinete
Humberto Costa: um estúdio dentro do gabinete (Cristiano Mariz/VEJA)

Parlamentares de oposição têm maior dificuldade de se destacar nas redes. Dos 20 deputados e senadores, apenas quatro são de partidos contrários ao governo. Em seu segundo mandato de senador, o petista Humberto Costa explica que a esquerda, historicamente, tem mais habilidade em promover ações na rua do que na internet. “O pessoal do movimento social não tem essa organização virtual da direita”, afirma ele, que buscou driblar a barreira. Terceiro senador mais influente nas redes, Costa contratou assessores da ex-presidente Dilma Rousseff e transformou seu gabinete em uma espécie de estúdio, com direito a holofotes de luz sobre um tripé, câmeras e até um background, com imagens dele ao lado do ex-presidente Lula, para decorar o cenário das gravações.

Costa já identificou que seus seguidores gostam de discursos e publicações críticas ao governo Bolsonaro – por isso, elas têm um grande peso em sua publicação. Mas nem sempre o resultado é o esperado. Em novembro, o petista fez uma enquete provocativa: “Bolsonaro disse: ‘Meu governo é um dos mais democráticos dos últimos anos.’. Será que o nordestino concorda?”. Diante da ação em massa da direita, o resultado foi constrangedor: 82% – o que significaram mais de 72.000 votos – disseram que sim. “Dependendo dos temas, nós conseguimos identificar que é uma ação orquestrada. Há muitos robôs”, afirma. “Muitas vezes, recebemos um certo tipo de pressão que não é do nosso eleitorado. Não adianta tentar um diálogo com esse público, porque ele vem só para achincalhar.”

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Carla Zambelli: de ameaças a pedidos de casamento
Carla Zambelli: de ameaças a pedidos de casamento (Cristiano Mariz/VEJA)

Já a deputada bolsonarista Carla Zambelli, por outro lado, dedica especial atenção aos comentários que recebe pela internet. Ela mantém uma equipe destacada para computar os recados, analisar o tom deles – se são positivos ou negativos – e respondê-los. Ela, pessoalmente, analisa todos. Alguns são preocupantes. A deputada costuma receber uma série de xingamentos e até ameaças de morte, o que fez com que solicitasse uma escolta armada. Do ódio, as redes também trazem amor. “Já fui até pedida em casamento”, lembra, rindo. Uma das estratégias da congressista é gravar vídeos em que fala de política ao mesmo tempo em que adota um tom pessoal – narra cansaço, o horário que seu dia começou e as reuniões das quais participou. Isso, ela explica, provoca a sensação de proximidade entre seus seguidores.

Zambelli ocupa o antigo gabinete de Jair Bolsonaro e teve o cuidado de manter boa parte da decoração feita pelo ocupante anterior – inclusive os quadros de ex-presidentes da época da ditadura da militar, que figura o cenário de suas lives. A deputada afirma que as redes, hoje, são a sua principal base de apoio. “Toda a minha esperança de reeleição está na internet. Se essa rede resolver deixar de existir, eu posso não ser eleita”, afirma. E o famoso pé na rua, deputada? “Não existe só sola de sapato. Para conseguir muitos votos, ou você tem muito dinheiro ou não faz.”

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Os 10 deputados mais influentes:

1º – Joise Hasselmann (PSL-SP)
2º – Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)
3º – Carla Zambelli (PSL-SP)
4º – Kim Kataguiri (DEM-SP)
5º – Sargento Fahur (PSD-PR)
6º – Pr. Marco Feliciano (Podemos-SP)
7º – Gleisi Hoffmann (PT-PR)
8º – Jandira Feghali (PCdoB-RJ)
9º – Tiririca (PL-SP)
10º – Filipe Barros (PSL-SP)

Os 10 senadores mais influentes:

1º – Alvaro Dias (Podemos-PR)
2º – Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ)
3º – Humberto Costa (PT-PE)
4º – Major Olímpio (PSL-SP)
5º – Marcos do Val (Podemos-ES)
6º – Romário (Podemos-RJ)
7º – Jorge Kajuru (Cidadania-GO)
8º – Randolfe Rodrigues (Rede-AP)
9º – Davi Alcolumbre (DEM-AP)
10º – José Serra (PSDB-SP)

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