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Julgamento do mensalão: como falam os ministros do STF

Lewandowski rivaliza com Barbosa na duração dos votos e até nos apartes. Dos demais ministros, Toffoli é o mais prolixo, e Cármen Lúcia, a mais sucinta

Por Daniel Jelin Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 5 out 2012, 07h26

Na semana passada, o ministro relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, queixou-se do revisor, Ricardo Lewandowski: “É absolutamente heterodoxo um ministro revisor ficar medindo o tamanho do voto do relator para replicar o seu do mesmo tamanho. É cansativo”. O rompante não ajudou a acelerar o julgamento do mensalão – ao contrário -, mas Barbosa tem razão: o “contraponto” que Lewandowski prometeu fazer parece rigorosamente cronometrado. Nada o impede de fazê-lo – talvez o bom senso -, mas de fato é cansativo.

Aos números: na primeira ‘fatia’ do julgamento, Barbosa falou por 06h24, e Lewandowski, por 06h36; no segundo capítulo, o relator votou por 03h10, e o revisor, 03h00; no terceiro item analisado, foram 03h53 para Barbosa e 04h06 para Lewandowski. A quarta fatia, a mais longa, foi dividida em duas partes, uma para as denúncias contra deputados da base aliada e seus colaboradores, outra para a cúpula do PT e o núcleo publicitário. Na primeira rodada, o voto de Barbosa foi pela primeira vez significativamente mais longo que o de Lewandowski, 09h35 contra ‘apenas’ 07h45. Na segunda rodada, Lewandowski iniciou seu voto de modo surpreendentemente acelerado, mas no fim tomou até mais tempo que Barbosa: 3h22 contra 3h13 (veja abaixo os números e assista aos vídeos).

O antagonismo lembra o dos debates eleitorais na TV, em que candidatos melindrados requerem direito de resposta ao apresentador. Lewandowski chegou ao ponto de pedir direito a tréplica sem saber o que Barbosa pretendia por réplica, o que obrigou o presidente da casa, Ayres Britto, a lembrar: ‘O relator é quem tem um papel de centralidade na condução do processo. O revisor, como a palavra já diz, tem o um papel complementar’. Lewandowski não gostou: ‘Data vênia, não’. Ameaçou deixar o plenário nas sessões seguintes, mas contentou-se com um aparte de 4 minutos, feito após uma intervenção de Barbosa que durou os mesmos 4 minutos.

Platitudes – A rivalidade não se limita ao tempo do voto, é claro. Barbosa é o ministro que mais condena, o que faz após uma detalhada recapitulação do processo, prova por prova. Cita depoimentos, laudos, perícias, teses da defesa e da acusação, sempre lembrando a numeração de folhas, volumes, anexos e apensos. É um voto exaustivo, e é comum que o encerre se dizendo mesmo esgotado. Com suas dores crônicas, o relator é obrigado a trocar de posição constantemente: de pé, sentado, reclinado, empertigado etc.

Lewandowski também desce às minúcias do caso, mas frequentemente emerge com uma conclusão oposta à de Barbosa – é o juiz que mais absolve. É um voto exaustivo também, até nos trechos que concordam com as teses de Barbosa. É que Lewandowski não se limita ao processo. Com ar professoral, o revisor é dado a platitudes sobre as responsabilidades do magistrado, as garantias constitucionais e as obrigações da acusação, o que Barbosa toma sempre como calculada provocação. Por exemplo: ao analisar o caso do Banco Rural, o revisor esclareceu que: “A gente precisa fazer sempre a contraposição entre a acusação e a defesa para sopesar os argumentos. Essa é a dialética do processo penal etc”. Barbosa interveio: “Vossa Excelência está insinuando que não fiz isso? Isso aqui não é Academia”. Seguiram-se oito minutos de bate-boca.

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‘Amor à brevidade’ – Dos demais ministros, os chamados ‘vogais’, Dias Toffoli é de longe o que fala mais. Suas leituras, quase sem tirar os olhos do papel, já tomaram 5h33 do julgamento, um quarto do tempo gasto por Lewandowski. Toffoli é prolixo até para se despedir. Ao deixar o tribunal para tomar parte de uma sessão no Tribunal Superior Eleitoral, disse: “Senhor presidente, apesar de ter Antônio no nome, não tenho o dom da ubiquidade de Santo Antônio. Vossa Excelência já foi presidente do Tribunal Superior Eleitoral e sabe que em matéria de registro de candidatura etc.”

Toffoli fala mais até que Celso de Mello. Apesar do declarado ‘amor à brevidade’, o decano do STF cultiva a fama de proferir votos longos (já falou por 3h55 neste julgamento), bem embasados, enciclopédicos. Aliás, um de seus apelidos na juventude foi ‘Barsa’ – o outro era ‘Tatuí’, sua cidade natal, no interior de São Paulo, como denuncia o forte sotaque. Mello é capaz de sustentar longos períodos sem recorrer à leitura do voto, sempre procurando contato visual com outros ministros. Cita de memória vastíssima jurisprudência, tratados internacionais, decisões do tempo do Império, atropelos do Estado Novo, recomendações das Nações Unidas, passagens de Cícero, Suetônio, Montesquieu, Santo Agostinho, Tomás de Aquino etc. Especialmente longo foi o duríssimo voto proferido esta segunda, em que condenou os ‘marginais do poder’, os ‘assaltantes dos cofres públicos’, a ‘quadrilha de bandoleiros de estrada’.

Voto sucinto – No extremo oposto, Cármen Lúcia é quem tem o voto mais sucinto, longe das repetições e do pedantismo. Gastou apenas 1h23 da paciência do plenário ao longo de todo o julgamento. Foi o bastante para gravar algumas passagens marcantes, como no dia em que fez questão de frisar que a condenação de deputados corruptos não significa a condenação da política ou do Congresso: “Meu voto nada tem a ver com desesperança na política ou em relação ao papel dela para a construção do estado democrático de direito. Eu não queria que a condenação tão triste desses que receberam a confiança dos eleitores fosse uma forma de manifestar descrença na política. A ética é a única forma de se conviver na sociedade”.

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