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O Complexo do Alemão em estado de sítio

Justiça autoriza, de uma vez só, revistas nas casas de 80 mil moradores das 13 favelas da região. Para deputado, decisão é aberração constitucional

Por Cecília Ritto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 out 2011, 16h44

“Senhores moradores, o Exército Brasileiro está realizando um mandado judicial em cumprimento da lei. Fechem suas portas e janelas e aguardem orientação. Quando solicitado, abra a porta e aja de maneira educada. Obedeça a todas as instruções. Qualquer ação contrária será considerada como ato hostil e receberá a resposta necessária”

Mensagem divulgada por alto-falante antes da operação do Exército

Desde terça-feira, militares do Exército têm autorização para entrar e vasculhar casas de moradores de todo o Complexo do Alemão, uma área que compreende 13 favelas. A decisão, que impõe a 80 mil moradores algo muito parecido com um estado de sítio, é do Plantão Judiciário da Justiça do Rio, que expediu mandados de busca e apreensão para todo o complexo. Trata-se da ampliação de uma autorização dada no domingo, para a região conhecida como Pedra do Sapo, dentro do conjunto de favelas.

A Justiça atendeu, assim, o que foi pedido pela Força da Pacificação, comandada pelo Exército. Para fundamentar o pedido, os militares apresentaram imagens de traficantes de drogas atuando na região da Pedra do Sapo.

Na terça-feira, antes da operação para cumprir os mandados de busca e apreensão autorizada pela juíza Renata Palheiro, um automóvel do Exército com um alto-falante orientava os moradores sobre a conduta a ser adotada. “Senhores moradores, o Exército Brasileiro está realizando um mandado judicial em cumprimento da lei. Fechem suas portas e janelas e aguardem orientação. Quando solicitado, abra a porta e aja de maneira educada. Obedeça a todas as instruções. Qualquer ação contrária será considerada como ato hostil e receberá a resposta necessária”, dizia o locutor, momentos antes de o Exército realizar uma ação na Pedra do Sapo.

A operação capitaneada pela Força de Pacificação durou toda a tarde de terça. Não houve prisões. Foram apreendidos dois fuzis, parte de uma metralhadora, dinheiro, binóculos, rádios transmissores e drogas. O Exército já usou mensagens gravadas outras vezes. Mas foi a primeira com esse tipo de conteúdo, um alerta geral preventivo, para buscas em qualquer local. “Era importante ter a colaboração da população. Havia fortes indícios pela nossa inteligência de que havia armas no local. Poderia haver um encontro com bandidos e trocarmos tiros. Nossa maior preocupação foi com a segurança da população”, afirma o major Marcus Vinícius Bouças, relações públicas da Força de Pacificação.

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Para o Exército, a mensagem não foi hostil. “Consideramos extremamente eficaz (a mensagem). Não houve efeito colateral, as pessoas foram pacíficas, educadas e ficaram em suas casas. Possivelmente usaremos a tática em outras operações. Não visualizamos a mensagem como hostil, mas enfática”, argumenta Bouças. O major nega ter cerceado o direito de ir e vir dos moradores do Alemão. “Orientamos que ficassem em casa pela segurança deles”, diz o major.

Mandados de busca coletivos, e a opção de ficar dentro de casa “pela própria segurança” não são exatamente qualidades de um estado democrático de direito. Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Marcelo Freixo, houve abuso. “É uma aberração constitucional. A natureza do mandado (de busca) é individualizada’, explica. Freixo alerta que, ao decidir que os militares podem entrar em qualquer lugar, revistar qualquer residência, a Justiça e a Força de Pacificação criminalizou toda a população do local, tratando todos como suspeitos permanentes. “Se somar a população toda de lá, menos de 1% dos moradores estão envolvidos com algum tipo de crime”, afirma Freixo.

A previsão atual é de que o Exército permaneça no Alemão até junho de 2012, como determina o acordo assinado na segunda-feira entre o estado e o Ministério da Defesa. A importância das Forças Armadas na recuperação daquele território é indiscutível. Mas a permanência do Exército nesse tipo de patrulhamento empurra a tropa – e piora, a população – para uma aberração: militares não podem, pela constituição, exercer papel de polícia. Para que isso ocorra, é necessário haver uma intervenção, ainda que a pedido do governador, o que não ocorreu.

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O ministro da Defesa, Celso Amorim, na assinatura do acordo, no Alemão, na segunda-feira, admitiu que não é função do Exército permanecer longos períodos em ações como a de agora. No entanto, diante da falta de policiais militares para atuar na região, a tropa tem servido como um tapa buraco para o governador Sérgio Cabral. A ocupação do Alemão, em novembro do ano passado, foi decidida a toque de caixa, no momento em que o Rio era alvo de bandidos. Apesar dos planos para instalar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) naquele local, não havia – e ainda não há – pessoal e instalações suficientes para isso.

“O Exército no Alemão está atuando como polícia, mas não está autorizado a isso pela Constituição”, alerta o deputado. Em novembro, a Alerj promoverá uma audiência pública com representantes do governo e da Secretaria de Segurança. “Queremos saber o que o governo do Rio pretende com o Complexo do Alemão. Não há planejamento nem projeto”, alerta Freixo.

Ferimento – Os militares que atuam no Alemão viveram momentos de tensão na noite de terça-feira. Um cabo do Exército, integrante da Força de Pacificação, sofreu um disparo acidental às 21h, enquanto se preparava para um patrulhamento. A vítima foi quem fez, sem intenção, o disparo. O cabo está internado em estado grave no CTI do Hospital Central do Exército (HCE).

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