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Horizonte sombrio

A segunda condenação de Lula, desta vez pela reforma do sítio de Atibaia, eleva sua pena a 25 anos de cadeia — ainda há outras seis ações penais na Justiça

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 fev 2019, 07h00 - Publicado em 8 fev 2019, 07h00

Enquanto o PT levanta a bandeira do “Lula livre”, Lula nunca esteve tão preso. Na quarta-feira 6, a juíza Gabriela Hardt, que sucedeu a Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, condenou o ex-presidente a doze anos e onze meses de cadeia pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro na reforma do Sítio Santa Bárbara, localizado em Atibaia, no interior de São Paulo. As obras, segundo a sentença, foram bancadas pelas empreiteiras OAS e Odebrecht, com dinheiro de esquema criminoso. Como não dispunha de meios para confiscar apenas as benfeitorias, a juíza decretou o confisco do sítio.

A condenação de agora teve um primeiro esboço em 2015, quando o empreiteiro Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, preso havia seis meses, começou a rascunhar uma proposta de acordo de delação na Lava-Jato. No Complexo Médico-Penal, em Curitiba, o empresário anotou numa pequena folha de papel um segredo que guardara durante anos e que mudaria o patamar da Lava-Jato. Na época, os investigadores ainda tateavam o topo da cadeia de comando da quadrilha da Petrobras. Pinheiro escreveu que o ex-presidente Lula não só sabia do esquema como se beneficiara pessoalmente do dinheiro roubado. Também informou que, a pedido do “chefe”, financiara a reforma no sítio de Atibaia. O segredo do empresário foi revelado em uma reportagem de capa publicada por VEJA em abril de 2015.

O condenado recebeu vantagem indevida em decorrência do cargo de presidente da República, de quem se exige um comportamento exemplar enquanto maior mandatário da República.

Gabriela Hardt, juíza federal no Paraná
SENTENÇA – A juíza Gabriela Hardt, substituta de Moro: confisco do sítio (AJUFE/.)

Com a sentença, o futuro de Lula apresenta-se cada vez mais sombrio. O petista foi condenado a doze anos e um mês de prisão no caso do tríplex do Guarujá. A nova sentença eleva sua pena a 25 anos de prisão. Em processos assim, os benefícios, como a progressão de regime, passam a ser calculados com base na soma das penas. No caso de Lula, se a segunda sentença for confirmada nas instâncias superiores, ele terá de cumprir no mínimo quatro anos de prisão para ter direito ao primeiro benefício — sair da cadeia durante o dia, para trabalhar ou estudar, e voltar à noite, para dormir. A lei dá esse benefício a apenados de bom comportamento, que não ofereçam risco de fuga e que tenham cumprido um sexto da pena. Lula tem 73 anos. Aos 76, portanto, poderia passar o dia fora da cadeia. O segundo benefício, a liberdade condicional, só é concedido depois de cumprido um terço da pena. Nesse caso, Lula já teria 80 anos. É uma previsão otimista, dada a carga de processos ainda pela frente.

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O ex-presidente responde a outras seis ações penais na Justiça, a maioria por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. Se for condenado em todos os casos à pena mínima, receberá mais 28 anos de prisão. Se penalizado com a máxima em todos os casos, acrescentem-se mais 102 anos. Na mais branda das hipóteses de condenação, Lula só obteria a liberdade condicional daqui a dezessete anos, quando terá completado 90 anos de idade. Ou seja, começa a ganhar alguma solidez o risco de que Lula fique na cadeia até seus últimos dias. A legislação não prevê o benefício da prisão domiciliar por motivo de idade. Por razões humanitárias, que em geral envolvem o diagnóstico de doenças graves, condenados podem deixar a cadeia e cumprir a sentença em casa, como ocorreu com o ex-deputado Paulo Maluf. A outra opção para sair da prisão é que Lula ganhe um indulto presidencial. Mas, pelo menos enquanto Jair Bolsonaro estiver no Palácio do Planalto, essa é uma hipótese improbabilíssima.

