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Os planos dos candidatos para a guerra na TV, que pode definir a eleição

Ao contrário de 2018, os debates, as entrevistas e os programas eleitorais serão fundamentais para revelar o que pensam os presidenciáveis

Por Daniel Pereira, Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 12h25 - Publicado em 26 ago 2022, 06h00
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  • É inegável a influência da televisão nas campanhas presidenciais realizadas após a redemocratização. O PT reclama até hoje da edição do último debate na TV, em 1989, entre Lula e Fernando Collor de Mello, que, segundo o partido, foi feito para prejudicar o petista. Em 2014, a propaganda eleitoral de Dilma Rousseff, comandada pelo marqueteiro João Santana, hoje a serviço de Ciro Gomes (PDT), dedicou minutos preciosos para desconstruir com mentiras a candidatura de Marina Silva, que despontava como uma ameaça à reeleição da então presidente. A estratégia deu certo: Marina perdeu musculatura, Dilma foi reeleita, e as feridas daquela ofensiva ainda não cicatrizaram, tanto que Marina resiste a declarar apoio a Lula na atual campanha. Em oito eleições diretas desde o fim da ditadura militar, o poder da TV só foi posto em xeque uma vez, em 2018, quando Jair Bolsonaro venceu por um partido nanico e com apenas oito segundos na propaganda eleitoral. Deputado do baixo clero, ele ganhou embalado pelas redes sociais, e sua consagração parecia um prenúncio de que a campanha televisiva perderia importância ou seria relegada a segundo plano. Nada disso ocorreu.

    TÁTICA - Lula: promessas de combate à fome e críticas à política econômica -
    TÁTICA - Lula: promessas de combate à fome e críticas à política econômica – (./Reprodução)

    Em 2022, os presidenciáveis mais bem colocados nas pesquisas apostarão pesado na TV. Há consenso entre eles de que uma campanha, para ter sucesso, precisa combinar bem o material veiculado na televisão com as mensagens postadas nas redes sociais. Um meio tem de complementar o outro, até porque, em muitos casos, eles atingem públicos diferentes. Os próprios coordenadores da campanha à reeleição de Bolsonaro são entusiastas dessa estratégia. À frente de uma coligação que reúne PL, Progressistas e Republicanos, o presidente terá a segunda maior fatia na TV entre os concorrentes (veja o quadro). Serão dois minutos e 38 segundos por bloco na propaganda eleitoral, além de 207 inserções ao longo da programação. Esse tempo será usado para atingir dois objetivos: vender as realizações do governo, como o novo valor do Auxílio Brasil e a recente redução do preço da gasolina, e insuflar o antipetismo, rememorando denúncias de corrupção contra Lula e o PT.

    REVERSÃO - Tebet: a candidata do MDB, desconhecida por 70% do eleitorado, acredita que a TV pode mudar esse quadro -
    REVERSÃO - Tebet: a candidata do MDB, desconhecida por 70% do eleitorado, acredita que a TV pode mudar esse quadro – (./Divulgação)

    Por mais que prefira as redes sociais, Bolsonaro está comprometido com o projeto de buscar votos na TV. Na última segunda-feira, 22, o presidente abriu uma rodada de entrevistas do Jornal Nacional, da Rede Globo, com os quatro candidatos mais bem colocados nas pesquisas. Durante o programa, Bolsonaro defendeu sua atuação na pandemia, reconhecidamente negacionista, traçou um cenário otimista na economia e evitou confrontos com representantes de outros poderes e com os entrevistadores. Uma parte de seus assessores disse que o resultado foi bom porque o chefe manteve o equilíbrio e, assim, não se afastou do eleitor indeciso, que quer moderação e está cansado de sua retórica beligerante. Antes da entrevista, havia o temor de que o presidente se irritasse e até deixasse a bancada ou que partisse para cima da emissora caso fossem abordados os pagamentos de Fabrício Queiroz, o operador da rachadinha, à primeira-dama Michelle. O tema nem sequer foi tratado. “Foi extremamente positivo”, disse um ministro a VEJA. Essa análise não é consensual.

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    Para outros assessores, Bolsonaro perdeu uma oportunidade de ouro para encurtar a desvantagem em relação a Lula, já que o Jornal Nacional é líder de audiência em horário nobre na TV aberta.

