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Lula deixa a cadeia após 580 dias preso em Curitiba

Ex-presidente foi solto por ordem da Justiça Federal do Paraná, depois de decisão do STF derrubar prisões após segunda instância

Por João Pedroso de Campos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 mar 2021, 17h31 - Publicado em 8 nov 2019, 17h42

Após 580 dias preso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou nesta sexta-feira, 8, a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde estava detido para cumprir a pena de 8 anos, 10 meses e 20 dias imposta a ele no processo da Operação Lava Jato referente ao tríplex do Guarujá (SP). Lula é aguardado por militantes do PT e de movimentos ligados ao partido para atos em Curitiba e em São Bernardo do Campo (SP), seu berço político.

O ex-presidente saiu da prisão acompanhado da presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, do deputado estadual Emídio de Souza (PT-SP), os ex-deputados federais Wadih Damous (PT-RJ) e Luiz Eduardo Greehalgh (PT-SP) e o ex-senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Ele fará um discurso em frente à sede da PF, dirigido aos integrantes da vigília que diariamente lhe mandavam saudações.

Ao longo de seu período na prisão, Lula esteve custodiado em uma sala transformada em cárcere e sem grades. Para quem entra, a primeira visão era a da cama, ao lado da qual quatro cadeiras circundavam uma mesa redonda com livros empilhados e folhas de anotações. Fixada à parede, uma TV de plasma transmitia apenas canais abertos e, ao lado do aparelho, um armário de madeira onde o ex-presidente guardava suas roupas — o petista normalmente usava chinelos, bermuda e camiseta. Atrás do armário, uma divisória separa o quarto-sala do banheiro, onde há um boxe com chuveiro elétrico, uma pia e um vaso sanitário. O espaço ainda recebeu uma esteira ergométrica, usada por Lula para se exercitar.

Conforme estimativa da PF em abril de 2018, o custo mensal do aparato era de 300.000 reais mensais, cifra que poderia totalizar em 5,8 milhões de reais o custo da “operação Lula” na sede da corporação desde que ele foi preso.

Ilustração da cela onde Lula estava preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba
Ilustração da cela onde Lula estava preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba (./.)

Lula recebia visitas frequentes dos quatro filhos, Fábio Luiz, Sandro Luís, Luís Cláudio, Marcos e Lurian, noras, netos e da namorada, a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, com quem ele está decidido a se casar – o petista ficou viúvo em fevereiro de 2017, quando a ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva morreu vítima de um AVC.

Na cadeia, o ex-presidente se tornou um leitor assíduo. Segundo o Instituto Lula, a lista de livros lidos por ele no período inclui Homo Deus (Yuval Harari), A Elite do Atraso – Da Escravidão à Lava Jato (Jessé Souza), Laika (Nick Abadzis), Os Beneditinos (José Trajano), O Amor nos Tempos do Cólera (Gabriel Garcia Márquez), Vá, Coloque Um Vigia (Harper Lee), Feminismo Em Comum – Para Todas, Todes E Todos (Márcia Tiburi), O Último Cabalista de Lisboa (Richard Zimler), Um Defeito de Cor (Ana Maria Gonçalves), Dois Cigarros (Flávio Gomes), Quem Manda No Mundo? (Noam Chomsky), A Poeira e a Estrada (Maciel Melo), O Voto do Brasileiro (Alberto Carlos Almeida) e O Sol na Cabeça Geovani Martins), entre outros.

Enquanto abrigou o primeiro ex-presidente da República preso por crime comum, a Superintendência da PF virou ponto de peregrinação de intelectuais e personalidades de esquerda, além de políticos estrangeiros e brasileiros – alguns dos quais, habilitados como advogados dele, tinham acesso mais amplo, como Gleisi, Haddad, Emídio, Damous, Greehalgh e o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão.

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Passaram pela sede da PF em Curitiba a ex-presidente Dilma Rousseff, o presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, e os ex-presidentes Pepe Mujica, do Uruguai, e Ernesto Samper, da Colômbia, além do ex-líder do partido alemão SPD Martin Schulz. Os governadores da Bahia, Rui Costa (PT), do Piauí, Wellington Dias (PT), e do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB) também visitaram o ex-presidente, assim como os ex-ministros Celso Amorim e Aloizio Mercadante, deputados federais, senadores e sindicalistas.

Fora da política, foram a Curitiba e se encontraram com Lula dois vencedores do prêmio Nobel da Paz, o indiano Kailash Satyarthi, laureado em 2014, e Adolfo Pérez Esquivel, premiado em 1980, assim como os cantores e compositores Chico Buarque e Martinho da Vila e o ator americano Danny Glover. O petista também recebia visitas de líderes de diversas religiões, como padres, pastores, monges e um pai de santo.