LAVA-JATO – Léo Pinheiro: preso, o empreiteiro arrastou o ex-presidente para o centro do escândalo (Paulo Lisboa/Brazil Photo Press/.)

O ex-presidente está preso desde abril do ano passado, depois de ter sido condenado em segunda instância no caso do tríplex. O Supremo Tribunal Federal vai julgar se considera inconstitucional o cumprimento da pena antes de esgotados todos os recursos. É a única e, provavelmente, a última esperança do ex-presidente de deixar a cadeia. Desde 2016, o próprio STF já analisou o assunto em quatro ocasiões, sempre sinalizando que réus poderiam, sim, ser presos depois que as condenações fossem confirmadas em um tribunal de segundo grau. Na semana passada, o agora ministro da Justiça, Sergio Moro, fechou ainda mais o cerco ao estipular que só em casos excepcionais um condenado em segunda instância deixaria de ser preso. Dificilmente a proposta de Moro será aprovada no Congresso antes de abril, quando o STF vai analisar a legalidade das prisões antecipadas. Mas, se isso ocorrer, também fulminará a derradeira esperança do petista em livrar-se das grades.

A defesa de Lula anunciou que vai contestar a sentença da juíza Gabriela Hardt — ou a sentença anterior, do caso do tríplex do Guarujá. Ela alega que não há provas contra o ex-presidente e que não há relação entre os supostos pagamentos de propina e o esquema na Petrobras, o que poderia tirar o caso de Curitiba. Outro aspecto que a defesa vai levantar é que, na sentença, a juíza afirma que os depoimentos de “Léo Pinheiro e José Adelmário” foram “corroborados por relatórios de auditoria e diversos outros documentos”. O problema: Léo Pinheiro e José Adelmário são a mesma pessoa. Léo Pinheiro é o apelido pelo qual José Adelmário é conhecido. O erro, obviamente, não muda a gravidade nem a correção da sentença, mas trata-se de uma falha amadora que ajuda a defesa a arranhar a credibilidade da decisão e que também contribui para a alegação de que Lula está sendo tratado com um rigor que a Justiça não apresenta para outros envolvidos na Lava-Jato — e de que, nesse quesito, a decisão de embromar para impedir Lula de ir ao velório de seu irmão, Genival Inácio da Silva, o Vavá, foi apenas uma manifestação de boçalidade.

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SEGREDO – Reportagem de VEJA publicada em abril de 2015 colocou o sítio de Atibaia na Lava-Jato: reforma bancada pelas empreiteiras com recursos do “caixa geral” da propina (//VEJA)

Em 2015, antes de o sítio de Atibaia ter se tornado cenário da Lava-Jato, VEJA foi à cidade do interior paulista e colheu depoimentos de moradores e funcionários que conheciam a propriedade frequentada pelo ex-presidente. Revelou os favores que o empreiteiro Léo Pinheiro havia feito ao amigo petista e a estratégia de manter o imóvel registrado formalmente no nome dos empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar, ambos sócios de Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho do e­­x-presidente. Suassuna e Bittar haviam comprado o sítio em agosto de 2010, poucos meses antes de o petista deixar o cargo de presidente. Nove meses depois da reportagem, o jornal Folha de S.Paulo publicou que a empreiteira Odebrecht também participara das reformas no sítio.

Além do ex-presidente, foram condenadas no processo outras onze pessoas, incluindo Roberto Teixeira, advo­gado e compadre de Lula, os empreiteiros Marcelo e Emílio Odebrecht, o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e o empresário e amigo do petista José Carlos Bumlai. “O condenado recebeu vantagem indevida em decorrência do cargo de presidente da República, de quem se exige um comportamento exemplar enquanto maior mandatário da República”, escreveu a juíza Gabriela Hardt em sua decisão. As investigações demonstraram que OAS e Odebrecht usaram parte do porcentual de propina acertado em contratos com a Petrobras para abastecer um “caixa geral”, de onde saiu 1 milhão de reais para reformar o sítio de Lula.

Publicado em VEJA de 13 de fevereiro de 2019, edição nº 2621

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