    RECALL - Ciro: em terceiro lugar nas pesquisas, o pedetista terá 52 segundos -
    RECALL - Ciro: em terceiro lugar nas pesquisas, o pedetista terá 52 segundos – (Marcos Serra Lima/G1/AFP)

    “Foi um zero a zero perdendo pênalti”, lamentou um aliado do presidente. As intenções de voto trazidas pela televisão são um grande desafio para a campanha à reeleição. Pesquisa Genial/Quaest divulgada em 17 de agosto mostrou que 44% dos entrevistados se informam sobre política pela televisão, 25% pelas redes sociais, 17% por rádio, jornais impressos e WhatsApp, e 10% por sites, blogs e portais de notícias. Na estratégica faixa de renda de zero a dois salários mínimos, a fatia da TV é ainda maior, de 50%, enquanto a das redes sociais cai para 22%. Entre quem se informa sobre política pela televisão, Lula tem 52% das intenções de voto e Bolsonaro marca 25%. Já entre aqueles que se informam pelas redes sociais, Bolsonaro lidera por 47% a 37%. Ou seja: o presidente precisa ganhar terreno na televisão.

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    arte TV

    O plano para isso já está traçado e é tocado por uma equipe profissional de comunicação e marketing, com direito a gravações em estúdio de ponta — muito diferente do que aconteceu na eleição passada. Com as propagandas na TV, Bolsonaro quer resgatar os eleitores “arrependidos”, um contingente de 15% que votou nele em 2018 e tem forte inclinação antipetista, mas agora busca outro candidato. Hoje, esse grupo estaria menos sensível aos arroubos, lacrações e despautérios do presidente. A forma de trazê-lo de volta será repetir na propaganda eleitoral o “Bolsonaro do Jornal Nacional”, mais contido e sereno, com acenos retóricos à estabilidade. Pelo roteiro traçado, as peças de TV também contarão com a participação da primeira-dama Michelle, considerada um ativo importante para conquistar votos entre as mulheres e os evangélicos, e destacarão a agenda de costumes e a defesa da família e da religiosidade. Boa parte dessa tática já está sendo testada no universo digital, numa prova de que haverá uma simbiose com a TV (leia a reportagem na pág. 24). A participação no Jornal Nacional, por exemplo, repercutiu imediatamente nas redes sociais. Segundo a Quaest, 9 milhões de pessoas foram impactadas com postagens sobre a entrevista durante a sua exibição. Do total de menções a Bolsonaro, 35% foram positivas e 65% negativas.

    NA ARENA - Debates: em 2018, Bolsonaro sofreu o atentado e não foi a vários -
    NA ARENA - Debates: em 2018, Bolsonaro sofreu o atentado e não foi a vários – (Nelson Almeida/AFP)
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    No quesito repercussão, o desempenho de Ciro Gomes foi melhor. Em sua quarta candidatura presidencial, o ex-ministro deu entrevista ao Jornal Nacional na terça-feira 23. Contrariando seu temperamento mercurial e sua propensão à arenga, ele se apresentou como um grande conciliador e vendeu uma série de propostas. Entre elas, taxar grandes fortunas para bancar um programa de renda mínima que pagaria 1 000 reais a 60 milhões de brasileiros. Durante a entrevista, 2 milhões de pessoas foram impactadas com postagens nas redes sociais, sendo que 54% das menções a Ciro foram positivas. O pedetista, que só terá 52 segundos na propaganda eleitoral, aproveitou a oportunidade para convidar o eleitor a conhecer seu canal de televisão na internet. Bem-humorado, brincou que concorrerá com a Globo. Também estavam previstas entrevistas de Lula e Simone Tebet (MDB), que ocorreriam após o fechamento desta edição de VEJA. Com apenas 2% de intenções de voto, a senadora conta com seu tempo na propaganda da TV, o terceiro maior entre os concorrentes, para se tornar mais conhecida — 70% do eleitorado não sabe quem ela é.

    Suas peças apresentarão o seu currículo e terão como temas centrais a fome e o combate à pobreza. “Você não tem como comparar a Simone com o presidente Bolsonaro ou com o ex-presidente Lula, que são pessoas com grande capacidade de comunicação nas redes, muitos seguidores e uma movimentação muito grande de conversa sobre eles. Mas na televisão não é assim, e fica estabelecido um equilíbrio de forças e um diálogo mais democrático”, diz Felipe Soutello, marqueteiro da senadora. A propaganda eleitoral na TV começa no próximo dia 26. Lula deu o tom de sua estratégia num vídeo divulgado nas redes sociais no dia 16, quando foi iniciada oficialmente a campanha. Nele, o petista promete lutar contra a fome e a alta da inflação, que desgastam a imagem do rival Bolsonaro. Como de costume, os dois líderes das pesquisas usarão suas peças para exaltar as próprias virtudes, reais ou imaginárias, e estimular a rejeição ao adversário. Outro ponto em comum: para fugir do contraditório, ambos pretendem participar de poucos debates na TV, reduzindo a possibilidade de comparação das biografias, ideias e propostas. Lula e Bolsonaro podem até se beneficiar dessa iniciativa, mas, se ela se confirmar, haverá um perdedor incontestável: você, eleitor.

    Publicado em VEJA de 31 de agosto de 2022, edição nº 2804

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