Mortes de familiares

Lula perdeu dois familiares enquanto esteve preso em Curitiba: seu irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá, de 79 anos, morto em janeiro de 2019; e seu neto Arthur Araújo Lula da Silva, de 7 anos, morto em abril de 2019.

No caso de Vavá, vítima de um câncer no pulmão, o ex-presidente não acompanhou velório e sepultamento. A juíza Carolina de Moura Lebbos, responsável pela execução penal do petista, negou pedido dele para ir às cerimônias, em São Bernardo do Campo, após pareceres negativos da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, que alegaram problemas logísticos para o deslocamento do petista e riscos de segurança. Minutos antes do enterro, o presidente do STF, Dias Toffoli, permitiu que o ex-presidente encontrasse os familiares, o que já não era possível.

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Surpreendido pelo falecimento de Arthur, filho de Sandro Luís Lula da Silva, o ex-presidente foi autorizado pela magistrada e deixou a cadeia para ir ao velório, também em São Bernardo. A informação inicial era de que a causa da morte da criança havia sido meningite meningocócica, retificada um mês depois, quando se descobriu que Arthur fora vítima de uma infecção generalizada causada pela bactéria Staphylococcus aureus.

O ex-presidente Lula retorna para a Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba (PR), após participar do velório de seu neto, Arthur Lula da Silva - 02/03/2019
O ex-presidente Lula retorna para a Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba (PR), após participar do velório de seu neto, Arthur Lula da Silva – 02/03/2019 (Ricardo Stuckert Filho/Instituto Lula/Reuters)

Eleição de 2018

Enquadrado pela Lei da Ficha Limpa e impedido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de concorrer à presidência da República na eleição de 2018, Lula acompanhou da prisão a vitória do presidente Jair Bolsonaro sobre o “plano B” do PT, Fernando Haddad, registrado inicialmente como candidato a vice do ex-presidente.

Durante o primeiro turno, o horário eleitoral do candidato petista, que teve como vice a ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB), explorou fartamente a imagem de Lula, com vídeos gravados antes da prisão e o slogan “Haddad é Lula, Lula é Haddad”.

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A estratégia de transferência de votos do ex-presidente, líder das pesquisas de intenção de voto que levavam seu nome, mostrou-se bem sucedida e levou Fernando Haddad ao segundo turno contra Bolsonaro. Na parte decisiva da disputa presidencial, Lula desapareceu das peças de propaganda do ex-prefeito, em busca do eleitor de centro.

Mesmo solto pela decisão do STF, Lula continua inelegível. Ele, no entanto, pode atuar politicamente e participar normalmente de caravanas e atos políticos, como planeja o PT.

Quase solto duas vezes

Antes de deixar a cadeia em função da decisão do STF, o ex-presidente esteve em vias de ser solto em duas ocasiões, mas continuou preso.

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Em julho de 2018, o desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), atendeu a um habeas corpus movido pela defesa de Lula e mandou soltá-lo, citando como “fato novo” a candidatura dele à presidência. A decisão foi tomada no dia 8 de julho, um domingo, durante o plantão judiciário.

A decisão provocou a reação do então juiz Sergio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância, que, mesmo de férias, determinou à Polícia Federal que não cumprisse a ordem enquanto o relator da Lava Jato no TRF4, João Pedro Gebran Neto, não se manifestasse. Favreto, no entanto, emitiu nova decisão reafirmando a determinação para soltar Lula e pedindo a investigação de Moro pelo Conselho Nacional de Justiça por infração funcional ao atuar para o não-cumprimento de decisão de instância superior.

Na sequência, Gebran Neto invocou para si o caso e desfez o que o colega Favreto tinha decidido. Este, por sua vez, não aceitou, disse que não era subordinado a Gebran e, na sua terceira decisão sobre o caso, reiterou a determinação para a PF soltar o ex-presidente. A guerra de decisões foi encerrada pelo então presidente do TRF4, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, que decidiu que quem tem o poder de decidir sobre o caso é o relator.

O desembargador Rogério Favreto
O desembargador Rogério Favreto (Sylvio Sirangelo/TRF4/Flickr)

Em 19 de dezembro de 2018, último dia antes do recesso do Judiciário, o ministro do STF Marco Aurélio Mello concedeu uma liminar e determinou que todos os réus presos após condenações em segunda instância no TRF4 fossem soltos, o que incluía Lula. A decisão foi derrubada no mesmo dia pelo presidente do Supremo, Dias Toffoli.

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